Opinião

Os direitos das mulheres e a importância do compliance de igualdade de gênero

Autor

  • Laura Santiago

    é advogada graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande (Furg) especialista em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp e mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional pela Universidade Anhanguera-Uniderp.

11 de março de 2021, 12h07

Quando se fala em "direitos das mulheres", "mulheres no mercado de trabalho", "igualdade de gênero", muitas pessoas analisam tais pautas como já ultrapassadas, afinal as mulheres ocupam grande parte da força de trabalho no país (mais precisamente, 53,3%, de acordo com dados do IBGE no ano de 2019). Então, muito se indaga o porquê de as conquistas femininas ainda serem uma temática em debate em nossa sociedade.

Pois bem, para se compreender a importância do assunto, necessária uma breve retrospectiva histórica dos direitos das mulheres no Brasil, que começam em 1827, a partir da Lei Geral — promulgada em 15 de outubro —, quando as mulheres foram autorizadas a ingressar nos colégios e a estudar além da escola primária. Após, em 1879, as mulheres brasileiras obtiveram o direito de ingresso ao ensino superior.

Já no século 20, em 1932, conquistaram o direito ao voto; em 1962 foi criado o Estatuto da Mulher Casada (Lei nº 4.212), que permitiu que mulheres casadas não precisassem mais da autorização do marido para trabalhar; em 1974 foi aprovada a Lei de Igualdade de Oportunidade de Crédito, para que clientes não fossem mais discriminadas baseadas puramente no gênero, possibilitando que mulheres pudessem adquirir cartão de crédito sem a necessidade de um homem para assinar o contrato; a partir de 1977, com a publicação da Lei nº 6.515, o divórcio se tornou uma opção legal no Brasil.

Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, a igualdade de gênero foi expressamente prevista pela legislação brasileira (artigo 5º, inciso I); em 2002, foi extinto do Código Civil brasileiro o artigo que permitia que um homem solicitasse a anulação do seu casamento caso descobrisse que a esposa não era virgem antes do matrimônio.

Se o leitor se atentou, somente há quase seis décadas é que as mulheres puderam ter o direito de escolha ao trabalho, no Brasil, sem precisar da permissão do marido para tanto, consolidando-se, de vez, nas estatísticas de emprego. Antes disso, o direito de exercer uma profissão não era uma alternativa que cabia às mulheres optar.

Portanto, necessário e atual o debate sobre os direitos das mulheres, cabendo registrar que ainda existe um extenso caminho para que a igualdade de gênero, direito constitucionalmente assegurado, seja realidade.

Nesse aspecto, para além das políticas públicas estatais, o setor privado, percebendo a necessidade cada vez maior de inclusão e diversidade no meio corporativo, começou a buscar a efetiva equidade de gênero.

A fim de amparar e guiar as empresas nesse caminho, em 2020, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) criou a Agenda Positiva de Governança, a qual tem como um de seus seis pilares a "diversidade e inclusão" (D&I). Assim, como uma das ramificações da diversidade e inclusão está a igualdade de gênero, que deve ser vista como uma representação relevante para o crescimento das empresas.

Para tanto, recentemente, em janeiro de 2021, o IBGC enviou carta ao mercado em que convida os conselhos de administração das empresas a aproveitarem a renovação dos membros dos boards para aumentarem a diversidade entre os integrantes, ressaltando, no documento, que, de acordo com o estudo "Board Index 2020", da Spencer Stuart, apenas 11,5% das posições em conselhos das empresas abertas brasileiras são ocupadas por mulheres 9,3% se consideradas apenas as titulares.

Diante desse cenário de desafios para a igualdade de gênero, a LEC (Legal, Ethics & Compliance), atualmente a maior comunidade dedicada à difusão de cultura de compliance do mundo, também incluiu a "diversidade e inclusão" em um dos seus dez pilares do compliance.

Vale lembrar que o termo compliance vem do verbo inglês to comply, que significa, de modo geral, "estar de acordo com alguma regra". Nesse sentido, compliance tem relação com a conduta, em conformidade com leis e regulamentos, com que as empresas devem agir, adequando-se a normas de controles internos e externos.

Mas não somente as empresas, como todas as pessoas que nelas trabalham e seus fornecedores, devem se alinhar ao conceito de compliance a fim de gerar valor ao negócio e à sociedade. Daí a magnitude de as empresas estarem em compliance com a igualdade de gênero, estudando e empregando medidas para que todos tenham as mesmas oportunidades de visibilidade e crescimento.

Diante disso, cabe às empresas buscarem maior reflexão em seus ambientes de governança, a despeito da desigual distribuição de cargos, em relação ao gênero, ainda presente em nossa sociedade, e concretizar medidas mitigadoras para reverter tal quadro.

Exemplo disso é a criação de comitês e canais internos, importantes ferramentas nos ambientes corporativos, para o desenvolvimento e a implementação de ideias, conceitos, direitos e condutas. Quanto mais as empresas se voltarem à equidade e à inclusão, proporcionando ambientes integrativos e plurais, mais estará gerando resultados dos quais todos serão ganhadores.

Isso porque a política de inclusão e diversidade garante que todas as pessoas se sintam acolhidas, reconhecidas pelas suas qualidades bem como desempenho, além de assegurar à empresa maior inovação e retenção de talentos. Segundo uma pesquisa da Harvard Business Review, empresas que trabalham com programas de diversidade têm 45% de chances a mais de aumentar a participação de mercado.

Portanto, a melhora organizacional de uma empresa resulta em maior produtividade e, consequentemente, reconhecimento no mercado. Assim, um compliance voltado à diversidade e inclusão, com projetos para a equidade de gênero, direcionará empresas a refletirem e ajustarem, quando preciso, a própria estrutura organizacional e, com isso, a forma como as pessoas devem agir em um ambiente ético, justo e igualitário.

Até aqui, passaram-se quase 60 anos desde que as mulheres puderam ter o direito de escolha a um emprego. Desde então, continuam a conquistar, cada vez mais, seu espaço no mercado de trabalho, demonstrando competência, resiliência e determinação.

Entretanto, para que as mulheres possam continuar o caminho de ascensão profissional, a igualdade de oportunidades deve ser uma realidade. Como visto, para que na chegada final desse caminho em construção haja a equidade almejada, não basta o mapa com a direção correta, mas todo um conjunto que vai de pessoas a ferramentas capazes e aptas a concretizar tal objetivo.

Autores

  • Brave

    é advogada no escritório Ernesto Borges Advogados, integrante da equipe de Gerência da Curadoria Jurídica e participante do Comitê Acadêmico.

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