Opinião

Impactos sobre os créditos trabalhistas da reforma da Lei de Recuperação Judicial

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12 de março de 2021, 6h34

Nem bem se iniciou o calendário de 2021 e já entrou em vigor, no dia 23 de janeiro, a Lei nº 14.112, de 24/12/2020, a chamada reforma da Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência, que alterou profundamente a Lei nº 11.101/2005, gerando debates entre os operadores do Direito diante das modificações e inovações apresentadas.

Um dos pontos principais que se verificam na nova lei é que esta privilegia a mediação e conciliação (Seção II-A, artigos 20-A e 20-B), inclusive a possibilidade de suspensão das execuções para incentivar a negociação (Seção II-A, artigo 20-B, §1º), o que evidencia sua finalidade de prestigiar a recuperação econômica das empresas, bem como a preservação de sua função social.

Entre as modificações trazidas pela Lei nº 14.112/2020, que impactam diretamente sobre os créditos de natureza trabalhista, serão tratadas as seguintes nesta oportunidade: 1) prazo de 180 dias, prorrogável por mais 180 e prazo complementar de outros 180, para suspensão das execuções; 2) ampliação dos prazos para pagamento de créditos trabalhistas e acidentários por até dois anos; 3) limitação dos poderes do juiz do Trabalho para declaração da desconsideração da personalidade jurídica das empresas falidas; 4) proibição de qualquer penhora judicial, inclusive do depósito recursal já dado como garantia; e 5) manutenção da ordem preferencial do crédito trabalhista e oriundo de acidente de trabalho em caso de cessão.

A primeira grande alteração, prevista no artigo 6º, §4º, da lei, tão somente consolidou o que já era praticado pelo Judiciário e pacificado pela jurisprudência do TST ao permitir a dilação do prazo de suspensão do curso das execuções trabalhistas.

Assim, o prazo inicial de 180 dias de suspensão da execução trabalhista pode sofrer dilação por igual prazo e, ainda, é possível a concessão de prazo suplementar por mais 180 dias nos casos de apresentação de plano alternativo de recuperação judicial, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal, totalizando 540 dias de suspensão do curso da ação.

Nesse ponto, fazem-se dois adendos: a lei somente determina a suspensão da execução do crédito trabalhista principal, possibilitando o seguimento da execução das contribuições fiscais, verbas meramente acessórias e, por serem prazos muito extensos, seu cômputo é feito em dias corridos, diferentemente da contagem dos prazos em dias úteis, como é a prática na Justiça Comum e na Justiça do Trabalho.

Com relação ao prazo para pagamento de crédito trabalhista nas recuperações judiciais, que até então era de 12 meses, o legislador manteve inicialmente esse prazo no caput do artigo 54, porém acrescentou em seu §2º a possibilidade de pagamento pelo devedor em até dois anos, desde que sejam cumulativamente preenchidos os seguintes requisitos: apresentação de garantias suficientes para satisfação do crédito, aprovação pela assembleia geral e pagamento integral sem a concessão de qualquer desconto dos créditos trabalhistas e acidentários.

Além dessas duas alterações referente a prazos, a reforma limitou ao juízo falimentar a competência para a decretação da desconsideração da personalidade jurídica da sociedade falida nos casos de abuso por desvio de finalidade ou confusão patrimonial, para fins de responsabilização de terceiros, ou seja, os juízes do Trabalho não poderão mais julgar esse incidente.

Outra alteração que impacta no andamento da execução trabalhista foi a proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência, considerando-se, inclusive, o depósito recursal efetuado em reclamações trabalhistas.

Até antes da alteração da lei, o juízo trabalhista poderia liberar ao exequente o depósito recursal feito pela executada em recuperação judicial ou em falência como parte do pagamento do reconhecido crédito trabalhista, o que ficou expressamente proibido pela reforma.

Mais uma alteração muito importante diz respeito à manutenção da natureza do crédito, mesmo que esse seja cedido a terceiros.

Antes da Lei nº 14.112/2020, o crédito trabalhista, ao ser cedido, perdia o primeiro lugar na ordem de preferência e passavam a ser tratado como crédito sem classificação (quirografários).

Agora, mesmo havendo a cessão, os créditos trabalhistas manterão a posição em primeiro lugar na fila de preferência, o que, no entendimento de alguns operadores do Direito, poderá fomentar o mercado de cessão de créditos e possibilitar satisfação de forma mais célere do credor trabalhista.

Importante frisar que a Nova Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência foi sancionada com seis vetos pelo presidente da República, entre os quais a suspensão da execução trabalhista contra responsável subsidiário ou solidário, até a homologação do plano de recuperação ou a convolação da recuperação judicial em falência (§10º do artigo 6º), o que não poderá mais ser revertido pelo Congresso Nacional pelo decurso do prazo de 30 dias para apreciação dos vetos, que teve início em 1º/2/2021 e termo final em 2/3/2021.

Feitas tais ponderações, o que se espera com as alterações propostas pela Lei nº 14.112/2020 é a efetiva recuperação financeira da sociedade empresarial, sobretudo em tempos em que um grande número de empresas poderá decretar recuperação judicial em razão da pandemia gerada pelo coronavírus, possibilitando a continuidade do exercício de sua atividade e a manutenção de milhares de empregos.

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