Teoria do corpo neutro

Quem bate em carro após colisão causada por terceiro veículo não precisa indenizar

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4 de março de 2021, 8h23

Em um acidente com vários veículos, o causador direto do dano não tem o dever de indenizar quando acerta um veículo impelido por ato ilícito de um terceiro, a fim de evitar um evento lesivo ainda mais grave.

Dmitry Kalinovsky
Motorista tentou desviar de veículo na contramão, foi acertado e, como um corpo neutro, rodou na pista até bater em carro
Dmitry Kalinovsky

Essa foi a conclusão alcançada pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que manteve a decisão do Tribunal de Justiça do Paraná de afastar a obrigação de indenizar no caso de um acidente envolvendo três carros, no qual um deles acertou outro após ilegalidade praticada por um terceiro veículo.

Aplicou-se ao caso a teoria do corpo neutro, que rompe o nexo de causalidade quando há um terceiro responsável pela causa jurídica do dano, eximindo o sujeito meramente causador físico do mesmo.

A decisão foi por maioria de votos. Venceu o voto divergente do ministro Raul Araújo, seguido por Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira. Ficou vencido o relator, ministro Luís Felipe Salomão. Não participou do julgamento o ministro Marco Buzzi, em licença médica.

O acidente aconteceu em 2011, na BR-116, em Santa Catarina. O condutor de um Polo se deparou com um Peugeot que estava na contramão para tentar ultrapassagem e, para evitar colisão frontal, fez manobra brusca para desviar. Os carros bateram lateralmente, o que fez o Polo rodar pela estrada e atingir um Vectra.

O dono do Vectra processou o condutor do Polo pelos danos. Para o voto divergente vencedor do ministro Raul Araújo, as instâncias ordinárias resolveram o caso em harmonia com a correta aplicação da teoria do corpo neutro. Portanto, não há o dever de indenizar do condutor do Polo, pois o dano ao Vectra foi causado por conta da ação do Peugeot.

Lucas Pricken
Para Salomão, ato de tentar desviar afasta a alegação de ausência de vontade para caracterizar a teoria do corpo neutro
Lucas Pricken

Tentou tirar o carro de lado
Para a divergência vencedora, embora o condutor do Polo tenha feito manobra brusca para evitar a colisão frontal inicial, não foi essa atitude que gerou o acidente, mas sim o choque lateral com o veículo que trafegava na contramão.

O contorno fático do acórdão recorrido informa que o Polo rodou sem controle pela estrada — portanto, como um corpo neutro — até acertar o Vectra. Ficou vencido o relator, ministro Luís Felipe Salomão. “Quando ele desvia para evitar acidente, eu penso que ele é o causador direto do dano”, defendeu.

Para ele, o Polo agiu de maneira deliberada ao desviar do carro na contramão, e foi isso que levou ao choque lateral com o Peugeot, posteriormente, ao acidente com o Vectra. “A manobra evasiva é incompatível com alegação da ausência de vontade. Caberia a prova de que ele não atuou como mero instrumento do ato ilícito de terceiro”, disse.

O voto vencido reconheceu que o acidente foi causado, em suma, pelo fato de um veículo estar irregularmente trafegando na contramão. Logo, o condutor do Polo teria dever de indenizar o dono do Vectra, ressalvado o direito de regresso – quando poderia cobrar do condutor do Peugeut os prejuízos com a condenação, em outra ação.

REsp 1.796.300

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