ALÍQUOTA ZERO

Revogação antecipada de isenções da Lei do Bem é ilegal, diz Regina Helena Costa

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11 de maio de 2021, 19h26

A revogação antecipada da alíquota zero de PIS e Cofins sobre a receita bruta de venda no varejo de produtos de informática concedida pela "Lei do Bem" ofende frontalmente o artigo 178 do Código Tributário Nacional, que visa proteger o princípio da segurança jurídica. Logo, é ilegal.

Anna Ivanova
Lei do Bem instituiu benefícios para incentivar inclusão digital pela parcela mais desfavorecida da população brasileira
Anna Ivanova

Essa foi a conclusão da ministra Regina Helena Costa, do Superior Tribunal de Justiça, em voto-vista proferido nesta terça-feira (11/5), em sessão da 1ª Turma que analisou o tema. O julgamento não foi encerrado porque o ministro Benedito Gonçalves pediu mais tempo para analisar a matéria.

Estão em julgamento três recursos que tratam da Lei 11.196/2005, que ficou conhecida como Lei do Bem e previa alíquota zero para o PIS e a Cofins incidentes sobre a receita bruta da venda a varejo de produtos de informática, com objetivo de incentivar a inovação tecnológica, sua produção e o acesso da sociedade aos produtos.

O prazo inicial de vigência da alíquota zero, que inicialmente era até agosto de 2009, foi prorrogado sucessivas vezes. A última delas ocorreu pela Medida Provisória 656, convertida na Lei 13.097 /2015, que em janeiro daquele ano manteve o benefício até 31 de dezembro de 2018. Sete meses depois, no entanto, foi editada a MP 690/2015, que eliminou o benefício.

A discussão reside em saber se há ofensa ao artigo 178 do CTN, que diz que "a isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo".

STJ
“Já reconhecemos onerosidade muito mais sutil do que essa”, disse a ministra Regina
STJ

Até o momento, três ministros votaram. O relator, ministro Napoleão Nunes Maia, entendeu em dezembro de 2020 que a revogação antecipada foi ilegal, posicionamento acompanhado pela ministra Regina Helena Costa. Em março de 2021, o ministro Gurgel de Faria abriu a divergência, entendendo pela legalidade da medida.

O voto desta terça foi proferido em segundo pedido de vista, o que faz com que ela seja regimental. Diante da divergência, o ministro Benedito Gonçalves se aproveitou de brecha regimental por perceber que o prazo de 30 dias para apresentação do voto-vista não estava encerrado. Assim, pediu mais tempo para avaliar o caso. O ministro Sergio Kukina também não votou ainda.

Desoneração onerosa
Assim como o ministro Napoleão Nunes Maia, a ministra Regina Helena Costa entendeu que a revogação causou surpresa e graves prejuízos aos contribuintes que se fiaram na promessa do benefício e se adaptaram.

O cerne da questão está na ocorrência da desoneração onerosa — na qual o contribuinte recebe a desoneração fiscal desde que cumpra certas exigências que, para que sejam alcançadas, se tornem onerosas e demandem esforços.

Lucas Pricken
Para o ministro Napoleão, é palpável a violência que se embute na revogação
Lucas Pricken

Para o ministro Napoleão, ela se configura no caso do varejista beneficiário porque havia condições a serem cumpridas — dentre elas, a limitação do preço do produto. A ministra Regina Helena Costa concordou, inclusive porque havia obrigação, também, de que os varejistas comprassem de fornecedores nacionais que tivessem aderido ao programa da Lei do Bem. "Já reconhecemos onerosidade muito mais sutil do que essa", disse.

Ela destacou que, somados os períodos de renovação do benefício, os integrantes do setor de informática passaram mais de uma década com comportamento induzido pela norma, até serem surpreendidos com sua revogação dois antes do esperado.

Divergência
Ao divergir, o ministro Gurgel de Faria explicou que a desoneração onerosa se aplicaria ao caso do industrial, que precisou adaptar sua produção para observância de determinadas característica dos produtos. Mas não aos varejistas, que não suportaram gastos financeiros ou comprometimento de patrimônio.

STJ
Para ministro Gurgel de Faria, varejistas não tiveram ônus para gozar da desoneração
STJ

A observância de preços finais e despesas com publicidade para comercialização dos produtos não se mostram suficientes a reconhecer a onerosidade de que trata o artigo 178 do CTN. Tampouco a suposta ampliação de suas instalações para possível aumento de vendas, destacou. O mesmo se aplica a reforço de estoque ou contratação de vendedores, fatores inerentes à atividade varejista.

Tema controvertido
Como mostrou a ConJur, o tema é controvertido no Judiciário. Ao sustentar oralmente à 1ª Turma, Amanda Geracy, procuradora da Fazenda Nacional, destacou que a tese fazendária é acatada nos Tribunais Regionais Federais da 2ª, 3ª e 4ª Regiões. Já nos TRFs da 1ª e da 5ª Regiões há precedentes em favor do contribuinte.

Ela destacou que os benefícios destinados à indústria não foram revogados, mas persistirão até 2029. E defendeu que não há, no caso, isenção onerosa. Como PIS e Cofins incidem sobre o faturamento, ainda que surpreendidos, varejistas puderam repassar os custos ao consumidor. E de fato repassaram. Houve aumento de 30% no preço médio dos produtos após a revogação.

Também integra o processo o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), entidade que congrega associados responsáveis por R$ 400 milhões de faturamento ao ano e Cerca de 800 mil empregos. Para o amicus curiae (amigo da corte), a MP que revogou os benefícios da Lei do Bem foi intempestiva e não pode ser justificada pelo rombo fiscal agravado em 2015.

"Tivemos um programa que foi vencedor, tanto que foi estendido, e tivemos, sim, condições onerosas que foram cumpridas pela indústria, mas também pelo varejo. Tivemos expectativas frustradas e direitos que foram violados", apontou a advogada Gláucia Fascino, do IDV.

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