Criminalização da Política

Juiz só vê suposições de Janot e julga improcedente ação contra líderes do MDB

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5 de maio de 2021, 18h55

O juiz Marcus Vinícius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal do Distrito Federal, absolveu sumariamente Michel Temer, Eduardo Cunha, Henrique Eduardo Alves, Geddel Vieira Lima, Rodrigo da Rocha Loures, Eliseu Padilha, Moreira Franco, José Yunes e Lúcio Funaro da acusação de integrarem organização criminosa — suposto esquema que ganhou na imprensa o apelido de "quadrilhão do MDB". Também foram absolvidos João Baptista Lima Filho, Altair Alves Pinto e Sidney Norberto Szabo.

Marcos Corrêa/PR
Michel Temer e outros quadros do MDB foram sumariamente absolvidos
Marcos Corrêa/PR

Segundo o juiz, a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, por meio do então procurador-geral da República Rodrigo Janot, não passa de uma tentativa de "criminalizar a política". Por isso, julgou improcedente a ação, por considerar que os fatos narrados não constituem crime.

Segundo a peça oferecida pelo Ministério Público, os réus teriam incorrido no artigo 2º da "lei das organizações criminosas" (Lei 12.850/13), a fim de arrecadar propina por meio da utilização de diversos entes e órgãos públicos.

Mas, para o juiz, a descrição dos fatos constante da denúncia não
contém os elementos constitutivos desse tipo penal — nem mesmo em tese. Não existe, assim, "uma associação de quatro ou mais pessoas
estruturalmente ordenada, com divisão de tarefas, alguma forma de hierarquia e estabilidade". "Numa só palavra, [a denúncia] não evidencia a subsistência do vínculo associativo imprescindível à constituição do crime", afirma.

"A denúncia apresentada, em verdade, traduz tentativa de criminalizar a atividade política. Adota determinada suposição — a da existência de 'organização criminosa' que perdurou entre 'meados de 2006 até os dias
atuais' — apresentando-a como sendo a 'verdade dos fatos', sequer se dando ao trabalho de apontar os elementos essenciais à caracterização do crime de organização criminosa (tipos objetivo e subjetivo), em aberta infringência ao art. 41, da Lei Processual Penal", prossegue.

Citando outra decisão — em que o juiz também concluiu pela inexistência de organização criminosa (por integrantes do PT) —, o juiz diz que acusar políticos desse crime, mas sem os elementos objetivos e subjetivos do tipo penal, "provoca efeitos nocivos à democracia, entre os quais pode se mencionar a grave crise de credibilidade e de legitimação do poder político como um todo".

Além disso, a decisão reconhece que, no caso, houve cerceamento de defesa, pois o Ministério Público anexou à denúncia cerca de quatro terabytes de documentos. Para piorar, jamais especificou o que seriam eles e não deu condições aos réus de os acessar na íntegra. Para o juiz, essa conduta do MPF constitui "abuso de direito de acusar".

Ao não se desvencilhar do ônus de descrever a conduta dos acusados e de configurá-las adequadamente como crime e, além, disso, obstar a possibilidade de defesa efetiva, a imputação feita pelo MPF, assim, "faz tábua rasa destas exigências constitucionais, como se lhe fosse lícito atribuir aos demandados o ônus de se defender de acusação indeterminada, pretensamente apoiada em documentos jamais especificados e apresentados de forma tal que impede possam ser identificados e contraditados", conclui o juiz.

Para Eduardo Carnelós, advogado de Temer, a sentença é a confirmação de que se deve confiar no Poder Judiciário brasileiro. "Se alguns ainda se entregam ao papel odioso de organizar as tropas do achincalhe, ferindo direitos e suprimindo garantias constitucionais, felizmente há, e continuará a haver em maioria, os magistrados que compreendem o seu papel de garantir os direitos dos acusados diante do poder punitivo do Estado. A inocência do ex-presidente Michel Temer nunca foi nem sequer maculada pelas infames acusações feitas contra ele, e a absolvição a mantém íntegra e inabalada", diz.

Para a defesa de Eduardo Cunha, conduzida pelos advogados Aury Lopes Jr. e Delio Lins e Silva Jr., adecisão do juiz federal da 12ª Vara Federal de Brasilia é acertada, pois rejeita "absurda tentativa do Ministério Público Federal de caracterizar como organização criminosa o partido político do qual [Cunha] fazia parte". "Uma fracassada tentativa de criminalização da atividade política que merece total repúdio."

Segundo o advogado Marcelo Leal de Lima Oliveira, que representa Henrique Eduardo Alves,"a decisão restaura uma verdade histórica e acaba com mais uma tentativa espúria de criminalização da política no Brasil". "A decisão proferida pelo Juiz da 12ª Vara Federal absolvendo políticos do PMDB no chamado Quadrilhão faz justiça ao rechaçar uma acusação vazia de conteúdo que visava os holofotes e a demonização da atividade política no País", completa. 

Para José Luís Oliveira Lima, advogado de José Yunes, a absolvição "restabelece a verdade de um homem com mais de 40 anos de vida pública sem qualquer mancha, sem qualquer mácula na vida".

0001238-44.2018.4.01.3400

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