Opinião

Mercado de serviços ambientais no Brasil: quem acredita?

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15 de novembro de 2021, 9h13

"Nós, do governo federal, entendemos que, no nosso plano de combate ao desmatamento, o maior desafio é criar um mercado de serviços ambientais em suas diversas formas", afirmou Joaquim Álvaro Pereira Leite, ministro do Meio Ambiente, ao assumir a delegação brasileira na Conferência do Clima, em Glasgow, conforme matéria da revista Piauí.

Aparentemente, pelo que diz o ministro, deveríamos apostar mais na criação de estímulos econômicos para a preservação do que nas atividades de fiscalização. É uma tese conhecida. Mas, afinal, sabendo que a fiscalização não é o ponto forte do atual governo (perdoem o eufemismo), será mesmo que o fomento ao mercado de serviços ambientais é a prioridade?

A Lei nº 14.119/21 foi sancionada pelo presidente, em janeiro deste ano, com vetos que descaracterizariam por completo o programa nacional de pagamento por serviços ambientais, incluindo a eliminação de incentivos fiscais para a preservação. O Ministério da Economia, sob Paulo Guedes — outro ministro que alardeia a importância e o potencial do pagamento por serviços ambientais no Brasil — foi o principal responsável pela tentativa de desidratar a lei.

Felizmente, o Congresso derrubou os vetos. Entretanto, a concretização da lei depende ainda de regulamentação, por meio de decreto presidencial e de outros atos do Poder Executivo. A bola continua com o governo federal. Quase um ano depois, solicitei ao Ministério do Meio Ambiente, mediante pedido de acesso à informação, uma posição sobre o assunto — prazo para publicação, estudos, pareceres etc.

A resposta foi bem direta: "Não há previsão de quando a regulamentação será publicada". Apesar de mencionar a realização de "análises, reuniões e consultas técnicas", não há nenhum detalhe, documento ou cronograma. A falta do Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, por exemplo, impedirá a utilização dos incentivos tributários criados pela lei. O veto foi derrubado, mas nem tanto.

Ou seja: se o pagamento por serviços ambientais fosse uma aposta efetiva do governo federal, a regulamentação da lei nacional poderia ser promovida gradualmente, para ampliar e fortalecer as diversas iniciativas já existentes nesse campo. De fato, alguns estados e municípios adotam essa política pública há mais de uma década. É o caso de programas como o Bolsa Floresta, do estado do Amazonas, e o Conservador de Águas, do município de Extrema (MG).

Outra abordagem estratégica de serviços ambientais envolveria as regiões metropolitanas, inspirando-se na experiência de Nova York — que criou incentivos para preservação dos mananciais que abastecem a cidade. No Brasil, desde 2015 o Estatuto da Metrópole define o pagamento por serviços ambientais como uma das diretrizes de governança interfederativa. Entretanto, conforme pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios, esta aparenta ser mais uma lei que "não pegou". Depois de seis anos, os planos de desenvolvimento urbano — que materializariam as políticas integradas de pagamento por serviços ambientais — não saíram do papel (se é que chegaram a tanto). Com raras exceções, governadores e prefeitos também não parecem apostar nesse caminho. E, claro, o governo Bolsonaro não parece minimamente interessado em cumprir o papel que cabe à União na implementação dessa lei.

Em resumo, temos no Brasil a política ambiental "nem nem": nem fiscalização, nem incentivos. Fica difícil conquistar credibilidade (e, consequentemente, recursos internacionais), na Escócia ou em qualquer lugar.

Autores

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    é advogado, autor de Parcerias Sociais (Juruá, 2019) e coautor de Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (FGV/GIFE, 2020), coordenador do curso Tribunais de Contas e Parcerias com o Terceiro Setor, do Instituto Filantropia.

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