Opinião

'Round 6': a alegoria da vulnerabilidade do perfilamento de dados financeiros

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14 de outubro de 2021, 13h37

A série sul-coreana "Round 6" está fazendo grande sucesso na plataforma de streaming Netflix e nas redes sociais. A trama propõe uma potente alegoria que critica o sistema capitalista e também permite um recorte essencial — e muito polêmico — sobre o regulamento de proteção de dados brasileiro.

Na trama, pessoas comuns e aparentemente escolhidas aleatoriamente acabam como participantes de um torneio com certos jogos perigosos e mortais. Os convidados são selecionados a partir do conhecimento dos organizadores de sua condição financeira.

Em comum, os jogadores possuem o seguinte aspecto: todos estão com dívidas impagáveis junto aos agiotas e instituições financeiras, o que os motiva a aceitar o convite, pois almejam com isso conquistar o grande prêmio em dinheiro.

A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/18), no artigo 7º, inciso X, elenca como uma das hipóteses de tratamento de dados a proteção ao crédito. Num olhar ainda que perfunctório, há a dispensa de qualquer cuidado sobre o tratamento de tais dados pessoais e a lei sequer delimita ou estabelece critérios para a utilização de tais.

Na verdade, a legislação brasileira é a única do mundo que concede esse "cheque em branco" para as instituições financeiras utilizarem e disporem de dados pessoais sem muito (quase nenhum) critério.

Surpresa pouca se retornarmos ao tempo da tramitação do processo legislativo e recordarmos a grande pressão feita pelo setor para que somente se aprovasse a regulação com ressalvas às ditas atividades financeiras. Coincidência ou não, sete dos dez mais ricos do Brasil listados pela Forbes desenvolvem suas fortunas justamente nesse segmento de mercado.

Não diferente, acaloradas discussões foram travadas sobre a Lei do Cadastro Positivo (LC 166/2019), posterior à sanção da LGPD, que de forma automática permitiu a criação de escore de crédito para cada brasileiro, sem qualquer regulamentação, tampouco órgão fiscalizador, permitindo, assim, que as instituições pudessem facilmente ter acesso ao histórico de crédito e débito dos consumidores e estabelecessem a eles uma classificação a partir de uma "pontuação".

A pergunta que fica, além do que desperta esse grande interesse dos bancos em dispor livremente de dados pessoais, é: até quando permitiremos que os "organizadores" cantem "batatinha 1, 2, 3" e selecionem aqueles cujos movimentos lhe interessam a partir da análise indiscriminada de dados pessoais?

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