Atualmente, não vigora nenhum regime de exceção no Brasil, de modo que o direito ao trabalho, ao uso da propriedade privada e à livre circulação jamais poderiam ser restringidos, sem que isso configurasse patente violação às normas constitucionais.

O entendimento é do juiz Giovani Augusto Serra Azul Guimarães, do plantão judiciário de Ribeirão Preto (SP), ao determinar a soltura de um comerciante que havia sido preso em flagrante por desrespeitar medidas sanitárias de combate ao coronavírus.
O comerciante foi preso por manter sua loja aberta durante a fase emergencial do Plano São Paulo, que permite apenas o funcionamento de serviços essenciais. Ele também foi acusado de incitar outros comerciantes a também desrespeitar as normas estaduais de combate à pandemia. O Ministério Público pediu a conversão da prisão em flagrante em preventiva.
No entanto, para o juiz, a prisão do comerciante foi "manifestamente ilegal" e deveria ser relaxada, nos termos do artigo 5º, inciso LXV, da Constituição, e do artigo 310, inciso I, do Código de Processo Penal. Segundo ele, as únicas hipóteses em que se podem restringir alguns dos direitos e garantias fundamentais são durante o Estado de Defesa e o Estado de Sítio, que não estão em vigência no Brasil.
Guimarães considerou a situação "ainda mais grave" uma vez que a proibição de abertura de estabelecimentos comerciais se deu por decreto do Governo do Estado. "O decreto governamental é instrumento destinado exclusivamente a conferir fiel cumprimento à lei; presta-se unicamente a regulamentá-la. Não lhe é permitido criar obrigações não previstas em lei (o chamado 'decreto autônomo')", completou.
Dessa forma, o magistrado concluiu que o decreto que fundamentou a prisão do comerciante "é manifestamente inconstitucional" e "nulo de pleno direito". Ele citou julgamento do Supremo Tribunal Federal e disse que medidas de combate à Covid-19 devem ser devidamente justificadas, obedecer aos critérios da Organização Mundial da Saúde e gozar de respaldo científico.
"Estudos científicos, nacionais e estrangeiros têm demonstrando a ineficácia de medidas como as estabelecidas nos decretos governamentais em questão, ou do chamado lockdown, na contenção da pandemia. E a Organização Mundial da Saúde já apelou aos governantes para que deixem de usar o lockdown, medida que 'tem apenas uma consequência que você nunca deve menosprezar: torna os pobres muito mais pobres'", disse.
Para o juiz, não há respaldo algum no decreto usado para prender o comerciante "diante da Constituição da República, da decisão do Supremo Tribunal Federal pertinente ao tema, das orientações da Organização Mundial da Saúde e da ciência". Assim, ele concluiu pela ilegalidade da prisão e determinou a expedição do alvará de soltura.
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Processo 1500681-23.2021.8.26.0530
Comentários de leitores
12 comentários
Há juízes no Brasil
NACM (Advogado Sócio de Escritório - Civil)
Uma Sentença dessa envergadura nos leva a acreditar que é possível dar um novo rumo a nossa Justiça. Carecemos da isenção e uso da técnica na apreciação das demandas. Esse Juiz, ao proferir a Sentença, deu uma aula de Direito.
Ainda há juízes no Brasil
NACM (Advogado Sócio de Escritório - Civil)
Quando começo a me curvar diante das decepções que a justiça nos impõem, eis que surge uma prolação de SENTENÇA dessa envergadura. Vejo que, apesar de tudo, ainda há juízes no nosso país e ainda há que ter esperanças.
Decisão acertada!
Palpiteiro da web (Investigador)
É de juízes concursados, com conhecimento jurídico como esse da comarca de Ribeirão Preto que gostaria de ver nos Tribunais afora e, não, os embustes que ocupam o STF.
Espero que os embustes do STF leiam e adotem o entendimento da decisão proferida pelo Eminente Juiz de Ribeirão Preto, por ser correta, técnica, ponderada e justa!
Comentários encerrados em 26/03/2021.
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