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Aprovado pelo Senado, PL das Fake News é ampliado na Câmara

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5 de novembro de 2021, 20h17

Foi adiada para semana que vem, por pedido de vista coletivo, a votação do substitutivo do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) ao Projeto de Lei  2630/20, e mais de 70 apensados, que pretende aperfeiçoar a legislação brasileira referente à liberdade, responsabilidade e transparência na internet.

melpomen
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Conhecido como "PL das Fake News", o projeto já foi aprovado pelo Senado e está sendo analisado por grupo de trabalho criado em junho pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que já anunciou que pretende colocar a proposta em votação no plenário neste mês. 

A proposta traz regras para os provedores de redes sociais, como Facebook e Instagram, e serviços de mensageria instantânea, como WhatsApp e Telegram. "Essa ideia de que o serviço de mensagem trata de comunicação privada e é diferente de outras redes talvez fizesse sentido tempos atrás. Hoje é nítido que o serviço de mensagem tem outras funcionalidades. Não é só um para um, nem um para um grupo, tem muitas hipóteses, e a viralização de determinadas notícias se dá no serviço de mensagem", disse.

No substitutivo, o relator estendeu ainda a aplicação da lei para ferramentas de busca, como Google e Yahoo. As regras incidirão sobre provedores que oferecem, profissionalmente e com fins econômicos, serviços ao público brasileiro e que tenham mais de 2 milhões de usuários registrados, inclusive as empresas sediadas no exterior — caso do Telegram, por exemplo.

O relator excluiu do texto a obrigação de as empresas estrangeiras terem sede no país, sob o argumento de que a medida afastaria investimentos, mas manteve a obrigação de nomearem representantes legais no Brasil.

Fora das regras
Estarão excluídos das regras previstas na proposta as empresas jornalísticas, enciclopédias online sem fins lucrativos, repositórios científicos e educativos ou plataformas de desenvolvimento e compartilhamento de software de código aberto.

O texto prevê que os conteúdos jornalísticos utilizados pelos provedores sejam remunerados. Todas as regras serão revisadas no prazo de cinco anos.

Orlando Silva também exclui do texto artigos polêmicos que poderiam possibilitar o rastreamento de usuários como o que previa a guarda, por três meses, dos registros de mensagens encaminhadas em massa e o que possibilitava às empresas requererem documento de identidade dos responsáveis pelas contas. Além disso, criou um novo crime: promover ou financiar disparo em massa de mensagens inverídicas com o uso de robôs.

Moderação de conteúdo
O relator explicou que não incluiu no substitutivo o conceito de desinformação, porque não chegou a uma definição adequada, mas se mostrou aberto à fazer a conceituação.

Ele destacou a importância de se instituir regras de transparência sobre a publicidade e sobre a moderação de conteúdo realizada pelas plataformas — por exemplo, a exclusão de contas e conteúdos. No texto, Orlando Silva exigiu notificação para as moderações feitas pelos provedores, a garantia do contraditório e de reparação no caso de moderação inadequada.

Autorregulação
Além disso, determinou a criação pelos provedores de uma instituição de autorregulação. Uma das principais funções dessa instituição será a de criar e administrar uma plataforma digital voltada ao recebimento de denúncias sobre conteúdos ou contas.

A autorregulação das plataformas será supervisionada pelo Comitê Gestor da Internet (CGI.br). Na visão do relator, esse modelo é melhor do que criar o Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, prevista no texto do Senado, uma vez que o CGI já se constitui como um órgão experiente em questões regulatórias da internet.

O CGI irá, por exemplo, estabelecer diretrizes para a elaboração do Código de Conduta dos provedores.

O deputado destacou ainda que foram realizadas 15 audiências públicas no grupo de trabalho, o que garantiu um amplo debate sobre o tema. Se disse surpreso com a postura de agentes econômicos de fazer ataques ao texto, assim como com as críticas da Frente Parlamentar Mista da Economia e Cidadania Digital, a qual ele mesmo integra e, segundo ele, não participou do debate sobre o texto. 

A presidente do grupo, deputada Bruna Furlan (PSDB-SP), disse querer  trabalhar junto com o governo e com a frente parlamentar para buscar consensos.

Críticas ao texto
Para o deputado Filipe Barros (PSL-PR), o projeto deve trazer conceitos como desinformação, notícia falsa e discurso de ódio, para evitar o ativismo judicial. "O projeto, o relatório, do jeito que está, sem trazer conceitos claros, vai causar judicialização da política e do debate público", alertou. Barros diz temer que um juiz acabe decidindo "o que pode ser dito e o que não pode ser dito, aquilo que é falso, e o que é verdadeiro".

Barros defende ainda que sejam instituídas regras mais categóricas para as plataformas interferirem no debate público e na política. "Temos que colocar freio nas arbitrariedades que as plataformas têm feito e nas que podem fazer", disse. Para ele, as plataformas não podem derrubar páginas no caso de abuso de liberdade de expressão e devem retirar apenas conteúdos específicos.

Além disso, ele defende que as regras para os serviços de mensagem instantânea devem ser diversas daquelas previstas para as redes sociais e que as atribuições dadas ao CGI.br sejam dadas ao Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (Senacom). Com informações da Agência Câmara.

O substitutivo faz algumas modificações no texto original, do Senado. Confira abaixo:

Abrangência da lei
– Estende a aplicação da lei para ferramentas de busca, como Google e Yahoo.
– Exclui a obrigação de as empresas estrangeiras terem sede no País, mantendo a obrigação de manterem representante legal no Brasil.

Prazos
– Prevê prazo de 180 dias para a lei entrar em vigor.
– Institui prazo de cinco anos para que a lei seja revisada.

Conteúdos jornalísticos
– Prevê que os conteúdos jornalísticos utilizados pelos provedores sejam remunerados.

Disparos em massa
– Exclui artigo prevendo que as empresas deveriam guardar, por três meses, os registros dos envios de mensagens veiculadas em encaminhamentos em massa.
– Inclui a vedação de encaminhamentos de mensagens ou mídias recebidas de outro usuário para múltiplos destinatários.
– Prevê que listas de transmissão só poderão ser encaminhadas e recebidas por pessoas que estejam identificadas, ao mesmo tempo, em ambas as listas de contatos de remetentes e destinatários.
– Proíbe a venda de softwares, plugins e quaisquer outras tecnologias que permitam disparos massivos nos serviços de mensageria e obriga os provedores a criarem soluções para identificar e impedir a utilização de mecanismos externos de distribuição massiva.

Provas em investigação criminal
– Prevê que a autoridade judicial possa determinar aos provedores de serviço de mensageria instantânea a preservação e disponibilização dos registros de interações de usuários determinados por até 15 dias, renováveis até o máximo de 60 dias, vedados os pedidos genéricos ou fora dos limites técnicos do serviço.
– Prevê que a autoridade policial ou o Ministério Público poderão requerer cautelarmente aos provedores de serviço de mensageria a preservação dos dados.

Moderação de conteúdo
– Inclui uma série de regras para a moderação de conteúdo pelos provedores, instituindo direitos e salvaguardas para os usuários.
– No caso de exclusão, indisponibilização, redução de alcance e sinalização de conteúdos ou contas, os provedores deverão notificar o usuário sobre a natureza da medida aplicada, a sua fundamentação, quais os procedimentos e prazos para o direito de revisão da decisão.
– Prevê que as plataformas disponibilizem canal próprio, destacado e de fácil acesso para consulta permanente das informações prestadas, para formulação de denúncias sobre conteúdos e contas e para o envio de pedido de revisão de decisões.
– Caso haja um dano individual ou difuso a direito fundamental, a autoridade judicial poderá determinar aos provedores uma reparação, que consistirá no envio de informações a todos os impactados pelo conteúdo problemático, com o mesmo alcance do conteúdo inadequado.

Contas inautênticas e robôs
– Retira a vedação ao funcionamento de contas inautênticas.
– Mantém a proibição do funcionamento de contas automatizadas (geridas por robôs) não identificadas como tal ao usuário ou à plataforma.
– Prevê a identificação dos conteúdos referentes às contas automatizadas, de todos os conteúdos impulsionados e publicitários.
– Exclui artigo que possibilitava às empresas requererem dos responsáveis pelas contas documento de identidade, em caso de denúncias de desrespeito à lei, de uso de robôs ou contas falsas.
– Exclui artigo que obrigava os serviços de mensagens que ofertassem serviços vinculados exclusivamente a números de celulares a suspender as contas de usuários que tiveram os contratos rescindidos pelas operadoras de telefonia ou pelos usuários do serviço.

Novo crime
– Cria o crime de promover, constituir, financiar ou integrar ação coordenada, mediante uso de contas automatizadas (robôs) e outros meios ou expedientes não fornecidos diretamente pelo provedor de aplicação de internet, para disparo em massa de mensagens que veiculem conteúdo passível de sanção criminal ou fatos comprovadamente inverídicos capazes de colocar em risco a vida, a integridade física e mental, a segurança das pessoas, e a higidez do processo eleitoral. A pena proposta foi de reclusão de 1 a 5 anos e multa.

Novas sanções
– Para o caso de desobediência das regras previstas na lei, o relator incluiu as penas de suspensão temporária das atividades e a de proibição de exercício das atividades, além das multas já previstas no texto do Senado.
– Direciona o valor das multas ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, e não ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), como previsto no projeto do Senado.

Atribuições do CGI.br
– Atribuiu ao já existente Comitê Gestor da Internet (CGI.br) as funções do Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, criado pelo texto do Senado.
– Prevê que o CGI.br estabeleça diretrizes para a elaboração do Código de Conduta dos provedores, certifique esse código e elabore relatório anual de atividades e encaminhe ao Congresso Nacional.
– Determina que o CGI.br institua uma câmara multissetorial para atender exclusivamente aos objetivos da lei, composta por 17 membros do poder público, sociedade, civil, academia, setor empresarial e organizações de verificadores de fatos, com mandato de 2 anos.

Autorregulação
– Determina que os provedores criem uma instituição de autorregulação voltada à transparência e à responsabilidade no uso da internet, que terá, por exemplo, a missão de revisar decisões sobre moderação de conteúdos e contas, por meio de provocação daqueles afetados diretamente pelas decisões.
– Caberá ainda à instituição de autorregulação a divulgação, em seu sítio na internet, do Código de Conduta, que será vinculante para seus associados.
– Mantém a obrigação de os provedores produzirem relatórios trimestrais de transparência e disponibilizá-los em seus sítios eletrônicos, mas inclui a previsão de que esses relatórios possam ter sua periodicidade aumentada em razão do interesse público.
– Pormenoriza os elementos que deverão constar dos relatórios trimestrais, como o número total de medidas aplicadas, segmentado por regra aplicada, e número total de medidas aplicadas sobre as contas de agentes políticos.

Atuação do Poder público
– Mantém a previsão de que as contas em redes sociais do presidente da República, governadores, prefeitos, ministros de Estado, parlamentares, entre outros agentes públicos, não poderão restringir o acesso de outras contas às suas publicações.
– Prevê que essas contas tenham as mesmas obrigações de transparência às quais as comunicações oficiais estão submetidas.
– Veda a destinação de recursos públicos para publicidade em sítios eletrônicos e contas em redes sociais que promovam discursos violentos destinados ao cometimento de crimes contra o Estado democrático de direito.
– Prevê que as contas de pessoa jurídica do poder público deverão disponibilizar mecanismo para que qualquer usuário possa reportar desinformação.

Fomento à educação
– Insere um novo capítulo no texto para abordar o tema do fomento à educação, prevendo que a União, os estados e os municípios deverão promover a educação midiática.

Regras eleitorais
– Altera a Lei das Eleições, para incluir entre os gastos eleitorais as despesas relacionadas à contratação de serviço de tratamento de dados.
– Obriga os partidos políticos, as coligações e os candidatos, durante as campanhas eleitorais, a divulgarem o registro das suas atividades de tratamento de dados em sítio na internet criado pela Justiça Eleitoral para esse fim.

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