Análise de urgência

Relator pode suspender direito de resposta, decide Plenário do Supremo

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11 de março de 2021, 19h28

O Poder Judiciário é estruturado de forma hierárquica, tendo o Supremo Tribunal Federal no topo e, em seguida, tribunais superiores, tribunais regionais e estaduais e juízes locais. E essa gradação hierárquica tem por pressuposto a ampliação dos poderes dos magistrados à medida que se afastam da base da estrutura em direção a seu topo.

Rosinei Coutinho/SCO/STF
Toffoli alterou voto para suprimir expressão do artigo 10 da Lei do Direito de Resposta
Rosinei Coutinho/STF

Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, conferiu interpretação conforme à Constituição ao artigo 10 da Lei do Direito de Resposta (Lei 13.188/2015) para excluir a expressão "em juízo colegiado prévio" do dispositivo. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio.

O artigo 10 tem a seguinte redação: "Das decisões proferidas nos processos submetidos ao rito especial estabelecido nesta Lei, poderá ser concedido efeito suspensivo pelo tribunal competente, desde que constatadas, em juízo colegiado prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na concessão da medida".

Com a decisão do STF, o relator poderá decidir monocraticamente sobre a concessão de efeito suspensivo a recurso contra decisão que concedeu direito de resposta.

Na sessão desta quarta (10/3), o relator do caso, ministro Dias Toffoli, votou para dar interpretação conforme a Constituição ao artigo 10 para permitir que o relator também pudesse conceder efeito suspensivo a recurso contra direito de resposta.

O ministro apontou que, de acordo com a estrutura hierárquica do Judiciário, estabelecida no artigo 92 da Constituição, quanto mais alto um juiz está nessa escala, mais poderes ele tem de revisar decisões de outros órgãos judiciais. E isso inclui a avaliação sobre o efeito a ser aplicado a um recurso.

"Se, como regra, é dado ao relator até mesmo julgar monocraticamente o recurso interposto, com muito mais propriedade poderá esse magistrado definir o efeito em que deve ser recebido o recurso, que é etapa antecedente àquela. Admitir que um juiz integrante de tribunal não possa ao menos conceder efeito suspensivo a recurso dirigido contra decisão de juiz de primeiro grau é subverter a lógica hierárquica estabelecida pela Constituição, pois é o mesmo que atribuir ao juízo de primeira instância mais poderes que ao magistrado de segundo grau de jurisdição", apontou Toffoli.

O ministro Nunes Marques, na sessão desta quinta, acompanhou o relator, mas avaliou que a expressão "em juízo colegiado prévio" do artigo 10 era inconstitucional. Assim, propôs a sua supressão do dispositivo. O entendimento foi seguido pelos ministros Cármen Lúcia e Gilmar Mendes.

Já o ministro Ricardo Lewandowski opinou que o artigo 10 deveria ser declarado inconstitucional em sua integridade — análise seguida pelos ministros Rosa Weber e Luiz Fux, presidente da corte.

Após os ministros votarem, Toffoli decidiu alterar o seu voto para conferir interpretação conforme à Constituição ao artigo 10 para excluir a expressão "em juízo colegiado prévio". Todos os demais ministros seguiram o relator, exceto Marco Aurélio.

Voto vencido
O decano disse que "muitos relatores vêm decidindo como tribunais" e disse que, se a decisão cabe a um órgão essencialmente colegiado, deve ser sempre proferida em conjunto. "Se é decisão é do Supremo, deve ser de todo o Supremo. Não temos diversos Supremos."

Na visão de Marco Aurélio, o dispositivo procurou fortalecer o direito de resposta. "O artigo 10 trata de recurso ante uma decisão que tenha reconhecido o direito de resposta. Considerada a envergadura desse direito constitucional, o legislador quis condicionar a retirada desse direito não a uma decisão de cabeça única, do todo-poderoso relator, mas do colegiado."

Mais cedo, o decano havia discutido com Alexandre de Moraes com relação à extensão dos poderes do relator. Alexandre, relator do caso do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), sugeriu adiar a análise a respeito da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República para dar mais tempo para a defesa se manifestar. Porém, Marco Aurélio propôs que o Plenário avaliasse se a prisão preventiva de Daniel Silveira poderia ser substituída por medidas cautelares alternativas. 

Alexandre de Moraes disse que iria avaliar monocraticamente o pedido de liberdade provisória do parlamentar, mas disse que a decisão não cabe ao Plenário, pois é prerrogativa do relator.

Marco Aurélio argumentou que o assunto passou a ser de competência do colegiado. "Aceito a carapuça em primeiro lugar e digo que devemos homenagear o relator. Mas os atos dele são submetidos ao verdadeiro Supremo, o Plenário. Lembro-me que esse ato [a decretação da prisão de Daniel Silveira] deixou de ser individual para ser colegiado. Posso propor que o tribunal afaste a prisão preventiva, ato que o próprio tribunal implementou, e substitua esse ato por cautelares diversas. A prisão já perdura por 25 dias. Não vejo mais razão para ela ser mantida."

Alexandre disse que a proposta era "um desrespeito ao relator". "Se for assim, amanhã eu trago uma lista de processos em que quero me manifestar e submeto ao Plenário." "Não estou desrespeitando o relator, ainda mais se o relator é um xerife", respondeu o decano.

O presidente do STF, Luiz Fux, então aceitou a proposta de Alexandre de Moraes e adiou o julgamento, sem submeter ao Plenário a análise da revogação da prisão preventiva do parlamentar.

Declaração de constitucionalidade
Além disso, prevaleceu, por maioria, o voto do relator para declarar a constitucionalidade dos artigos 2º, parágrafo 3º; 4º; 5º, parágrafos 1º e 2º; 6º, incisos I e II; e 7º, da Lei do Direito de Resposta. Os dispositivos regulamentam o procedimento para se obter direito de resposta.

Na visão de Toffoli, o direito de resposta é o "direito de obter a veiculação de um conteúdo em nome próprio, constituindo-se em verdadeiro direito de expressão, de veicular uma contramensagem, uma contrainformação".

O objetivo dessa garantia, a seu ver, é equilibrar a relação de forças entre um veículo de imprensa e os cidadãos, para que possam se manifestar perante a publicação de informações ofensivas ou inexatas publicadas a seu respeito.

O ministro ainda lembrou que a Constituição de 1988 atribuiu estatura de garantia fundamental ao direito de resposta. O artigo 5º, inciso V, estabelece que "o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".

O ministro Edson Fachin divergiu parcialmente do relator para declarar inconstitucionais os parágrafos 1º e 2º do artigo 5º; o artigo 6º e o artigo 7º e conferir interpretação conforme ao seu artigo 2º, parágrafo 3º, competindo “ao juiz da causa aferir se a retratação ou a retificação espontânea tornam, ou não, despiciendo provimento judicial de resposta ou a concessão de indenização.”

Conforme Fachin, "a retratação ou retificação voluntária prefere ao direito de resposta que, por sua vez, prefere à indenização. Não há, aqui, dano in re ipsa, devendo as circunstâncias serem devidamente ponderadas em cada caso concreto submetido ao escrutínio judicial, sendo a retratação voluntária um critério que deve refletir necessariamente na eventual indenização".

O ministro ainda destacou que, ainda que a retratação ou retificação espontânea não prejudiquem o direito de resposta e a ação de reparação por dano moral, é preciso "explicitar o seu necessário sopesamento como critério de decisão".

Outras ações
São três ações diretas de inconstitucionalidade contra a Lei do Direito de Resposta. Na ADI 5.415, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil questiona o artigo 10 da norma. Para a OAB, a análise de concessão de efeito suspensivo apenas por órgão colegiado "mitiga e desiguala o direito da parte recorrente". 

A Associação Brasileira de Imprensa questiona toda a Lei 13.188/2015. Na ADI 5.418, a entidade afirma que a regra tem "equívocos que atentam contra a liberdade de imprensa e de expressão, além de ofender o princípio da ampla defesa" e a relaciona com a extinta Lei de Imprensa, declarada inconstitucional pelo STF em 2009.

A Associação Nacional de Jornais entrou com a ADI 5.436, em que, além de questionar o artigo 10 também atacado pela OAB, pede que o Supremo declare inconstitucionais partes dos artigos 2º e 5º e a íntegra dos artigos 6º e 7º. Segundo a instituição, esses trechos comprometem o equilíbrio entre as partes no processo e o direito de defesa dos meios de comunicação.

Clique aqui para ler o voto de Dias Toffoli
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ADIs 5.415, 5.418 e 5.436

*Texto atualizado às 19h52 do dia 11/3/2021 para acréscimo de informações.

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