Opinião

Considerações sobre a Resolução Antaq nº 57/2021

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11 de outubro de 2021, 13h16

No dia 1º deste mês entrou em vigor a Resolução Antaq Nº 57, de 17 de  setembro, que dispõe sobre os procedimentos para transferência de controle societário de sociedade titular de contratos e da transferência de titularidade dos próprios contratos relativos ao setor portuário.

Essa resolução preenche uma lacuna existente na legislação aplicável ao setor desde a publicação da Lei nº 10.233/2001, que criou a Antaq, e não superada com a edição do Decreto nº 8.033/2013 — alterado pelo Decreto nº 9.048/2017 , que previu a competência da agência para analisar e aprovar tanto a troca de titularidade de contrato de concessão, arrendamento e de autorização, quanto a transferência de controle societário de sociedades titulares de tais direitos e obrigações portuários, mas não detalhou o procedimento necessário para tanto.

A regulamentação do procedimento afasta a assimetria de informações e contribui para a existência de previsibilidade no exercício da função reguladora do setor portuário, pressupostos fundamentais para a atração de investimentos. O procedimento criado contempla a apresentação à Antaq de uma série de documentos, aptos a demonstrar as capacidades jurídica e econômico-financeira, a regularidade fiscal e trabalhista e a qualificação técnica do cessionário (receptor dos direitos e obrigações contratuais ou societárias), documentos esses que devem atender aos mesmos requisitos dispostos no edital de licitação, quando da concessão ou autorização inicial. A solicitação de tantas informações tem por objetivo a continuidade e regularidade do serviço público concedido, interesse maior do poder concedente.

Além das transferências propriamente ditas, a Resolução Antaq nº 57/2021 contemplou as hipóteses de transferência de controle societário decorrentes da execução de garantia e de assunção do controle de administração da concessionária (step in right), concedidos a financiadores ou garantidores da sociedade concessionária (respectivamente §2º e §3º do artigo 4º), temas esses relevantes para o desenvolvimento de project finance no país.

Um ponto que chama a atenção em referida resolução é a necessidade de submissão, à análise da Antaq, de acordo de acionistas (inciso XIII do artigo 10º) e de demais acordos que versem sobre direitos de voto e de eleição de maioria dos administradores. Com esse dispositivo, a Antaq, acertadamente, contempla como poder de controle o poder de eleição de membros da administração e poder de veto, além daqueles já tradicionais relacionados à participação no capital social da sociedade. Ao requerer a apresentação desses contratos com objeto societário, a Antaq exerce o controle dos direitos e obrigações tipicamente presentes em projetos de capital, como, por exemplo, o step in right.

Sem prejuízo da apresentação de acordo de acionistas no caso de transferência de participação societária, os acionistas devem estar atentos a arranjos societários que possam transferir o controle de um acionista a outro (ainda que permaneçam idênticos os acionistas e seus respectivos percentuais), como resultado de operação de financiamento entre aquelas mesmas partes (por exemplo, em garantia à concessão de um mútuo por um dos sócios para financiar o projeto, os demais sócios conferem direitos mais amplos de decisão ao sócio credor). A transferência de controle, sem a anuência do poder concedente, implica a declaração de caducidade da concessão, na forma do artigo 27, da Lei 8.987/1995.

A possibilidade de transferência de contrato de concessão e de controle (de todas as sociedades concessionárias e não somente daquelas do setor portuário) ainda pode ter desdobramentos. Desde 2003, tramita no STF a ADI nº 2946, cujo objetivo final é a declaração de inconstitucionalidade do artigo 27 da Lei 8.987/1995 para excluir a possiblidade de transferência da concessão e do controle de sociedade concessionária, sob o argumento de alegada afronta ao artigo 175 da Constituição Federal. Em agosto, os ministros Dias Toffoli e Alexandre Moraes proferiram voto para reconhecer a inconstitucionalidade apenas da transferência da concessão (e não da transferência do controle acionário).

Apesar de existir regramento específico na Lei nº 10.233/2001, é certo que o resultado do julgamento da ADI poderá impactar negativamente o avanço trazido pela Resolução Antaq nº 57/2021. Isso porque as modalidades de transferência abordadas pela resolução — institutos jurídicos objeto da ADI 2946  constituem alternativas para a manutenção dos serviços prestados, independentemente de quem possui o controle societário da concessionária de serviços públicos, permitindo assim solidez e constância dos investimentos necessários para modernização e manutenção setor portuário brasileiro. A troca de controle societário é, na maioria das vezes, seguida de aportes financeiros dos controladores entrantes, resultando em melhoria dos serviços, objetivo final das concessões.

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