Opinião

Imóveis residenciais devem ser valorizados na declaração do Imposto de Renda

Autor

  • Guilherme Rocha

    é sócio do escritório Raphael Miranda Advogados e especialista em Consultivo e Contencioso Tributário Administrativo e Judicial.

18 de maio de 2021, 12h08

O isolamento social, uma das medidas restritivas de circulação mais marcantes no enfrentamento da pandemia da Covid-19 (Sars Cov-2), não só modificou o ambiente empresarial com a aceleração da transformação digital das relações de trabalho como também criou um fenômeno comum na vida de todos aqueles que tiveram que se adaptar ao home office.

Houve maior investimento na compra de novos móveis, passagem de fios e cabos, na instalação de repetidores de wi-fi, câmeras de alta resolução e até mesmo iluminadores portáteis em LED. Ou seja, os imóveis foram adaptados para esse momento, a fim de que os profissionais pudessem ter um melhor desempenho de suas atividades diárias. 

Superada essa primeira fase, muitas pessoas avançaram de pequenas modificações e upgrades tecnológicos para obras e reformas não emergenciais (benfeitorias úteis ou voluptuárias) com o objetivo de tornar o ambiente doméstico mais cômodo, agradável e funcional. Afinal de contas, nunca se ficou tanto tempo em casa. 

Essas mudanças provocaram também discussões nos condomínios residenciais. Sabe-se que muitos instituíram rigorosas restrições que incorreram em questionamentos sobre a possibilidade de o síndico ou a assembleia de condôminos impedir a realização de obra ou reforma em uma unidade autônoma, para preservação do sossego e da saúde dos moradores. 

Para aqueles proprietários que superaram os conflitos condominiais e efetivamente executaram obras e reformas surgiu uma dúvida que é muito recorrente: o que poderia integrar o custo de aquisição do imóvel — valor pelo qual o bem foi adquirido e que consta na declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física? 

Vale registrar que a vantagem de se elevar o custo de aquisição de um imóvel se dará no momento de eventual venda, já que o ganho de capital a ser apurado (diferença positiva entre o valor contabilizado na declaração de imposto de renda e o valor de venda) será menor, reduzindo-se, desse modo, a tributação. Até porque, a legislação tributária veda expressamente qualquer correção monetária aos bens adquiridos após 31.12.1995 (Lei nº 9.249/1995, artigo 17, II). Dessa forma, como se pode observar, trata-se de uma interessante oportunidade que pode ser usufruída sem grandes riscos. 

O Decreto nº 9.580/2018 (Regulamento do Imposto de Renda) prevê em seu artigo 137, II, "a", que podem integrar o custo de aquisição de imóveis os dispêndios pagos pelo proprietário do imóvel com construção, ampliação e reforma. 

A Instrução Normativa nº 84/2001, por sua vez, ao tratar do tema em seu artigo 17, I "a", esclarece que os dispêndios com a construção, ampliação e reforma devem decorrer de projetos aprovados pelos órgãos municipais. Já no caso das pequenas obras, de forma restritiva, indica a IN que são admitidas as despesas com pintura, reparos em azulejos, encanamentos, pisos e paredes. 

Em pesquisa jurisprudencial, foi localizado um precedente da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) que vincula todos os órgãos da Receita Federal do Brasil (RFB), assentando que podem integrar o custo de aquisição do imóvel "os dispêndios com móveis planejados e embutidos, desde que se integrem fisicamente ao imóvel, sendo projetados especificamente para determinado espaço, sua instalação se dê de modo permanente ou, havendo possibilidade de remoção, esta não ocorra sem modificação, dano ou mesmo destruição, e resultem na valorização do imóvel" (Solução de Consulta Cosit nº 298/2014). 

Nesse sentido, valendo-se do entendimento da própria RFB, é possível afirmar que o rol dos artigos 137, II, "a", do Decreto nº 9.580/2018 e 17, I, "a", da Instrução Normativa nº 84/2001 admite, salvo melhor juízo, uma interpretação extensiva. 

É importante lembrar que todas as despesas devem ser comprovadas com documentação hábil e idônea, em razão da imposição normativa. Em vista disso, recomenda-se que os contribuintes mantenham tais documentos em boa guarda pelo prazo mínimo de cinco anos. Assim, ficarão amparados na hipótese de intimação da RFB, reduzindo substancialmente os riscos de eventual autuação. 

Para quem tem dúvidas de como lançar tais melhorias, segue um exemplo prático: um imóvel adquirido por R$ 300 mil no ano de 2000, que hoje teria um valor hipotético de R$ 600 mil, poderá ter o seu valor majorado na declaração de bens do Imposto de Renda com o montante empregado nas obras e reformas, nos termos autorizados pela legislação. Se esse contribuinte incorreu em R$ 100 mil no ano de 2020, irá informar tais despesas em "Bens e Direitos", adicionando no campo "Discriminação" que realizou benfeitorias no bem, com a data e o valor da obra/reforma. Nesse exemplo, teríamos, assim, a "Situação em 31/12/2019: R$ 300 mil" e a "Situação em 31/12/2020: R$ 400 mil". 

Com a proximidade do prazo de entrega do Imposto de Renda — com o veto do presidente Jair Bolsonaro, a data-limite para envio da declaração permanece 31 de maio —, recomenda-se aos contribuintes que revisem, com cautela, seus documentos para o correto preenchimento de suas declarações, de modo a aproveitar a oportunidade de integrar ao valor do imóvel as despesas com obras e reformas.

Contribuintes que já transmitiram suas declarações ou mesmo verificaram que, em exercícios anteriores, deixaram de efetivar esse procedimento poderão apresentar declarações retificadoras, observado o prazo de cinco anos. 

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