Opinião

STF decide questões importantes do Direito do Trabalho

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  • Fernanda Perregil

    é advogada e sócia do DSA Advogados mestranda em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas pelo Centro Universitário do Distrito Federal (UDF) especialista em Direito Processual Civil pela PUC-SP pesquisadora do Núcleo Trabalho Além do Direito do Trabalho da USP pesquisadora da Cielo Laboral e professora do Insper.

23 de junho de 2021, 12h17

Algumas questões importantes estarão em pauta no julgamento que o Supremo Tribunal Federal fará neste mês de junho envolvendo polêmicas mudanças, criadas a partir da reforma trabalhista de 2017: as que tratam dos parâmetros de tarifação dos danos extrapatrimoniais. Trata-se da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.069, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, em face dos artigos 223-A e incisos I, II, III e IV do §1º do artigo 223-G da CLT, na redação da Lei 13.467/2017.

O que mais salta aos olhos, e vem sendo motivo de críticas pelos operadores do Direito, é que os novos dispositivos da CLT violam o princípio constitucional da isonomia ao fixar uma tarifação por danos morais em processo trabalhista, algo inexistente no Código de Processo Civil.

Isso significa que processos dessa natureza que tramitam na Justiça do Trabalho passaram a ter tratamento diferente, ou seja, quem sofrer ofensa passível de indenização por dano moral no trabalho encontrará na Justiça parâmetros diferentes de julgamento para fixação de valores indenizatórios a uma pessoa que sofrer ofensa semelhante fora do ambiente de trabalho, impedindo a correta valoração por parte do juiz.

Outro ponto ainda mais delicado é a precificação do dano de acordo com a remuneração da pessoa ofendida. Tal mudança, além de implicar um verdadeiro retrocesso social, é inconstitucional, por ferir o princípio da isonomia e o da dignidade da pessoa humana.

Na prática, a nova redação da CLT permite que pessoas ofendidas em situações iguais sejam reparadas de forma diferente, com base apenas no último salário contratual do ofendido(a).

O valor da indenização pode variar entre três e 50 vezes o valor desse salário, dependendo do grau da ofensa — se leve, média, grave ou gravíssima. Isso significa, por exemplo, que se um gestor(a) ofende ao mesmo tempo duas pessoas da empresa, menosprezando-as, agredindo-as e insultando-as, quem tem salário maior terá indenização maior.

Isso vale, inclusive, para casos de morte provocados por negligência da empresa, por exemplo, que seriam de natureza gravíssima: se dois empregados, em posições hierárquicas completamente diferentes dentro da mesma empresa, morrem em um acidente durante viagem a trabalho porque o veículo corporativo não oferecia condições seguras de uso, levando-se em consideração que o primeiro ganhava R$ 30 mil por mês e o segundo, R$ 2 mil, a primeira família pode receber até R$ 1,5 milhão e a segunda, R$ 100 mil.

Ao definir indenizações por danos morais diferentes em função do salário contratual, fere-se o artigo 5º da Constituição, o qual reza que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza".

O inciso V desse mesmo artigo assegura o "direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem". E o inciso X expressa que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

A questão, aqui, é que a limitação estabelecida pela nova lei acarreta desigualdades e injustiças. É evidente a necessidade de que o magistrado tenha no livre convencimento condições de analisar a questão e estabelecer valores indenizatórios com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Da forma como está, porém, o texto gera ainda mais conflitos. E coloca em jogo outra questão: quais seriam os critérios para definir a natureza de uma ofensa — se é leve, média, grave ou gravíssima?

Fato é que a criação desses novos dispositivos na CLT, em vez de pacificar a questão da indenização por danos extrapatrimoniais, trouxe ainda mais potencial para conflitos, ensejando uma onda de recursos nas instâncias superiores. Não é bom para o Judiciário, que ficará engessado frente a um conflito. Não é bom para a empresa, que vai despender ainda mais tempo e recursos com processos longos e pode sofrer revés no final. E, definitivamente, não é bom para o empregado, passível de ser duplamente vitimizado, seja pela ofensa causadora do dano extrapatrimonial, seja pela forma desigual como a própria lei pode tratar casos semelhantes.

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