Opinião

Atestado falso para furar fila da vacina pode gerar cassação de registro de médico

Autor

  • Ana Lúcia Amorim Boaventura

    é advogada especialista em Direito Médico Direito Odontológico Direito da Saúde e Direito Constitucional professora da Faculdade de Medicina da PUC-Goiás e sócia da Ferraresi Cavalcante Advogados.

27 de maio de 2021, 18h11

São muitas as notícias de busca de falsificação de atestados médicos para fazer neles constar comorbidades que não existem para furar a fila da vacinação contra a Covid-19. No caso, médico e paciente cometem crime.

Sob o ponto de vista do médico, o Código de Ética Médica diz que é vedado ao profissional expedir documento médico sem ter praticado ato que o justifique, que seja tendencioso ou que não corresponda à verdade. Já o artigo 302 do Código Penal prevê como crime com pena de detenção de um mês a um ano dar atestado falso.

O atestado médico deve ser produzido com exatidão entre o conteúdo descrito e a veracidade dos fatos que envolvem o atendimento médico, posto ser um documento de interesse público. É informativo, destinado a terceiros, seu conteúdo tem fé pública e é parte integrante do ato médico.

No afã de não se indispor com o paciente, tentando, inclusive, fidelizá-lo em seu consultório, os médicos têm concedido atestados que distorcem a verdade, na maioria das vezes para acomodar situações políticas e sociais. Tal prática não começou com a pandemia, ela aumentou. Na doutrina do Direito Médico é conhecida como concessão de atestado gracioso, complacente ou de favor e, como também tem seu conteúdo fraudado, é falso, fazendo com que o médico pratique crime, podendo ter seu registro cassado, ad referendum, pelo Conselho Federal de Médica.

Vale lembrar que, como o atestado é parte integrante do ato médico, comete infração ética o médico que emite o referido documento atestando, ainda que corretamente, a doença ou comorbidade sem ter examinado o paciente. Já quem usa o atestado médico falso comete crime tipificado no artigo 304 do Código Penal, podendo incorrer na mesma pena do médico que forneceu o documento.

Pelo visto, talvez a única novidade neste mundo pandêmico seja o vírus. Corrupção, falta de empatia e de consciência social são velhas realidades brasileiras que vêm matando desde sempre e sem previsão certa de diminuição de contágio. E quem pensava que somente os políticos poderiam praticar crimes em meio a tanta miséria e mortes trazidas pela Covid-19 se enganou. Muitos de nós, na primeira oportunidade, não irão ficar para trás. Afinal, aqui para tudo se dá um jeito, até para a escassez da vacina. Agora chegou a nossa vez!

Autores

  • é advogada especialista em Direito Médico, Direito Odontológico e Direito da Saúde pelo Instituto Paulista de Estudos Bioéticos e Jurídicos na cidade de Ribeirão Preto (IPEBJ), especialista em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Goiás, professora da Faculdade de Medicina da PUC/GO, membro da Câmara Técnica de Direito Médico do Conselho Regional de Medicina de Goiás.

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