TJ-SP tranca ação penal por aborto após quebra de sigilo médico
27 de maio de 2021, 18h51
Provas obtidas com violação de sigilo profissional são consideradas ilícitas e contaminam todas as outras decorrentes dessa violação. Esse foi o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo ao acolher o pedido feito pela Defensoria Pública de São Paulo para trancamento de ação penal contra mulher acusa de praticar aborto.
No caso, após supostamente ter feito uso de medicamentos abortivos, a mulher deu entrada no hospital, que acionou a Polícia Militar. A autoridade policial compareceu ao estabelecimento e uma enfermeira confirmou o relatado. Posteriormente, a profissional foi ouvida na delegacia, confirmando a denúncia e o hospital entregou o prontuário médico da paciente à polícia. Foi este material que embasou a denúncia e posterior abertura de ação.
O Núcleo Especializado de Proteção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem), da Defensoria Pública paulista, impetrou Habeas Corpus perante o TJ-SP, pedindo o trancamento da ação penal, em razão da ausência de justa causa para sua propositura, dada a ilicitude dos elementos de prova existente nos autos.
"Imperioso destacar que os únicos elementos probatórios, insuficientes, por sinal, veiculados nos autos derivam de prova maculada por violação de sigilo profissional, o que — necessariamente — elimina a justa causa para a propositura da ação penal e enseja a nulidade dos atos processuais subsequentes", argumentaram as defensoras públicas Ana Rita Souza Prata e Paula Sant’Anna Machado de Souza.
Segundo elas, as únicas causas legítimas previstas tanto no regramento jurídico como no Código profissional para a revelação do que o médico ouviu de seu paciente em confidência são para evitar danos concretos e futuros a terceiros ou mediante o expresso consentimento do próprio paciente. E continuam: "Entender que o sigilo profissional não prevalece diante da persecução penal e que o médico tem o dever de noticiar a prática de crimes, mesmo contra o seu paciente, faria ruir por completo as normas constitucionais que protegem o direito à intimidade, o privilégio contra a autoincriminação e o direito à saúde".
No acórdão, proferido pela 12ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP, o relator, desembargador Amable Lopez Soto, entendeu que é necessário que médicos respeitem o sigilo das informações do paciente. Mencionou a Lei Geral de Proteção de Dados, que entrou em vigor em 2020. Nela há situações em que dados podem ser divulgados, mas em nenhuma hipótese o profissional de saúde pode compartilhar dados referentes ao estado clínico do paciente sem o seu consentimento.
Concluiu o desembargador que não havia causa que justificasse a quebra do dever de sigilo profissional. "Quebra que, por ser o cerne da investigação policial, serviu de base para a propositura da ação penal, contaminou todas as demais provas produzidas nos autos, com destaque para a prova oral e para a remessa da ficha médica da paciente à autoridade policial que a requisitou de ofício". Dessa forma, acatou o pedido de trancamento da ação feito pela Defensoria. Com informações da assessoria de comunicação da Defensoria Pública de SP.
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