prisão de inocentes

Grupo de trabalho do CNJ busca melhorar reconhecimento pessoal

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19 de outubro de 2021, 12h24

Um grupo de trabalho instituído no Conselho Nacional de Justiça vai desenvolver regras e procedimentos para aplicação do reconhecimento pessoal no Judiciário e, assim, aumentar a segurança na identificação de suspeitos e evitar a prisão de inocentes.

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O grupo de trabalho é coordenado pelo ministro Rogerio Schietti, do Superior Tribunal de Justiça. "É fundamental que sejam aprimoradas as perícias e as investigações para se alcançar um standard probatório mais seguro, que minimize os riscos de erro judiciário. Temos de criar condições para que esses erros sejam evitados", diz ele. O colegiado tem 180 dias para elaborar produtos, rotinas, normas, treinamentos, publicações e outros instrumentos.

Desde outubro do último ano, 78 pessoas foram inocentadas ou tiveram seus processos suspensos ou a prisão relaxada após os métodos de reconhecimento serem revisados. O STJ já verificou irregularidades no reconhecimento pessoal, por fotografia e presencial, em mais de 50 decisões.

Os membros do GT avaliam que não é possível saber inequivocadamente o número de pessoas presas por erros do gênero, mas pesquisas nacionais e estrangeiras já revelaram que o cérebro humano tem alto grau de falibilidade diante de emoções e de distorções culturais. Segundo levantamento da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, houve decretação de prisão preventiva em 60% dos casos de reconhecimento fotográfico equivocado nas delegacias. Em 83% dos casos, as pessoas apontadas eram negras.

De acordo com a coordenadora executiva da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das Decisões, Isabel Penido, o grupo de trabalho deve se alinhar à perspectiva do sistema interamericano e ao dever de devida diligência nas investigações.

O grupo foi dividido em cinco comitês técnicos, que terão de produzir um manual de diagnóstico dos elementos que facilitam a condenação de inocentes, uma orientação técnica para solucionar essa questão, uma proposta de protocolo e documento para mapear boas práticas no reconhecimento policial, uma minuta de projeto de lei para aperfeiçoamento do Código de Processo Penal e ações de capacitação na temática.

Estão previstos ainda uma audiência pública, um workshop com especialistas, a elaboração de uma pesquisa e uma publicação com os resultados do trabalho. "O grupo de trabalho vai se debruçar sobre um tema bastante sensível e teremos, portanto, grande responsabilidade pelas diretrizes que vão se estabelecer a partir dessas reuniões", disse Luís Geraldo Sant'Ana Lanfredi,  juiz auxiliar da Presidência do CNJ e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Medidas Socioeducativas.

Para Gabriel Sampaio, advogado e coordenador do Programa de Enfrentamento à Violência Institucional e de Litígio Estratégico da Conectas Direitos Humanos, o momento é histórico: "Os reconhecimentos equivocados não se resumem a um erro, mas são consequência de processos decisórios e de uma legislação em descompasso com as evidências científicas produzidas há mais de 50 anos. Que possamos, a partir deste trabalho, assumir o compromisso da nossa geração no enfrentamento ao racismo estrutural, definitivamente derrotando a atual prática com o senso de urgência que o tema exige".

O advogado criminal Luciano Góes, um dos representantes da advocacia negra presentes na reunião de abertura do grupo, disse esperar respaldo às demandas históricas dos movimentos negros brasileiros. "Sobretudo no âmbito dos erros sistêmicos do nosso sistema de Justiça, que terminam em sentenças judiciais que refletem as manifestações diretas e indiretas do racismo antinegro brasileiro e que constituem, sem dúvida alguma, um dos fatores do encarceramento em massa do nosso povo e no nosso país", afirmou.

A relatoria geral dos trabalhos ficará a cargo de Thais Pinhata, representante do Instituto de Cultura e Consciência Negra Nelson Mandela, e de Maurício Dieter, professor de Direito Penal e criminologia da Faculdade de Direito da USP.

O STJ já suspendeu condenações baseadas apenas em reconhecimento pessoal, em mais de uma ocasião. Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.

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