Opinião

Juízes trabalhistas deverão ter mais cautela para conceder Justiça gratuita

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27 de outubro de 2021, 19h11

O STF decidiu no último dia 20, por maioria de votos, que é inconstitucional a parte da reforma trabalhista — Lei nº 13.467, de 2017 — que previa que trabalhadores que perdessem processo trabalhista teriam de pagar os honorários advocatícios da parte contrária, ou seja, a chamada verba de sucumbência, além dos honorários periciais quando a perícia lhes fosse desfavorável.

De acordo com a decisão, os trabalhadores com direito à Justiça gratuita não devem honorários advocatícios sobre valores de pedidos negados pelos juízes, mesmo que tenham recebido valores decorrentes da procedência de outros pedidos formulados na ação. Também não precisarão pagar os honorários do perito do juízo se a conclusão do laudo lhes for desfavorável, recaindo tal encargo à União.

Embora as alterações implementadas pela dita "reforma trabalhista" não tenham sido precedidas de amplo debate da sociedade civil e da comunidade jurídica, é inegável que o dispositivo ora reconhecido pelo STF como inconstitucional conseguiu inibir as ações e os pedidos totalmente descabidos nos processos trabalhistas.

Isso certamente foi um fator importante na redução de ações ajuizadas nos anos de 2018 a 2021. De acordo com a estatística disponibilizada no site do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), em 2017 foram recebidos 3.965.563 novos processos pela Justiça do Trabalho. Em 2018, primeiro ano de vigência da "reforma trabalhista", foram recebidos 3.222.252 e, embora tenha se registrado um leve aumento em 2019 — 3.402.392 novas ações trabalhistas —, em 2020 a distribuição de novos processos trabalhistas atingiu o menor patamar: 2.867.673. E, ao que tudo indica, 2021 não será diferente, já que, até o mês de agosto, contou com 1.885.620 novas ações trabalhistas.

No entanto, conforme inclusive argumento adotado pelos ministros do Supremo, existem outras ferramentas processuais para coibir os excessos no exercício do direito de ação, tal qual a declaração judicial da litigância de má-fé com condenação em multa. Ocorre que essa possibilidade é utilizada no âmbito da Justiça do Trabalho com rara frequência, o que seguramente acabou por motivar a alteração legal agora declarada inconstitucional pelo Supremo.

Não há dúvida de que o ideal seria coibir os excessos nas demandas trabalhistas adotando o que já existia no âmbito processual, ou seja, o reconhecimento da litigância de má-fé e a consequente condenação ao pagamento de multa. É importante lembrar que para que os juízes possam deferir essa multa, é indispensável que os advogados que entenderem pela utilização inadequada do direito de litigar assim o peçam em juízo.

Já sob outra ótica, essa decisão pode levar a uma mudança na apreciação, pelos magistrados, dos pedidos de Justiça gratuita que permeiam indiscutivelmente todas as ações distribuídas na Justiça do Trabalho.

Com o reconhecimento pelo STF da inconstitucionalidade do artigo 790 B, §4º, da CLT — que indica que os honorários periciais serão quitados pela União federal se o empregado perder o objeto da perícia e for beneficiário da Justiça gratuita — e do artigo 791-A, §4º — o empregado beneficiário da Justiça gratuita não precisará pagar honorários advocatícios sucumbenciais — fará com que os pedidos de gratuidade judiciária recebam maior atenção dos juízes.

E não será surpresa se ao contrário do que ocorre atualmente, os magistrados passarem a ser mais rígidos na avaliação desse pedido. Nesse sentido, vale lembrar que antes da "reforma trabalhista", a mera declaração de insuficiência de recursos para custear eventuais despesas dos processos sem o prejuízo do sustento próprio e de sua família era suficiente para embasar um pedido de gratuidade judicial.

Com a mencionada "reforma", passou a ser comum julgadores que solicitavam a comprovação desse estado de miserabilidade jurídica para, somente após a análise desses documentos, conceder ou não os benefícios da gratuidade judiciária.

No entanto, mesmo com a vigência dos dispositivos legais que reconheciam a necessidade dessa comprovação, o Tribunal Superior do Trabalho, legislando mais uma vez, editou a Súmula 463, por meio da qual passou a ser suficiente apenas a declaração a partir de 26/6/2017.

Porém, não há como discordar de que essa cautela dos juízes é de suma importância e, sem sombra de dúvida, não traz qualquer prejuízo. Afinal, aquele empregado demandante que for detentor desse direito poderá facilmente comprová-lo.

Já em sentido contrário, aqueles profissionais que se encontrarem em condição econômica mais favorável, muitas vezes pela rápida recolocação profissional cumulada com o exercício de cargo ou função muito bem remunerada, certamente poderão suportar o ônus de litigar sem que isso traga prejuízo à sua família — evidentemente, desde que não tenham conseguido comprovar a situação de miserabilidade jurídica que pode existir, ainda que com altos salários.

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