PEC emergencial

PT e Rede vão ao STF contra 'jabutis' na 1ª emenda constitucional de Bolsonaro

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16 de março de 2021, 17h06

Rodolfo Stuckert/Agência Câmara
Além de viabilizar nova rodada de auxílio emergencial, PEC permite ao governo usar o superavit de fundos públicos para amortizar a dívida pública
Rodolfo Stuckert/Agência Câmara

O Congresso promulgou nesta segunda-feira (15/3) a Emenda Constitucional 109 que irá permitir ao governo federal pagar um novo auxílio emergencial aos mais vulneráveis durante a epidemia de Covid-19 no país.

O texto também permite que o valor total gasto com auxílio poderá ser maior, mas o valor acima do teto de gastos ficará limitado a R$ 44 bilhões. É a primeira emenda constitucional do governo do presidente Jair Bolsonaro.

Para compensar o aumento do gasto social, o texto prevê uma série de gatilhos fiscais. A PEC 109 estabelece que sempre que a relação entre despesas obrigatórias e receitas da União chegar a 95%, uma série de restrições devem ser adotadas para controlar despesas com o funcionalismo público. Entre as medidas propostas estão a proibição de reajustar salários e promover concursos públicos.

A PEC também autoriza estados e municípios a se utilizarem dos mesmos gatilhos fiscais a disposição da União e determina que, em caso de não adoção de restrições, fiquem impedidos de renegociar dívidas ou obter empréstimos avalizados pelo governo federal.

O PT e a Rede ingressaram com uma ação direta de inconstitucionalidade nesta terça-feira (16/3) que questiona a Emenda Constitucional 109 por violação literal ao artigo 60, §2º da Constituição, a partir da nova interpretação atribuída pelo Congresso ao dispositivo aprovado pelo Senado e pela Câmara dos Deputados.

As legendas sustentam que o §2º do artigo 60 do texto constitucional prevê a obrigatoriedade de a proposta de emenda à constituição ser "discutida e votada em cada casa do Congresso, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, 3/5 dos votos dos respectivos membros". A norma teria sido violada na tramitação da PEC 109.

O artigo 5º da PEC 109 dispõe sobre os fundos públicos e autoriza que até o final do segundo exercício financeiro após a promulgação o governo possa usar o superavit financeiro desses recursos para amortizar a dívida pública.

O líder da minoria do Senado, Jean Prates (PT-RN), afirmou que o uso dos fundos pelo governo não foi discutido. "A utilização desses fundos jamais foi deliberada pelo Senado. Eles foram levados de roldão na Câmara. Em nenhum momento, aceitamos incluir esses fundos nas desvinculações. Estamos apresentando uma PEC para corrigir essa distorção. Não concordamos que o governo retire recursos desses fundos estratégicos para o país", sustentou.

A Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp) divulgou uma nota de repúdio a PEC 109. No texto, a entidade ataca o dispositivo da PEC Emergencial que impõe "mais um calote aos credores de precatório".

A entidade alega que a pretexto de permitir uma nova rodada de auxílio emergencial, a PEC acabou concedendo ao Poder Público uma nova moratória para pagamento de dívidas judiciais estendendo a data limite do pagamento de precatórios até 31 de dezembro de 2029.

Leia abaixo a nota:

A Associação dos Advogados de São Paulo registra seu contundente repúdio à surpreendente e inacreditável inclusão — e aprovação — de dispositivo que impõe mais um calote aos credores de precatórios na chamada "PEC Emergencial" (EC 109/2021; PEC 186/2019) aprovada e promulgada pelo Congresso Nacional, em 15 de março de 2021, em flagrante afronta ao Poder Judiciário e à garantia do cumprimento das decisões judiciais proferidas contra o Poder Público.
Lamentavelmente, mesmo diante do trágico cenário que assola o país e o mundo, ficou evidente o império do desrespeito diante da desoladora utilização, uma vez mais, do estratagema chamado de "contrabando legislativo" – os "jabutis" — , aproveitando-se que as atenções estavam naturalmente voltadas para outro foco, evitando-se os tão necessários debates a respeito de tema para assim atender interesses dos governantes que, embora latentes, vinham sendo contidos.
A aprovação da PEC, que tinha por objetivo primordial tratar da concessão do auxílio emergencial com o propósito de auxiliar no enfrentamento das consequências sociais e econômicas da pandemia da Covid-19, acabou por também conceder uma nova moratória ao Poder Público (estados, Distrito Federal e municípios), prorrogando o prazo para a quitação de dívidas judiciais que há muito possuem por mais cinco anos, estendendo a data-limite para pagamento dos precatórios para 31 de dezembro de 2.029 (foi alterado ao artigo 101 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). Além disso, eliminou importante mecanismo de solução do problema ao revogar o respectivo § 4º, afastando a possibilidade de financiamento dos entes federados pela União Federal por meio de linha de crédito especialmente destinada ao pagamento dos precatórios submetidos ao regime especial.
Como se vê, a escalada do enfrentamento e do desrespeito às decisões judiciais tem se mostrado cada vez mais intensa e reiterada: a EC 62/2009 previa prazo de pagamento dos precatórios em aberto em até quinze anos (até 2.024) e foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (ADIs 4357 e 4425), cuja modulação de efeitos fixara novo prazo para quitação das dívidas, de cinco anos, até 31 de dezembro de 2.020. Nesse sentido, inclusive, estabeleceu a EC 94/2016, justamente no artigo 101, do ADCT. Todavia, logo no ano seguinte a EC 99/2017 novamente alterou o dispositivo, postergando o prazo de quitação para 2.024, restaurando assim aqueles 15 anos da EC 62 (embora declarados inconstitucionais pelo STF). A infâmia agora é renovada e agravada pela EC 109/2021, com nova concessão de adiamento da quitação por mais cinco anos, sem o mínimo debate e aproveitando-se de PEC que veiculara outro assunto da mais profunda gravidade.
Reafirmando, portanto, seu compromisso com a administração da Justiça, com a devida prestação jurisdicional e com o efetivo cumprimento das decisões judiciais, a Associação dos Advogados de São Paulo repudia veementemente a absolutamente inesperada e desprovida de pertinência temática aprovação de mais um calote nos precatórios, conclamando as demais entidades a também adotarem as medidas adequadas para a devida defesa do próprio Poder Judiciário e da segurança jurídica.

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