Opinião

O que é o Direito penal negocial e quais as razões para críticas a essa 'novidade'?

Autor

  • Alneir Fernando S. Maia

    é advogado sócio do Escritório Andrada Sociedade de Advogados mestre em Direito pela UFMG professor da Universidade Fumec professor de Direito Penal da ESA-OAB/MG e membro efetivo da Comissão de Direito Penal Econômico da OAB/MG.

22 de maio de 2021, 17h19

A Justiça negocial penal é uma tendência não só no Direito brasileiro, a partir das reformas da legislação penal e de processo penal e do próprio sistema de Justiça criminal, mas é operada em vários países da América Latina. No Direito americano, guardadas as devidas proporções em relação ao nosso sistema, também se usa com frequência a negociação para a solução de questões criminais.

Claro que as negociações criminais no Direito americano são diferentes das que se operam aqui no Brasil, isso porque a tradição de lá é diferente, os profissionais do Direito atuam de forma diferente e a própria cultura nacional também é diferente.

Essa, então, é uma crítica que é feita à Justiça penal negocial.

Importamos do sistema americano uma ideia que, para ser aplicada em nosso sistema pressupõe ajustes, em especial dos agentes que atuam na lida criminal. Tanto acusação quanto defesa necessitam ser mais "maleáveis" em sua postura para que seja possível a boa prática da negociação penal.

Assim, retomando o pano de fundo da Justiça penal negocial, diante do avanço do tempo e da evolução histórica do Direito e da Justiça, as formas de desburocratização tornaram-se mais acessíveis e nítidas para a solução consensual de conflitos. Em relação ao Direito Penal, busca-se a ideia de que a pena de restrição de liberdade (prisão) não mais comporta status principal de sanção punitiva, atrelando-se à Justiça negocial para garantir também o caráter da pena de natureza retributiva, preventiva e reeducativa.

 As políticas de desencarceramento têm sido adotadas em vários países para evitar a segregação decorrente da prática de determinados crimes de "menor expressão", digamos assim. No Brasil não poderia ser diferente.

Foram criados institutos como o acordo de não persecução penal (ANPP), que constitui um negócio jurídico processual, através do qual as partes, agente e Ministério Público, firmam acordo mediante o cumprimento de requisitos e condições a serem cumpridos, a fim de evitar a instauração do processo penal. 

Mais uma crítica pode ser feita nesse ponto.

O Ministério Público, na proposta de acordos de não persecução penal, tem apresentado verdadeiros termos de adesão, com cláusulas e condições que impossibilitam, em muitos casos, ao acusado aceitar aquilo que foi apresentado.

Talvez nesse ponto haja uma falha da lei, que, ao estabelecer as regras do ANPP, estabeleceu que o signatário deve cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. Terminologia vaga e imprecisa, deixando livre o MP para impor algumas condições inaceitáveis.

Na mesma linha do ANPP, nos últimos tempos temos ouvido falar também sobre acordos de delação premiada/colaboração premiada, como contratos entre a acusação e os envolvidos em organizações criminosas, delito que comporta o acordo acima mencionado. Esses acordos, da forma como estão sendo firmados atualmente, evidenciam a intenção do legislador de permitir negócios jurídicos em matéria penal/processual penal, a chamada Justiça penal negocial.

Essa forma de resolver questões penais atenua, ainda, o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública incondicionada, e é reflexo da nova política criminal assumida por diversas nações, da qual não deveria ficar por fora a legislação brasileira.

O ANPP trouxe um plus ao Direito penal negocial, pois as partes transacionam com estipulação de cláusulas contratuais e abdicação de alguns direitos, característica clara dos acordos. O Ministério Público não prossegue com a persecução penal, enquanto o sujeito investigado abdica do próprio processo, garantia que lhe é assegurada constitucionalmente.

Críticas que são feitas residem no fato de que as escolas de Direito não ensinam os seus alunos a negociar. Muita combatividade e beligerância são passadas, mas técnicas de negociação e mediação não são abordadas com profundidade nos cursos de graduação.

Portanto, essa possibilidade de evitar a aplicação ou o cumprimento de pena é reflexo de nova política criminal. Com a amplitude do acordo de não persecução penal e outros institutos da Justiça penal negocial, como a delação/colaboração premiada, os horizontes se abriram e os efeitos dos acordos, inclusive, vão além das possibilidades negociais até então existentes no processo penal (como a transação penal, por exemplo).

Como todo novo instituto, muitas controvérsias e lacunas estão surgindo e surgirão em decorrência da aplicação na prática dos referidos instrumentos, cabendo aos estudiosos do Direito dar a devida aplicabilidade ao que pretende a lei.

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    é advogado sócio do Escritório Andrada Sociedade de Advogados, mestre em Direito pela UFMG, professor da Universidade Fumec, professor de Direito Penal da Escola Superior de Advocacia da OAB-MG e membro da Comissão de Direito Penal Econômico da OAB-MG.

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