Opinião

Negociações prévias na Lei 11.101/05 e instrumentos para garantir sua eficácia

Autor

  • Maicon Natan Volpi

    é especialista em Direitos Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo (ESMPSP) e analista jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo.

1 de maio de 2021, 9h12

Conforme destacado em artigo por nós escrito, e recentemente publicado nesta revista eletrônica [1], o legislador trouxe importante inovação na Lei nº 11.101/05, por meio de alterações promovidas pela Lei nº 14.112/20, em especial ao estabelecer um novo procedimento de negociação, com intuito preventivo à insolvência, e preventivo ou antecedente ao processo de recuperação judicial do empresário em situação de crise, por meio da inclusão dos artigos 20-A a 20-D, na seção II-A, do capítulo II (que trata das disposições comuns à falência e recuperação judicial).

Naquela oportunidade, destacamos a importância do breathing space (espaço para respirar), instituto jurídico que passou a ser previsto no §1º do artigo 20-B da Lei nº 11.101/05, e que se mostra crucial para a eficácia das negociações prévias.

Ocorre que, não obstante a importância destacada do instituto, ao lado do aludido instrumento jurídico devem coexistir outros instrumentos jurídicos, com o fim de neutralizar a figura do hold out (credor resistente), pois, pensando isoladamente no breathing space, bastaria esse credor esperar pelo lapso temporal, sem a adesão às negociações prévias, para frustrar o ambiente de negociação coletivo.

Com isso, mostra-se relevante a apresentação de outros instrumentos, os quais, conjuntamente com o breathing space, propiciaram um ambiente de negociação capaz de levar à reestruturação da empresa, que se encontra em situação de crise.

Nesse ponto, o legislador trouxe uma importante garantia aos aderentes da negociação prévia, inscrita no artigo 20-C, parágrafo único, da Lei nº 11.101/05, que possui o seguinte teor: "Requerida a recuperação judicial ou extrajudicial em até 360 dias contados do acordo firmado durante o período da conciliação ou de mediação pré-processual, o credor terá reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito dos procedimentos previstos nesta Seção".

Observa-se do dispositivo uma importante garantia ao credor, que estimulará o necessário ambiente de negociação coletiva, na medida em que assegura o retorno das obrigações do devedor ao status quo ante, caso haja posterior pedido de recuperação.

Vale destacar que se trata de uma garantia aplicável apenas às negociações prévias que visam a prevenir o pedido de recuperação judicial. Pode-se falar, em síntese, na garantia da vedação à dupla novação, salvo consentimento, em relação ao credor que aderiu às negociações prévias para evitar o pedido de recuperação judicial da empresa.

Contudo, podemos fazer uma interpretação extensiva do dispositivo, para aplicar essa garantia aos credores que aderiram às negociações prévias com caráter antecedente ao pedido de recuperação judicial. Desse modo, nas negociações antecedentes ao pedido de recuperação poderíamos falar na garantia do credor-aderente de não ter sua situação jurídica pactuada e negociada novamente alterada, e de forma unilateral pelo devedor, no plano de recuperação judicial apresentado pela empresa.

Sem dúvidas, o novo dispositivo (e a interpretação extensiva sugerida) retrata verdadeiro instrumento de eficácia das negociações prévias, que deve ser conjugado com breathing space.

Mas, para além dessa previsão normativa, entendemos que, por meio da analogia, podemos nos socorrer de outros institutos da Lei nº 11.101/05 para alçá-los como instrumentos atípicos de eficácia das negociações coletivas.

Assim, para a criação do ambiente de negociação coletiva, os interessados nas negociações prévias poderiam se valer, por exemplo, do disposto no artigo 60, parágrafo único, da Lei nº 11.101/05 [2], ou ainda do previsto no artigo 61, §2º, da Lei nº 11.101/05 [3], em especial nas negociações prévias que visam a evitar a instauração do processo de recuperação judicial da empresa. Sem dúvidas, são importantes instrumentos que podem garantir aos interessados um ambiente de negociação coletiva.

Desse modo, para além do breathing space, o legislador se socorreu de outro instrumento para garantir a eficácia das negociações prévias, consistente na garantia de vedação à dupla novação, e entendemos que os interessados podem se valer de outros instrumentos atípicos para criar o ambiente necessário e adequado de negociação coletiva, buscando-se o êxito no soerguimento da empresa.

 


[2] Parágrafo-único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista, observado o disposto no §1º do artigo 141 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm. Acessado em 27 de abril de 2021.

[3] §2º Decretada a falência, os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação judicial. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm. Acessado em 27 de abril de 2021.

Autores

  • Brave

    é especialista em Direitos Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo (ESMPSP), atuou em convênio com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, atualmente exerce o cargo de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo.

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