Reação desproporcional

Professores tornam-se alvos da CGU após criticarem Bolsonaro

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3 de março de 2021, 22h10

Alan Santos/PR
Professores chamaram Bolsonaro de presidente com "p minúsculo" em live

O professor Eraldo dos Santos Pinheiro, pró-reitor de Extensão e Cultura da Universidade de Pelotas (RS), e o ex-reitor Pedro Hallal assinaram um Termo de Ajustamento de conduta com a Controladoria Geral da União após abertura de processo disciplinar contra eles.

Os dois docentes se tornaram alvo da ação da CGU após criticarem o presidente Jair Bolsonaro durante uma live. Conforme os termos do acordo, os dois professores estão proibidos de fazer qualquer tipo de manifestação política dentro da universidade e terão que participar de um curso de ética no serviço público.

"Quando se acabam os argumentos se entra numa retórica agressiva a fim de silenciar o outro lado do diálogo. Acho que é exatamente isso que acontece", disse Pinheiro à coluna Painel, da Folha de S.Paulo.

O processo administrativo aberto pela CGU foi provocado por pedido de apuração do deputado Bibo Nunes (PSL-RS) após os dois professores criticarem a escolha da atual reitora, Isabela Fernandes Andrade. Ela ficou na segundo posição da lista tríplice apresentada ao chefe do Executivo. Os professores chamaram Bolsonaro de presidente com "p minúsculo". A CGU entendeu que, como a live foi aberta nos canais oficiais da universidade, os docentes estavam em local de trabalho.

A ConJur consultou especialistas sobre a atuação da CGU nesse caso e, o consenso, é de que a reação do órgão estatal foi, no mínimo, desproporcional. Ex-ministro-chefe da CGU e atualmente sócio de Direito Administrativo da Warde Advogados, Valdir Simão, lembra que a Lei 8.112/90 que instituiu o Estatuto do Servidor Público Federal estabelece que é vedado ao servidor público manifestações de apreço ou desapreço no ambiente de trabalho.

"É uma infração administrativa punível com uma pena bastante leve que é advertência. Não tenho conhecimento de processos administrativos disciplinares com essa fundamentação e, com certeza, não é um caso grave que demandaria envolvimento da CGU", explica.

Simão aponta que a CGU tem competência disciplinar que pode ser ativada quando há o envolvimento de uma autoridade do órgão que não condições de independência para punir o servidor ou quando o órgão não tem estrutura correcional adequada.

"O que chama atenção nesse caso é a vocação de um processo no âmbito da CGU para uma infração administrativa que não é tão grave", sustenta.

O jurista Lenio Streck, colunista da ConJur, afirma que tem enorme dificuldade em ver a CGU exercendo esse tipo de função. "Pela Constituição não se retira essa hermenêutica. Agora, o que me impressionou mais no caso foi o fato de os professores e alunos aceitarem os TACs. Seriam punidos? Demitidos? Multados? O Brasil sempre me surpreende", finaliza.

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