Opinião

A CPI da Covid-19 e a invisibilidade da violência política de gênero

Autor

  • Carla de Oliveira Rodrigues

    é advogada especialista em Direito Eleitoral mestranda em Direito Constitucional pelo IDP membro fundadora da Abradep e do Lidera-Observatório Eleitoral do IDP e membro do Observatório de Violência Política Contra a Mulher.

25 de maio de 2021, 10h36

Se há restrições, interrupções e tentativas de silenciamento ao exercício do direito da palavra por uma mulher parlamentar, estamos diante de um fenômeno invisível denominado violência política de gênero. As mulheres, quando buscam tomar alguma posição, são constantemente taxadas de "nervosas", "loucas", o que revela a estereotipação da figura feminina, são frequentemente interrompidas em seus discursos e a todo tempo os homens tentam "explicar" as suas falas. Todos esses atos constituem violência política de gênero e nós precisamos falar sobre ela.

Nos últimos anos, com o aumento da participação das mulheres na política institucional, temos presenciado o aumento do fenômeno da violência política de gênero, o que não é um privilégio do Brasil. Constitui um fenômeno global, fruto da resistência de atores políticos não acostumados a dividir espaços de poder e que tentam, através de tais práticas, impedir que as mulheres avancem no exercício dos seus direitos políticos e, consequentemente, na ocupação dos espaços de poder.

O Brasil ainda não possui norma específica conceituando e tipificando o fenômeno da violência política de gênero, porém, pesquisas apontam pelo menos cinco categorias e formas de manifestação: física, sexual, simbólica, psicológica e patrimonial.

Com o início das sessões da CPI da Covid-19, a prática de atos de violência política de gênero, todas as vezes em que uma das senadoras tenta exercer seu direito de fala, tem sido uma constante. Na sessão do último dia 12, foi possível assistir à tentativa de silenciamento da senadora Leila Barros (PSB-DF) quando esta foi interrompida em sua fala por outro parlamentar, com o objetivo de impedir que ela reproduzisse áudio atribuído ao depoente Fabio Wajngarten. Logo após a sessão, a senadora postou em seu Twitter: "Antes de eu poder mostrar a gravação, lamentavelmente, mais uma vez houve uma tentativa de silenciar a voz de uma mulher na CPI. Porém, os que tentam nos calar, não perceberam ainda que não conseguirão. A minha voz e a das demais mulheres jamais será silenciada".

A tentativa da imposição da cultura do silêncio, com interrupções dos discursos, criação de estereótipos, tentativas de ridicularização das parlamentares na tentativa de impedir a participação plena das mulheres em comissões importantes, impõe limitações ao pleno exercício dos direitos políticos e das atribuições inerentes ao cargo ou atividade parlamentar, configurando violência política simbólica de gênero.

Naturalizar e invisibilizar tais condutas é validar a cultura política tradicionalmente patriarcal e exclusiva. É urgente a adoção de medidas concretas no combate a violência política em razão de gênero, com aprovação de normas e protocolos que previna, erradique e puna a prática de atos de violência política em razão de gênero, para que as mulheres possam exercer plenamente seus mandatos. Somente assim o Brasil avançará e poderá ser reconhecido como um país verdadeiramente inclusivo e democrático.

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    é advogada especialista em Direito Eleitoral, mestranda em Direito Constitucional pelo IDP, membro fundadora da Abradep e do Lidera-Observatório Eleitoral do IDP e membro do Observatório de Violência Política Contra a Mulher.

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