"Tumulto factual"

Delação "imprestável" de Cabral conflita com as da "lava jato" e não traz provas

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19 de maio de 2021, 13h27

A delação do ex-governador Sérgio Cabral, que tentou envolver autoridades com foro privilegiado em supostas irregularidades, foi rechaçada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por, entre outros motivos, conflitar com depoimentos de outros delatores da "lava jato", que, ao contrário de Cabral, apresentaram provas para o que disseram.

Gustavo Lima
Vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de MedeirosGustavo Lima/PGR

O vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, autor da petição enviada ao Supremo Tribunal Federal na última sexta-feira (15/5), usa os inquéritos abertos com base na delação "imprestável" de Cabral como exemplos.

No caso do inquérito 4.815, Cabral cita, sem provas, supostas "contribuições financeiras no valor de R$ 30 milhões aos Senadores do PMDB nas eleições de 2014, a partir da estrutura de arrecadação de valores indevidos de Eduardo Paes". Paes é o atual prefeito do Rio de Janeiro.

É fácil comprovar que as alegações apresentadas pelo ex-governador nesse caso são falsas, de acordo com Jacques de Medeiros. Além de não entregar provas dos relatos, chamou a atenção o apontado envolvimento das construtoras Odebrecht, OAS e Andrade Gutierrez, todas implicadas nas investigações do que se convencionou chamar de operação "lava jato".

Os executivos destas empreiteiras celebraram acordos de colaboração premiada com o MPF. Os supostos casos "denunciados" por Cabral não apareceram em nenhum desses acordos, o que "explicitou a carência de plausibilidade das declarações prestadas" pelo ex-governador, ainda mais porque os executivos apresentaram provas.

Isso foi repetido nos inquéritos 4.821, 4.822 e 4.826, os quais apresentaram situações semelhantes, ou seja, de conflito das declarações de Sérgio Cabral com aquelas prestadas por outros colaboradores cujos relatos são corroborados por fartos elementos de prova ou de serem os fatos narrados já conhecidos pelos órgãos envolvidos nas apurações.

"Como é de se esperar, novamente o colaborador repete esse padrão de comportamento, apresentando termos de colaboração extemporâneos, não inéditos, que entram em conflito com outras colaborações premiadas e cujas narrativas carecem de mínima plausibilidade fático-probatória", sustenta o vice-procurador-geral.

"Esse modus operandi repete-se em diversos outros anexos do Sr. Sérgio Cabral, contumaz na produção de tumulto factual em persecuções em curso", afirma.

Não deu em nada
Em outro caso citado por Jacques de Medeiros, o ex-governador  narra suposta prática de corrupção consistente na "entrega da exploração do Teleférico do Mono da Providência para Tiago Cedraz  Leite Oliveira, em contrapartida pela proteção da prefeitura junto ao Tribunal de Contas da União".

O envolvimento de Tiago Cedraz dar-se-ia por indicação de Leandro Andrade Azevedo, do grupo Odebrecht, que integrava o consórcio responsável pela concessão do teleférico indicado. Tiago Cedraz é filho do ministro do TCU Aroldo Cedraz e, em delação, Leandro Azevedo não apontou qualquer envolvimento dele no caso.

Delação "imprestável"
Ao menos quatro anexos "quedaram-se inúteis para a atividade persecutória do Estado". Isso, segundo o vice-procurador-geral, compromete "a higidez do acordo por inteiro e só reforça o entendimento do Ministério Público sobre a inadequação da avença", ou seja, para abertura de novas investigações.

Na petição, Jacques de Medeiros destaca ainda a inconveniência da possibilidade de a polícia firmar acordos de colaboração sem a anuência do Ministério Público, único órgão capaz de propor ações penais.

"Consideradas a limitada plausibilidade das declarações prestadas pelo colaborador, que age de má-fé, e a ausência de elementos mínimos de corroboração que atribuam verossimilhança aos depoimentos que prestou, seria medida imprudente o dispêndio dos escassos recursos públicos em investigações com baixíssima probabilidade de gerar resultados úteis ao processo, partindo-se de fonte imprestável e de nenhuma credibilidade", diz Jacques de Medeiros.

Clique aqui para ler a manifestação da PGR
PET 8.482

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