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Prisão automática após condenação do júri é inconstitucional, dizem criminalistas

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31 de março de 2021, 19h16

O Conselho Federal da OAB e a Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim) entraram com ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para contestar um trecho do Código de Processo Penal, introduzido pela lei "anticrime", que prevê a prisão automática do réu condenado a 15 anos ou mais pelo Tribunal do Júri.

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Advogados criminalistas defendem a iniciativa da ordem e destacam que a execução imediata das penas nestes casos é inconstitucional. "Isso porque se mostra incompatível com a máxima constitucional da presunção de inocência", aponta o advogado Claudio Bidino, sócio do escritório Bidino & Tórtima Advogados e mestre em Criminologia e Justiça Criminal pela Universidade de Oxford.

Bidino acredita que esse vício de inconstitucionalidade não pode ser afastado pelo princípio da soberania dos vereditos do júri: "Tal princípio não guarda qualquer relação com o estado de inocência que é assegurado pela Constituição Federal indistintamente a todos os cidadãos, acusados ou não perante o Tribunal do Júri, até o eventual trânsito em julgado de sentença condenatória".

O argumento da soberania do júri também não convence Marcelo Marcochi, advogado criminalista e coordenador da área penal do escritório Adib Abdouni Advogados. "Em que pese tratar-se de princípio constitucional, a presunção de inocência também o é, de sorte que a prisão antes do trânsito em julgado somente pode ocorrer nos casos legais, excepcionados pela própria Carta; dentre eles, importante revelar, não está a prisão decorrente de condenação pelo júri", ressalta. Segundo ele, esse conflito de princípios homogêneos deve ser resolvido em favor do acusado.

Conrado Gontijo, criminalista e doutor em Direito Penal e Econômico pela USP, afirma que a Constituição Federal é clara ao estabelecer que qualquer sanção penal só pode ser executada após o trânsito em julgado da condenação. "Essa regra vale para todos os casos penais, independentemente da natureza dos crimes praticados ou do órgão responsável por seu julgamento", comenta.

Paula Sion, criminalista e sócia do escritório Cavalcanti, Sion e Salles Advogados, diz que a previsão "viola a presunção de inocência, uma vez que cabe recurso contra a decisão do júri, nas hipóteses previstas no artigo 593 do Código de Processo Penal".

"Ademais, se não é possível cumprir pena antes do trânsito em julgado nos crimes decididos por juízes togados, com menos razão caberia nos crimes decididos por um conselho de sentença formado por pessoas leigas, em que com muito mais frequência vemos decisões manifestamente contrárias à prova dos autos e nulidades de várias ordens", completa Sion.

Na visão do advogado constitucionalista e criminalista Adib Abdouni,  a inconstitucionalidade do dispositivo é de "tamanha eloquência que arrisca-se dizer que a ADI proposta pela OAB resultará em seu provimento à unanimidade, a homenagear a segurança jurídica do precedente decidido pelo colegiado".

Ele considera que a norma é uma tentativa de burlar a sistematização constitucional e eliminar a presunção da inocência, "em grave violação ao exercício do postulado constitucional da ampla defesa".

O questionamento do trecho no STF é visto como um acerto por Lucie Antabi, advogada criminalista no escritório Damiani Sociedade de Advogados. "O princípio constitucional da presunção de inocência é uma garantia individual que alberga o suposto autor de um ilícito penal", pontua.

 Ela lembra que o próprio Supremo já adotou o posicionamento de que o cumprimento antecipado de pena viola este preceito fundamental, "porque antecipar a pena do indivíduo sem esgotamento dos recursos cabíveis seria uma forma de presumi-lo como culpado, uma afronta aos princípios basilares da Constituição".

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