Nada menos que tudo

TJ-DF rejeita queixa-crime de Eduardo Cunha contra Janot por livro lavajatista

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15 de outubro de 2021, 11h55

A denúncia ou queixa que não contém a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, além da classificação do crime, impede o exercício da ampla defesa, na medida em que submete o acusado à persecução penal, privando-o do contexto sobre o qual se desenvolverá a relação processual.

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A queixa de Cunha não especificou quando e como ocorreram as supostas ofensas
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Com esse entendimento, a 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal declarou a inépcia da queixa-crime apresentada pelo ex-deputado federal Eduardo Cunha contra os jornalistas Jailton de Carvalho e Guilherme Evelin, e o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pela prática dos crimes de calúnia, difamação e injúria.

A queixa-crime narra que, por meio da publicação do livro "Nada menos que tudo: bastidores da operação que colocou o sistema político em xeque", os querelados injuriaram o querelante, ofendendo sua dignidade, difamaram-no, atribuindo-lhe fatos ofensivos à sua reputação, e caluniaram-no, imputando-lhe falsamente a prática de crime.

O juízo de primeira instância rejeitou a queixa-crime por entender que a inicial acusatória não descreve adequadamente as circunstâncias do crime em relação aos jornalistas. Em relação ao querelado Rodrigo Janot, o juízo decidiu que não está presente o elemento subjetivo especial, ou seja, a vontade livre, consciente e dirigida a caluniar, difamar ou injuriar alguém.

O relator do recurso apresentado por Cunha, desembargador Gilberto de Oliveira, afirmou que analisou, exclusivamente, a existência, ou não, dos requisitos materiais e processuais para o recebimento da queixa-crime.

Tais requisitos mínimos estão presentes no artigo 41 do Código de Processo Penal, explicou o magistrado. Segundo o dispositivo, a queixa deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a classificação do crime.

"Assim, para o recebimento da queixa-crime, os pressupostos elencados no artigo 41 do CPP devem estar devidamente atendidos, pois a exigência de delimitação precisa do fato imputado encontra-se na linha de aplicação do princípio constitucional da ampla defesa", ressaltou.

Para o relator, no caso, não é possível definir as condutas de cada um dos querelados na obra em que estão escritas as supostas ofensas, sendo necessário que o ex-deputado tivesse informado o momento, a forma e o meio pelo qual tomou ciência das supostas ofensas e a medida, além de demonstrar os atos concretos atribuídos a cada um dos acusados.

Tal insuficiência técnica da peça inicial acusatória inviabiliza a defesa dos querelados, pois a eles não foi informado quando e como o querelante tomou ciência da publicação que lhe teria ofendido, pontuou o desembargador, concluindo pela impossibilidade de recebimento da queixa-crime.

Para João Pedro de Souza Mello e Pedro Xavier Coelho Sobrinho, advogados dos jornalistas, o processo foi uma tentativa de Eduardo Cunha de aborrecer e intimidar dois profissionais sérios e reconhecidos. "O próprio Rodrigo Janot não disse nada demais, mas a ideia de que o jornalista é responsável por aquilo que o entrevistado diz é absurda e disparatada", completaram. "Fez bem o Tribunal em distinguir: em relação a Janot, entendeu que o livro não continha crime. Mas em relação aos jornalistas entendeu que a queixa era inepta: nunca houve nem sequer uma acusação determinada."

Aury Lopes Jr., advogado de Eduardo Cunha, também se manifestou sobre a decisão:

"O advogado de Eduardo Cunha, Aury Lopes Jr, lamenta a equivocadíssima decisão do TJDFT e irá recorrer da decisão ao STJ, pois juridicamente insustentável. A queixa crime obviamente preenche todos os requisitos do art. 41 do CPP, os fatos narrados no livro têm a cristalina intenção ofender, menoscabar e macular a honra e a imagem de Eduardo Cunha, evidenciando-se o especial fim de agir exigido pelos tipos penais imputados. Ademais, o livro atribui falsamente a prática de crimes a Eduardo Cunha, de forma fantasiosa e absurda. É um grave erro confundir a liberdade de expressão com o abuso criminoso do direito de manifestação. Tanto o livro como a posterior entrevista para a revista Veja configuram um criminoso ataque à imagem de Eduardo Cunha e de outras pessoas, tendo inclusive justificado a busca e apreensão na residência do ex-PGR Rodrigo Janot, decretada pelo STF, por conta do episódio envolvendo o ministro Gilmar Mendes."

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Processo 0739619-57.2019.8.07.0001

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