Opinião

IGPM x IPCA: a disputa judicial pela revisão dos contratos de locação

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12 de maio de 2021, 19h15

O cenário econômico mundial vem enfrentando grandes desafios em razão das consequências advindas com a pandemia da Covid-19. Para o mercado imobiliário, principalmente para o setor de locações comerciais, não está sendo diferente.

O impacto causado no poder aquisitivo da população em geral, as dificuldades financeiras enfrentadas pelo comércio, além do aumento do índice geral dos preços, são grandes desafios a serem superados na busca pela recuperação do mercado e pelo equilíbrio das relações privadas.

Diante da permanência de um cenário ainda imprevisível e da severa retração da economia brasileira, muitos negócios precisaram ser reavaliados e, com eles, seus contratos comerciais, o que vem causando a judicialização pelos pedidos de revisão, principalmente no que toca aos índices de correção.

Isso porque, conforme amplamente divulgado, a disparada do Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), índice geralmente utilizado para correção dos valores nos contratos de locação, fez com que o preço dos aluguéis se tornasse extremamente oneroso, principalmente diante do fechamento compulsório de diversos empreendimentos em todo país, ocasionando impactos negativos nas vendas e, consequentemente, causando forte abalo no faturamento das empresas.

Por outro lado, shoppings e demais empreendimentos similares alegam que, mesmo diante do fechamento, ainda mantiveram muitos de seus custos, de modo que qualquer revisão nos contratos de locação merece ponderação de ambos os lados.

No Judiciário, portanto, tais análises não devem ser ignoradas. Diante do desafio do poder público pela mínima intervenção na livre iniciativa, como preconiza o artigo 421 do Código Civil, alguns pontos merecem atenção para que o julgador seja extremamente criterioso, com foco tão somente na retomada pelo equilíbrio contratual, evitando também a fomentação de comportamentos oportunistas e uma judicialização exacerbada.

No que toca à discussão atual acerca da possibilidade de revisão dos índices de correção monetária envolvendo contratos de locação, diante do aumento de 31,10% do IGP-M nos últimos 12 meses, que fez com que muitos locatários recorressem ao Judiciário na busca pelo utilização de novo índice, o Índice de Preços ao Consumidor (IPCA), da mesma forma é preciso ser criterioso e analisar o contexto geral, já que, em que pese os índices serem definidos livremente pelas partes, a hipossuficiência ou a onerosidade exacerbada imputada a determinada parte deve, sim, ser um critério válido, pontual e excepcional para revisão de determinado contrato, com vistas a superar a crise econômico-financeira que muitas empresas estão atravessando.

Há hoje, inclusive, um projeto de lei do deputado Vinicius Carvalho (REP-SP), já aprovado pela Câmara, propondo a alteração da Lei n° 8.245/91 para que se inclua um parágrafo no artigo 18 determinando que o índice de correção dos contratos de locação residencial e comercial não poderá ser superior ao índice oficial de inflação do país, o IPCA.

Veja que a função do índice de reajuste no contrato de locação é apenas a de recompor o valor da moeda, e não o de proporcionar ao locador uma rentabilidade exagerada, já que isso acabaria por gerar um desequilíbrio contratual e, no atual contexto, até mesmo um aumento no índice de inadimplência, o que não seria vantajoso para nenhuma das partes.

Por outro lado, na busca por esse equilíbrio as intervenções judiciais podem e devem levar em consideração outros aspectos e particularidades de determinada relação comercial, lembrando que a pandemia criou uma situação atípica e que desafia o que vinha sendo pactuado.

Em que pese a pandemia e suas consequências econômicas serem, por si só, fatos notórios que poderiam ser utilizados para se invocar a previsão contida no artigo 374, I, do Código Civil e eximir a parte da sua obrigação de apresentar a prova dos fatos, a repactuação dos contratos de locação comercial, neste momento, merece maior racionalidade para que tais decisões não se tornem incentivos judiciais e, por outro lado, prejudiquem aqueles que de fato precisam de uma intervenção do Poder Judiciário para uma revisão no seu contrato.

O que se espera é que o Judiciário seja criterioso e cauteloso na análise caso a caso, de forma particular, considerando as peculiaridades de cada operação comercial, para evitar, de um lado, a intervenção excessiva do Estado nos contratos privados, e, do outro, o prejuízo para aqueles que, de fato, precisam da adoção de medidas revisionais mais incisivas. Tudo isso com o fim de manter vivos os contratos, dar continuidade à atividade comercial e, por consequência, contribuir para a recuperação mais rápida do mercado.

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