Adeus, Bretas

TRF-2 manda desdobramento da "lava jato" para Justiça estadual do Rio de Janeiro

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13 de outubro de 2021, 20h26

A prevenção é regra residual para determinar a competência. Como os crimes denunciados na operação favorito, fase da "lava jato", afetaram apenas o estado do Rio de Janeiro, e não a União, não há interesse federal no caso. Com esse entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES) declarou por unanimidade, nesta quarta-feira (13/10), a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o processo da operação favorito. O caso deverá ser remetido à Justiça estadual do Rio.

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Simone Schreiber disse que processo não tem relação direta com Sérgio Cabral
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A corte aceitou pedido do empresário Arthur Soares, o "Rei Arthur", para declarar a incompetência da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, titularizada pelo juiz Marcelo Bretas, para conduzir o processo. O Rei Arthur foi representado pelo advogado Nythalmar Dias Ferreira Filho, que acusa Bretas de irregularidades em acordo de delação premiada. 

Os magistrados estenderam a decisão aos demais réus do caso: os empresários Mario Peixoto, Vinicius Ferreira Peixoto, Alessandro de Araújo Duarte e Marcos Guilherme Rodrigues Borges; o deputado estadual Paulo Melo (MDB), seu filho Iury Motta Melo de Sá e seu funcionário Fabio Cardoso do Nascimento; o vereador de Saquarema Eduardo Pinto Veiga (PSB) e o secretário municipal de Finanças da cidade, Aguido Henrique Almeida da Costa.

A relatora do caso, desembargadora Simone Schreiber, apontou que a conexão do processo da operação favorito foi afirmada apenas de modo genérico em relação a outros feitos da "lava jato" pela 7ª Vara Federal Criminal do Rio, sem maiores digressões sobre os fatos imputados. Segundo a magistrada, o caso não tem relação direta com os crimes supostamente praticados pelo ex-governador Sérgio Cabral, o que justificaria a prevenção do juízo.

Além disso, Simone destacou que colaboração premiada não é critério de determinação, modificação ou concentração de competência, como decidiu o STF na Questão de Ordem no Inquérito 4.130. Portanto, declarou a relatora, as delações citadas na denúncia e usadas para corroborar as acusações do Ministério Público Federal não são aptas a alterar as regras de competência.

"Eventuais provas descobertas em outras operações utilizadas para corroborar alguns aspectos da denúncia não importam em conexão probatória significativa a ponto de alterar a competência por conexão. Nem mesmo o fato de haver acusação no sentido de que determinados réus integram a mesma organização criminosa é, por si, suficiente para modificar a competência pela conexão", ressaltou a desembargadora.

Schreiber também afirmou que a prevenção é regra residual para determinar a competência. De acordo com ela, não ficou provado interesse da União no caso, uma vez que os crimes denunciados afetaram apenas o estado do Rio. "Foram imputados crimes de corrupção para deputados estaduais favorecerem contratos de pessoas jurídicas, no âmbito de atuação desses parlamentares, não incidindo quaisquer das regras do artigo 109, I, da Constituição Federal", opinou.

O dispositivo estabelece que, aos juízes federais, compete processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho".

Delação bombástica
O Habeas Corpus em favor do Rei Arthur foi impetrado pelos advogados João Pedro Coutinho Barreto e Nythalmar Dias Ferreira Filho. Em acordo de colaboração premiada firmado com a Procuradoria-Geral da República, Nythalmar afirma que o juiz Marcelo Bretas negociou penas, orientou advogados e combinou estratégias com o Ministério Público. 

Segundo a revista Veja, o advogado criminalista apresentou uma gravação na qual Bretas diz que vai "aliviar" acusações contra o empresário Fernando Cavendish, delator e que também chegou a ser preso pela "lava jato".

A revista transcreve a gravação, na qual Bretas afirma: "Você pode falar que conversei com ele, com o Leo, que fizemos uma videoconferência lá, e o procurador me garantiu que aqui mantém o interesse, aqui não vai embarreirar", diz Bretas. "E aí deixa comigo também que eu vou aliviar. Não vou botar 43 anos no cara. Cara tá assustado com os 43 anos", diz, em outro trecho do diálogo.

Leo seria o procurador Leonardo Cardoso de Freitas, então coordenador da operação no Rio de Janeiro. Os "43 anos" se referem à decisão que condenou o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, o que gerou temor generalizado nos réus.

Além disso, Nythalmar afirma que Bretas atuou para que Wilson Witzel (PSC) fosse eleito governador do Rio em 2018. De acordo com o advogado, no segundo turno, Paes, em busca de uma trégua, se comprometeu a nomear uma irmã do juiz para uma secretaria, se fosse eleito. Depois de Witzel ganhar as eleições, ele, Eduardo Paes e Bretas firmaram um acordo informal, narra Nythalmar. O ex-prefeito assegurou que abandonaria a política "em troca de não ser perseguido" (o que não aconteceu, pois foi novamente eleito prefeito do Rio em 2020). Já Witzel nomeou Marcilene Cristina Bretas, irmã do juiz, para um cargo na Controladoria-Geral do Estado do Rio. À Veja, Bretas negou as acusações.

Clique aqui para ler a decisão
HC 5007734-21.2020.4.02.0000

*Texto atualizado às 10h58 do dia 14/10/2021 para acréscimo de informações.

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