Opinião

Lei do superendividamento, um benefício coletivo

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12 de outubro de 2021, 11h16

Em vigor há poucos dias, a Lei 14.181/2021, conhecida como Lei do Superendividamento, trouxe alterações ao Código de Defesa do Consumidor (CDC) e se propõe a salvar o consumidor das suas próprias dívidas, sendo este talvez o meio pelo qual se alcance o fim, que é o benefício coletivo. Vamos pensar no consumidor, inicialmente e, neste caso, o chamaremos de João, nosso personagem.

João fez uma compra em uma rede de varejo, pagou aquela compra e foi ali expedida a respectiva nota fiscal. Bem, neste negócio houve então a incidência de alguns impostos e taxas, certo? É aí onde o estado ganha e a economia se reforça. Então, podemos dizer que a lei do superendividamento na verdade veio para beneficiar o estado? Sim! E como meio, trouxe benefício ao consumidor.

É necessário preservar a capacidade de consumo do consumidor, para que o ciclo de consumo se mantenha ativo e assim as fontes de receita (impostos e taxas) cheguem ao estado, gerando assim recursos para custeio da máquina pública.

Voltemos a João, nosso consumidor. João tem algumas contas a pagar e sente-se apertado financeiramente. Recorre então ao banco através de uma linha de crédito que ele acredita que irá auxiliá-lo naquele momento, mas logo em seguida não consegue pagar o empréstimo feito no banco e, por isso, usa uma outra linha de crédito, com intenção de que cubra seus débitos e ele fique com uma parcela única. Também não resolveu. A carga de juros a que João se submeteu fez com que os pagamentos superassem sua capacidade de pagamento.

João então recebe proposta de seu gerente de adiantar o seu décimo terceiro salário, e assim poderá pelo menos abater sua dívida, mas novamente ele não consegue e os valores só aumentam. Considerando a renda de João e tendo em vista que as dívidas não recuaram, ele não conseguirá pagar suas contas e comprometerá suas despesas básicas.

Como João, existem cerca de 30 milhões de brasileiros; ou seja, 15% da população do país, segundo estimativas do Serasa, em uma verdadeira bola de neve financeira. São os superendividados.

Nesse sentido então, nós observamos que a lei do superendividamento traz, de um lado, uma solução para mover o ciclo econômico, pois colocará no mercado de consumo novamente aqueles consumidores que não faziam parte dele por estarem superendividados e, por outro lado, salvará o consumidor daquela situação de bola de neve financeira, permitindo que ele torne a consumir, garantindo o seu mínimo existencial.

Essa solução que a lei do superendividamento aponta é possível através do mecanismo que ela trouxe, em que é celebrada a repactuação de dívidas, desta vez em bloco, semelhante à recuperação judicial, no caso das empresas, mas aqui apenas para pessoas físicas.

O consumidor endividado irá procurar o Judiciário, o seu advogado especialista de confiança ou os órgãos de proteção e defesa do consumidor para auxiliá-lo, devendo apresentar aos credores um plano de pagamento que terá como prazo máximo cinco anos e, não havendo acordo, o prazo, valores e formas de pagamento podem ser determinadas por juiz.

A renegociação vale apenas para dívidas de consumo, como contas de água e luz, carnês de lojas ou empréstimos de instituições financeiras, entre outros, não se aplicando a pagamento de impostos, pensão alimentícia, crédito habitacional ou serviços de luxo.

Vale lembrar que dívidas em excesso podem comprometer o custeio das necessidades básicas de um indivíduo. Sem dinheiro para água e supermercado, o consumidor põe a própria vida em risco; por isso, o próprio texto da lei aponta que qualquer tentativa de revisão e reparcelamento dos valores deve preservar o mínimo existencial. Essa quantia seria o valor ideal para assegurar a subsistência de alguém, isto é, o pagamento de água, luz, moradia e comida.

Voltemos a João. Agora que ele soube da possibilidade de renegociação de suas dívidas por ser um superendividado, buscou orientação de seu advogado e foram juntos ao Procon de sua cidade. João recebe um salário mínimo e, feitos seus cálculos com ajuda do seu advogado, pôde perceber que precisa de 80% do seu salário para garantir suas despesas básicas ou o seu mínimo existencial.

Neste caso, João reunirá os seus credores, fará uma renegociação em bloco e apenas 20% de sua renda poderá ser comprometida com aquela repactuação, cujo prazo poderá ser de até cinco anos. Dessa forma, João retornará ao mercado de consumo, pois terá seu crédito restabelecido, ganhando João, o estado e a economia.

O benefício de ter suas dívidas repactuadas em bloco, seja via conciliação ou por determinação legal dos seus prazos, forma e valores, só poderá ser utilizado novamente após dois anos da quitação do primeiro e, nos casos de haver alguma alteração na renda do consumidor, poderá ser revisto.

O consumidor é a mola mestra que impulsiona a economia. A manutenção da saúde financeira do consumidor é fundamental para o pleno funcionamento das engrenagens da economia. Sugerimos que todo consumidor tenha sempre planos para suas compras e contratações de serviços de modo a não comprometer sua renda, assim como fornecedores tenham nos seus negócios alternativas de auxílio aquele consumidor inadimplente de forma a que ele não perca sua capacidade financeira, tão pouco o fornecedor perca seu cliente.

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