Opinião

A essencialidade e a seletividade no ICMS sobre energia e telecomunicações

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29 de novembro de 2021, 11h05

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal finalizou o julgamento do Recurso Extraordinário nº 714.139/SC-Tema nº 745, cuja celeuma envolvia bem mais do que apenas a discussão quanto a constitucionalidade ou não da incidência de alíquota de 25% a título de ICMS sobre energia elétrica e serviços de telecomunicação pelo estado de Santa Catarina.

O que estava em jogo para debate, a bem da verdade, era a aplicação mais justa e correta do princípio da essencialidade a determinado serviço ou produto cuja existência, nesse caso em concreto, é ímpar para a continuidade ou desenvolvimento de qualquer atividade hoje existente no mercado.

Convém destacar que o argumento do estado catarinense na defesa da sua cobrança, a qual diga-se, desproporcional, caminhava para justificar o percentual mais alto de ICMS para esses setores, em razão do seu seleto ramo de atuação, ou seja, era fundamentado pela alta capacidade contributiva que tais empresas detêm e, assim, em claro e consequente arrecadação.

O que não estava na conta do argumento estatal era a lógica mais evidente que existe no mercado: quanto maior incidência de tributos ou alíquotas deste sobre determinado serviço ou produto, maior o seu preço e, assim, ainda maior a limitação ao seu acesso e a prestação minimamente adequada aos contribuintes — leia-se, cidadãos!

E tal raciocínio fica fácil de ser extraído quando da leitura do voto do ex-ministro Marco Aurélio Melo, que estabeleceu a tese vencedora: "Adotada, pelo legislador estadual, a técnica da seletividade em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), discrepam do figurino constitucional alíquotas sobre as operações de energia elétrica e serviços de telecomunicação previstas em patamar superior ao das operações em geral, considerada a essencialidade dos bens e serviços — artigos 150, inciso II, e 155 §2º, inciso III, da Carta da República".

Concordemos ou não com as razões para justificar a aplicação de uma alíquota desarrazoada de determinado tributo sobre um produto que, particularmente a nós, possa ter certa relevância ou importância a ponto de discutirmos em debates calorosos e argumentos exaltados, a verdade nesse caso em específico é uma apenas; tanto a energia elétrica quanto os serviços de telecomunicações são inerentemente importantes a tudo e a todos, pois sem um não existe o outro e, sem o outro, não faz muito sentido ou importância a existência do primeiro.

E no recente julgamento, ao menos quanto ao seu mérito, tendo em vista que, dado o histórico recente do STF quando se trata da modulação dos efeitos de determinada decisão, é praticamente imprevisível qual será a solução adotada para esse caso, somando-se ainda a pressão exercida pelos secretários de Fazenda de todo o país para que a decisão tenha efeitos desde 2024 e a sugestão do ministro Dias Toffoli para a aplicação de tal entendimento apenas a partir de 2022, caberá ao STF definir o que deverá prevalecer, fato é que até o presente momento prevaleceu a sabedoria e a razoabilidade.

Em verdade, o STF definiu que não basta o Estado apenas olhar aquilo que lhe interessa quando os fins se justificam para obter uma maior arrecadação, há também de se observar as consequências que eventual aumento demasiado da alíquota de determinado tributo pode gerar na sociedade como um todo. E, nesse caso, essas consequências não só podem como têm sido diariamente observadas, bastando verificar que o número de cidadãos que voltaram a se utilizar do fogão a lenha para cozinhar seu alimento aumentou vertiginosamente em virtude da tributação sobre o gás (produto essencial), diminuiu-se drasticamente a venda de produtos da linha branca, em virtude do preço da energia elétrica e da seca que o país vem enfrentado nos últimos anos, também como ficou claro com a pandemia que aparenta estar sendo vencida que milhões de brasileiros não conseguiram acompanhar seus estudos ou tiveram dificuldades de continuar com seu dia a dia de trabalho em razão dos altíssimos custos aos serviços de telecomunicações.

O que ficou finalmente esclarecido na decisão do STF é que deve o Estado não apenas aplicar a seletividade a determinados produtos e serviços visando unicamente à capacidade contributiva que determinados seguimentos possuem, mas pensar primeiramente na sua essencialidade e importância para o próprio desenvolvimento da sociedade, bem como suas ramificações e interações com tantos outros mercados que dependem de sua existência para minimamente para existirem. Todos os cidadãos conseguem entender a razão da existência de uma alta carga tributária para os produtos provenientes do tabaco e bebidas alcoólicas, pois estes não são essenciais para a sobrevivência digna do ser humano, agora pode comunicar-se e utilizar produtos e serviços básicos, como medicamentos, provenientes do uso necessário de energia elétrica para sua fabricação/distribuição, mostra-se de um caráter essencial muito mais relevante.

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