conflito de competência

Restrição da jurisdição federal delegada só vale para casos ajuizados a partir de 2020

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16 de novembro de 2021, 7h49

Os efeitos da Lei 13.876/2019 na modificação de competência para o processamento e julgamento dos processos que tramitam na Justiça Estadual no exercício da competência federal delegada, após as alterações promovidas pela Emenda Constitucional 103/2019, só se aplicam aos feitos ajuizados após 1º de janeiro de 2020.

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Em IAC, STJ delimitou lei que alterou a abrangência da jurisdição federal delegada
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As ações, em fase de conhecimento ou de execução, ajuizadas antes dessa data continuarão a ser processadas e julgadas no juízo estadual.

Essa foi a tese fixada pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, em incidente de assunção de competência (IAC) originado de conflito de competência entre a 21ª Vara Federal do Rio Grande do Sul e da 1ª Vara Cível de Guaíba (RS).

A discussão no caso concreto buscava definir, a partir das mudanças promovidas pela EC 103/2019, onde deveria tramitar uma ação previdenciária para determinar ao INSS o restabelecimento de aposentadoria por invalidez com o adicional de grande invalidez.

O que mudou
Até a promulgação da emenda, o parágrafo 3º do artigo 109 da Constituição previa que seriam processadas e julgadas na Justiça Estadual, no foro de domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que fossem parte o INSS e segurado, sempre que a comarca não fosse sede de vara federal.

Com a EC 103/2019, a mesma norma passou a prever que a lei poderá autorizar a delegação dessa jurisdição federal.

Antes mesmo da reforma, foi editada a Lei 13.876/2019, fixando que a delegação da competência só será admissível nas ações previdenciárias quando a comarca de domicílio do segurado estiver localizada a mais de 70 km de município sede de Vara Federal.

Definiu, ainda, que essa modificação legal teria vigência "a partir do dia 1º de janeiro de 2020".

Rafael Luz
Ministro Mauro Campbell Marques é o relator do IAC julgado pela 1ª Seção
Rafael Luz

Com isso, juízos estaduais que exercem jurisdição federal delegada passaram a encaminhar aos juízos federais os processos que tratam do tema, o que gerou discussões sobre a aplicação da nova orientação legal, com potencial de levar ao STJ milhões de conflitos de competência.

Em 2020, o Conselho Nacional de Justiça estimava cerca de 1,5 milhão de processos em trâmite. Por isso, o STJ assumiu para si a função de delimitar tese e esclarecer o tema. Com a admissão do IAC pela 1ª Seção, todos os processos com essa discussão permaneceram suspensos. A relatoria ficou com o ministro Mauro Campbell Marques.

Amicus curiae (amiga da corte) no processo, a Associação Brasileira dos Advogados Previdenciários apresentou estudo segundo o qual a aplicação da nova regra migraria cerca de 70% dos processos da Justiça Estadual para a Justiça Federal mais próxima, causando prejuízos ao jurisdicionado e limitando-lhe o acesso à jurisdição.

Não a tôa, em dezembro de 2019 o CNJ recomendou aos juízes estaduais que mantivessem a tramitação dos feitos propostos antes da eficácia da Lei 13.876/2019, abstendo-se de remetê-los à Justiça Federal enquanto não resolvido o tema pelo STJ.

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Casos contra o INSS podem ser julgados pela Justiça Estadual por meio da competência federal delegada
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Como fica
As alterações promovidas pela Lei 13.876/19 são aplicáveis aos processos ajuizados após a vacatio legis (vacância da lei) estabelecida pelo artigo 5º, inciso I — o trecho que prevê vigência a partir do dia 1º de janeiro de 2020.

Os feitos em andamento, estejam eles ou não em fase de execução, que tenham sido ajuizados até 1º de janeiro de 2020 continuam sob a jurisdição em que estão.

 O julgamento do IAC na 1ª Seção ainda definiu outros pontos sobre o tema. Primeiro, afastou a ocorrência de inconstitucionalidade do artigo 3º da Lei 13.876/2019, pois não há modificação de competência absoluta, já que continua a ser da Justiça Federal. A norma apenas delimitação de seu alcance.

Segundo, reforçou que quando juiz estadual e juiz federal entram em conflito, a competência para apreciar o incidente é do Superior Tribunal de Justiça. Mas se o conflito se estabelece entre juiz estadual no exercício da jurisdição federal delegada e juiz federal, competente será o Tribunal Regional Federal.

Tese e caso concreto
No caso concreto julgado, a ação previdência foi ajuizada em 2019 – antes do marco definido pela Lei 13.876/2019, na Justiça Estadual de Guaíba (RS), cidade que fica a menos de 70 km de Porto Alegre, capital que, por sua vez, é sede de vara federal.

A partir do que definiu o STJ, a ação previdenciária fica como está: deve ser mesmo julgada pela Justiça Estadual de Guaíba (RS).

A tese aprovada, na íntegra, foi:

Os efeitos da Lei nº 13.876/2019 na modificação de competência para o processamento e julgamento dos processos que tramitam na Justiça Estadual no exercício da competência federal delegada insculpido no art, 109, § 3º, da Constituição Federal, após as alterações promovidas pela Emenda Constitucional 103, de 12 de novembro de 2019, aplicar-se-ão aos feitos ajuizados após 1º de janeiro de 2020. As ações, em fase de conhecimento ou de execução, ajuizadas anteriormente a essa data, continuarão a ser processadas e julgadas no juízo estadual, nos termos em que previsto pelo § 3º do art. 109 da Constituição Federal, pelo inciso III do art. 15 da Lei n. 5.010, de 30 de maio de 1965, em sua redação original.

IAC 6
CC 170.051

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