Opinião

Dispute board é boa opção para resolução de disputas de alta complexidade

Autor

  • Maúra Guerra Polidoro

    é advogada e membro da Comissão NewGen do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (Cam-CCBC) onde também atuou como case manager.

18 de maio de 2021, 7h13

A Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015) e o CPC/15 (Lei nº 13.105/2015) consolidaram o incentivo aos métodos alternativos de resolução de disputas como uma opção a um Poder Judiciário abarrotado. Foi clara a intenção do legislador de fomentar as soluções autocompositivas, reduzindo a judicialização dos conflitos.

dispute board (ou comitê de prevenção e solução de disputas) é um método alternativo de solução de conflitos que consiste na formação de um comitê de especialistas imparciais que acompanhará um projeto de longa duração desde o seu princípio. O objetivo do comitê é incentivar a prevenção e auxiliar na resolução de disputas durante todo o desenvolvimento do projeto em questão.

O conceito de dispute board surgiu na década de 1970. Na época, uma pesquisa realizada pelo U.S. National Commitee on Tunneling demonstrou os efeitos deletérios das disputas ocorridas durante a execução de projetos de construção. O resultado da pesquisa levou os integrantes do mercado a buscarem alternativas menos litigiosas para dirimir os seus conflitos, tendo os dispute boards surgido em tal contexto.

Alguns dos mais famosos projetos que contaram com um comitê de resolução de controvérsias durante a sua execução foram as construções do Eurotúnel (ligando a França e o Reino Unido) e do aeroporto de Hong Kong e a expansão do Canal do Panamá. No Brasil, o método foi usado na construção da Linha 4-Amarela do metrô de São Paulo.

Os dispute boards se popularizam recentemente, principalmente depois que o Banco Mundial passou a exigir esta previsão para a concessão de financiamentos. Qualquer contrato que envolva valores superiores a US$ 50 milhões deve prever que será utilizado de um comitê para prevenção e solução das disputas.

Existem vários modelos de dispute boards. Eles são diferenciados por seu papel dentro do projeto (dispute review board DRB, dispute adjudication board DAB e combined dispute board v CDB), pelo número de membros e pelo funcionamento (permanente ou ad hoc).

Para melhor entendimento, os dispute review boards (DRB) são responsáveis apenas por fornecer sugestões para a resolução dos impasses, sem impor suas recomendações. Os dispute adjudication boards (DAB), por sua vez, são responsáveis por proferir decisões vinculantes. Os combined dispute boards (CDB), como o próprio nome sugere, combinam as características dos anteriores.

No ano de 2018, o Dispute Resolution Board Foundation analisou mais de 230 projetos que previam a utilização de dispute boards. A pesquisa apurou que 95% dos contratos previram a utilização de um comitê de recomendação, demonstrando uma preferência bastante significativa das partes. Desses, apenas 6% acabaram evoluindo para uma arbitragem.

Foram também analisadas 512 decisões proferidas por comitês de decisão. Dessas decisões vinculantes, apenas 6% originaram arbitragens.

Nesse sentido, o estudo conclui que os dispute boards têm uma taxa de 94% de sucesso, evitando procedimentos custosos de resolução de disputas subsequentes. O pequeno índice de casos que evoluem para um procedimento arbitral é prova de que o método é efetivo ao facilitar a comunicação entre as partes e encorajar a resolução de questões no nível de trabalho.

De acordo com o dispute board manual publicado pela Dispute Resolution Board Foundation, o custo de manutenção de um painel de disputas em relação ao orçamento do projeto é bastante pequeno, geralmente na faixa de 0,05 a 0,15% dos custos totais. O custo marginal da utilização de um dispute board é menor do que qualquer outra disputa formal.

A adoção desse método é aconselhável no setor da construção civil, em relações oriundas de contratos de franquias, questões pertinentes à propriedade intelectual e casos de recuperação judicial de empresas.

No cenário brasileiro, a Prefeitura de São Paulo foi pioneira em regularizar a utilização de dispute boards na Lei Municipal 16.873/18. Também a Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), sancionada em 1º/4/2021, prevê a possibilidade de serem utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, incluindo o dispute board, para a resolução de conflitos nascidos em seu âmbito.

Há que se mencionar, contudo, que o Decreto nº 60.067/2021, que regulamentou a Lei nº 16.873/2018, restringiu a utilização dos dispute boards aos contratos com valores igual ou superior a R$ 200 milhões no município de São Paulo. Isso limitou significativamente a utilização do instituto, contrariando as diretrizes internacionais.

O Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil Canadá (CAM-CCBC), à luz das práticas internacionais, expediu o seu Regulamento para o Comitê de Prevenção e Solução de Disputas no ano de 2018.

Em janeiro deste ano, o CAM-CCBC recebeu seu primeiro pedido de instauração de dispute board. As partes do procedimento já haviam participado de uma mediação bem-sucedida, também conduzida pelo CAM-CCBC, e incluíram no acordo firmado durante o procedimento de mediação uma cláusula prevenção e solução de disputas.

Em linhas gerais, as empresas envolvidas são parte de uma sociedade de propósito específico criada com o fim de participar em licitação. A licitação em questão tinha por objeto a concessão de uso de espaço para implantação e exploração comercial de uma megaloja.

O comitê formado no caso em questão é permanente (acompanhará toda a execução do projeto), na modalidade de decisão (dispute adjudication board DAB) e composto por dois membros.

Em suma, o custo de um dispute board fornece um retorno positivo sobre o investimento uma vez que a conclusão do projeto se dará de forma mais rápida, haverá minimização de estouros de custo, serão prevenidas a maioria das disputas e, nas disputas inevitáveis, o custo será muito menor.

Além da eficiência, os dispute boards são também importantes elementos de transparência, promovendo um comportamento colaborativo entre as partes.

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