Opinião

A responsabilidade do gestor de órgãos e entidades junto aos Tribunais de Contas

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30 de novembro de 2021, 7h11

Um fenômeno bastante comum na praxe do controle externo é a imputação de responsabilidade aos gestores que ocupam a posição de autoridade máxima na estrutura de órgãos e entidades da Administração Pública pela ocorrência de quaisquer tipos de achado de auditoria.

Valendo-se do emprego de uma responsabilidade objetiva tácita (e não prevista em lei), relatórios de auditoria ignoram a segregação de funções e a individualização de condutas para implicar de forma automática as autoridades máximas em todas as irregularidades relacionadas a prestações de contas, tomadas de contas especiais e auditorias especiais dos órgãos e entidades em que eles ocupam a posição de liderança.

No racional empregado nesse entendimento, as equipes de auditoria dos Tribunais de Contas tratam o gestor máximo dos órgãos e entidades como um garantidor universal da higidez dos atos administrativos praticados pelos seus subalternos.

Em que pese tal praxe por parte das equipes de auditoria dos Tribunais de Contas é preciso destacar que desde 2002 o TCU (vide Acórdão nº 213/2002 proferido pelo plenário) tem entendido que não compete ao gestor máximo rever todos os atos administrativos praticados por seus subordinados, sob pena de se inviabilizar a gestão, especialmente quando a estrutura administrativa da entidade é complexa e, desde 2006, aquela corte de contas (vide Acórdão 54/2006 proferido pela 2ª Câmara) já deixava claro que não é razoável exigir de um gestor a revisão de atos pretéritos, até mesmo porque, estando a Administração jungida ao princípio da legalidade, supõe-se que estes tenham sido produzidos de acordo com os preceitos legais, em função da presunção de legitimidade dos atos administrativos.

Mais recentemente, em reforço a tais posicionamentos, o TCU entendeu que "não cabe a responsabilização de dirigente de órgão ou entidade por irregularidade que só poderia ser detectada mediante completa e minuciosa revisão dos atos praticados pelos subordinados" (v.g. Acórdão 1529/2019-Plenário).

Por fim, registre-se que no Acórdão 2585/2021 o plenário do TCU entendeu que "o dirigente máximo não deve ser responsabilizado quando as irregularidades nas contratações sejam relacionadas a aspectos técnicos específicos da licitação, que não lhe competem supervisionar diretamente, a exemplo de procedimentos ligados à solicitação e utilização de orçamentos para abertura de procedimentos licitatórios a empresas com sócios em comum".

O Acórdão 2585/2021 é alentador e pode servir para sepultar de vez a presunção equivocada (e, sobretudo, ilegal) de que a autoridade máxima é presumivelmente o responsável preferencial pela ocorrência de irregularidades nos órgãos e nas entidades da Administração Pública.

O gestor público que ocupa o topo da cadeia hierárquica de órgãos e entidades não é um plenipotenciário dotado de onisciência e onipresença. Pois, pelo contrário, é alguém que é apenas o ponto culminante de vários atos administrativos encadeados, todos praticados por estruturas mais ou menos capilarizadas, mas sempre revestidos de presunção de legitimidade.

Em tal cenário, imaginar que o gestor máximo possa se responsabilizar, como se por ele mesmo tivessem sido praticados, por todos os atos praticados no âmbito dos órgãos e entidades é simplesmente insustentável.

Ante o exposto, entender equivocadamente que as autoridades máximas respondem de forma automática por tudo o que ocorre nos órgãos e entidades da Administração Pública e, por isso, incluí-las na matriz de responsabilidades de achados de auditoria é uma praxe que precisa ser abolida no âmbito do controle externo.

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