Origem dos recursos

2ª Turma do STF manda ação contra deputado do RJ para Justiça Eleitoral

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16 de março de 2021, 18h43

Como não ficou provado que os supostos valores de propina recebidos pelo deputado estadual André Corrêa (DEM) tinham origem federal e há indícios de que foram usados na campanha eleitoral de 2012, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, por maioria, declarou, nesta terça-feira (16/3), a incompetência da Justiça Federal para julgar o processo e ordenou sua remessa à Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro.

Nelson Jr./SCO/STF
De acordo com Gilmar Mendes, não ficou provada a origem federal dos recursos
Nelson Jr./STF

O Ministério Público Federal acusa Corrêa de receber propina do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) para viabilizar seus interesses na Assembleia Legislativa do estado. De acordo com o MPF, os pagamentos de R$ 100 mil ocorreram de 2011 a março de 2014, quando Luiz Fernando Pezão (MDB) assumiu o governo. Para os procuradores, os recursos eram desviados de verbas estaduais e federais, como as repassadas a empreiteiras para obras como o Arco Metropolitano e o PAC das Favelas.

Em maio de 2019, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES) recebeu a denúncia contra o parlamentar por corrupção passiva e organização criminosa, negando a alegação de incompetência da Justiça Federal. A decisão foi mantida pelo Superior Tribunal de Justiça e pela ministra do STF Cármen Lúcia. Ela negou Habeas Corpus da defesa com o argumento de que a decisão do TRF-2 evidenciou a existência de recursos federais nos pagamentos e não enxergou crimes eleitorais nos fatos.

Os advogados de André Corrêa recorreram da decisão de Cármen. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. Ao apresentar seu voto-vista na sessão desta terça, o ministro afirmou que não ficou provado que os supostos recursos recebidos pelo deputado tiveram origem federal.

“O suposto ‘caixa único’ aparentemente abastecia diversas atividades e braços da organização criminosa de Cabral, que estão ligados a diferentes e complexas operações realizadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público, de modo que não se pode simplesmente presumir a origem federal da propina que chegava ao agravante [Corrêa]”, disse o ministro.

Como não ficou demonstrado que os valores tinham origem federal nem que o deputado praticou crimes federais, ressaltou o magistrado, a acusação trata de delito que ofende o estado do Rio de Janeiro. Portanto, a ação penal deve ser julgada pela Justiça fluminense, em respeito às regras de competência, declarou Gilmar.

Ele lembrou que o procurador de Justiça Cláudio Lopes, igualmente acusado pelo delator Carlos Miranda de receber valores do “caixa único” de Sérgio Cabral para beneficiar o governo do Rio, será julgado pela Justiça estadual, e não pela federal.

Como o MPF sustentou que existem "razoáveis indícios" de que os pagamentos foram feitos para a campanha eleitoral de 2012, Gilmar Mendes votou para enviar o processo para a Justiça Eleitoral do Rio.

O voto de Gilmar foi seguido pelos ministros Nunes Marques e Ricardo Lewandowski. Os dois avaliaram que os indícios de pagamentos para eleições atraem a competência da Justiça especializada.

Ficaram vencidos os ministros Cármen Lúcia e Edson Fachin. Ao seguir o voto da relatora, Fachin apontou que a denúncia não destaca o vínculo dos recursos com financiamento de campanha ou compra de votos.

Para Pierpaolo Cruz Bottini, um dos advogados da causa, “mais uma vez o STF corrige os exageros nos critérios de atração de competência da Justiça Federal. A lei fixa regras claras sobre competência que não podem ser. É preciso segurança jurídica, respeito às normas em vigor.”

Fixação artificial
Gilmar Mendes também criticou a atração automática de processos a uma certa vara sem a devida individualização das condutas – como ocorre na operação "lava jato".

"Ora, se as investigações da força-tarefa continuam e novos fatos surgem, haverá sempre uma ligação mecânica do tipo conditio sine qua non com os primeiros fatos. Esse critério nos leva, entretanto, à indevida conclusão de que todos os acontecimentos apurados pela força-tarefa seriam, ad eternum, atraídos na origem para a 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, independentemente da competência natural para processar e julgar os fatos."

Nesse sentido, o ministro citou a Reclamação 36.542, na qual o STF decidiu que a atração de competência da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba na "lava jato" não prescinde da demonstração de vínculo objetivo entre os fatos investigados no caso e aqueles relativos a fraudes e desvios de recursos na Petrobras.

Gilmar ainda mencionou que, no Inquérito 4.130, o Supremo concluiu que o fato de a Polícia Federal ou o Ministério Público Federal denominarem determinadas apurações como fases da operação "lava jato", a partir de uma sequência de investigações sobre crimes diversos, não se sobrepõe às normas disciplinadoras de competência.

Clique aqui para ler o voto de Gilmar Mendes
RHC 188.233

*Texto alterado às 22h51 do dia 16/3/2021 para correção de informações.

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