Opinião

Persistem os problemas na atual redação da PEC nº 05/2021

Autor

  • Leandro Bastos Nunes

    é procurador da República professor de cursos do MPU (Ministério Público da União) especialista em Direito Penal e Processo Penal e autor do livro "Evasão de Divisas" (Editora Juspodivm).

19 de outubro de 2021, 6h33

A atual redação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 05/2021 é um risco para a sociedade, uma vez que permitirá que o corregedor nacional (que também será o vice-presidente) do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) seja escolhido entre os indicados pelo Congresso Nacional, permitindo indicações políticas oriundas da Câmara e do Senado.

Com efeito, afronta o desenho institucional republicano e democrático dos poderes públicos brasileiros compactuar com a indicação externa de um cargo tão sensível para funcionar como corregedor de uma carreira ou membros de um órgão, haja vista que as diversas competências administrativas da função da Corregedoria estão umbilicalmente ligadas a medidas que poderão gerar impactos no regular exercício das funções de uma instituição, tolhendo a independência relacionada à atividade-fim e indicando o nítido propósito de tolher e interferir nas atividades exercidas pelo órgão.

Em outras palavras, a proposta de emenda à Constituição, caso aprovada, irá gerar uma direta intimidação na atuação de promotores de Justiça e procuradores da República, porquanto permitirá que estes sejam submetidos a sindicâncias ou a processos administrativos disciplinares (PADs, estes após referendo do Plenário) por ordem de um corregedor que poderá servir de instrumento para fins de perseguição política e retaliação por conta de ações ou medidas adotadas em detrimento de setores do poderio econômico e/ou político, prejudicando diretamente o combate à corrupção e à criminalidade organizada e a defesa do meio ambiente e do patrimônio público.

Nesse ponto, cumpre destacar que, por força do artigo 18 do regimento interno do CNMP, o corregedor nacional detém as funções de determinar o processamento de reclamações disciplinares, instaurações de sindicâncias e PAD (este ad referendum do plenário), entre outras providências, figurando na condição de "peça-chave" com sensíveis atribuições dentro do órgão.

Além disso, a PEC altera de dois para cinco o número de integrantes indicados pelo Parlamento, o que, por eles não possuírem conhecimento da rotina funcional do Ministério Público (MP), resultará em um potencial aumento de instauração de processos disciplinares sem noção do funcionamento alusivo à rotina peculiar do órgão.

Por outro lado, não se pode argumentar o fato de que a presença de integrantes indicados pelo Congresso resultaria em uma maior oxigenação e imparcialidade ao Conselho, porquanto o direcionamento de membros oriundos de uma casa política inevitavelmente aumentará o potencial de votos ou posicionamentos de cunho político ou com viés de retaliações às ações e medidas adotadas pelos membros do Ministério Público, em virtude das sensíveis atribuições do Ministério Público brasileiro ligadas ao combate à corrupção e à defesa do meio ambiente e do regime democrático, entre outros.

É válido relembrar que o CNMP funciona, entre outras atribuições, como um tribunal de ética e disciplina, e deve possuir os atributos de imparcialidade no julgamento de eventuais desvios dos membros do Ministério Público; por tais razões, o acréscimo de três integrantes indicados pelo Congresso Nacional inevitavelmente desvirtuará a essência do conselho ligada, ao controle externo da atividade do Parquet e dos desvios funcionais praticados no exercício da função, bem como representará uma quebra da paridade e simetria de tratamento com o Poder Judiciário (artigo 129, §4º, da Constituição Federal) relativas ao quantitativo de dois membros indicados pelo Parlamento no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a indicação do corregedor pelo Parlamento.

Por fim, não se pode olvidar que a imparcialidade e a independência são pilares essenciais ao funcionamento regular de um Estado democrático de Direito, e, sendo o MP uma instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, não poderá ter as suas atribuições impactadas por alterações constitucionais que atinjam a essência de sua relevante missão institucional.

Cumpre esclarecer que aqui não se está defendendo medidas de natureza corporativas ou a ausência do controle externo, dos abusos e desvios funcionais dos membros, e, sim, o respeito à independência funcional (atividade-fim) e à paridade e simetria constitucionais estabelecidas com as funções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) adstritas ao controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e dos deveres funcionais dos juízes.

Diante de tais considerações, considerando que o MP possui a função de defender os interesses da sociedade, a ordem jurídica e o regime democrático, e sendo a mudança prejudicial, entre outros, ao combate à corrupção e à defesa da cidadania e do meio ambiente, espera-se que o Congresso Nacional não aprove a proposta de alteração (PEC nº 05/2021) na estrutura e na composição do CNMP.

Autores

  • é procurador da República, professor de cursos do Ministério Público da União, especialista em Direito Penal e Processo Penal e autor da obra "Evasão de Divisas" (Editora Juspodivm).

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