Lavou, tá novo

TSE abre brecha para alargar tese sobre déficit de contas sanado após eleição

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22 de junho de 2021, 21h58

O Tribunal Superior Eleitoral abriu brecha, na noite desta terça-feira (22/6), para o alargamento da tese segundo a qual não há inelegibilidade por desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal se o déficit orçamentário que levou à rejeição das contas do gestor público é sanado no mandato seguinte.

Prefeitura Municipal
Prefeito de Santa Bárbara do Sul (RS) que feriu LRF será empossado por liminar concedida de ofício pelo TSE
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A corte analisou o caso de Mário Roberto Utzig Filho, eleito prefeito de Santa Bárbara do Sul (RS) em 2020, mas ainda não empossado porque teve as contas rejeitadas pela Câmara municipal referentes ao ano de 2016, quando era também prefeito do município.

A rejeição foi causada pelo fato de ele ter assumido gastos de R$ 1,3 milhão nos dois últimos quadrimestres de mandato, obrigação que não foi sanada no mesmo exercício. Tanto o juízo de primeiro grau como o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul entenderam que ele estaria inelegível pelo artigo 1º, inciso I, alínea "g" da Lei Complementar 64/1990.

Ao TSE, a defesa de Utzig Filho apontou que o TRE-RS não fez a análise de dois pontos importantes que podem mudar a percepção sobre a rejeição das contas: os fatos de que o município, naquele ano, esteve em estado de calamidade pública por eventos climáticos e também de que o déficit foi sanado no exercício de 2017 pelo prefeito seguinte, cujas contas foram aprovadas.

Por maioria de votos, prevaleceu a divergência aberta pelo ministro Luis Felipe Salomão segundo a qual o TSE deveria devolver o caso para o TRE-RS analisar esses dois pontos, que foram suscitados desde a contestação e ignorados pela corte inclusive em embargos de declaração contra o acórdão de segundo grau.

Sandra Fado/STJ
Proposta do ministro Luis Felipe Salomão determinou devolução dos autos ao TRE-RS para analisar sanabilidade da ofensa à LRF
Sandra Fado/STJ

De ofício, o TSE ainda conferiu liminar para permitir a diplomação de Utzig Filho. A tutela antecipada, ainda que potencialmente temporária, atende a uma preocupação dos ministros, que veem esse caso se alongar demasiadamente — agora mais ainda, já que os autos voltarão para o tribunal gaúcho.

O que o TRE-RS terá de fazer é ver se à situação de Santa Bárbara do Sul se aplica o recente precedente de Queiroz (SP), quando o TSE considerou vício sanável a ofensa à Lei de Responsabilidade Fiscal devido à rejeição das contas. A decisão afastou a inelegibilidade do prefeito eleito para o município paulista.

Os dois casos têm uma diferença essencial. Em Queiroz (SP), o vício foi sanado pelo mesmo político responsável por cometê-lo. O prefeito Walter Rodrigo da Silva teve as contas desaprovadas no último ano de mandato, foi reeleito e, no primeiro ano do mandato seguinte, corrigiu a situação.

No caso de Santa Bárbara do Sul, as contas foram sanadas por outro prefeito, já que não houve reeleição. O presidente do TSE, ministro Luis Roberto Barroso, foi o único que se pronunciou especificamente sobre esse tema.

Rosinei Coutinho / SCO / STF
Para ministro Luís Roberto Barroso, fato de contas terem sido corrigidas por outro gestor não prejudica prefeito que deu causa
Rosinei Coutinho / SCO / STF

Ao votar nesta terça-feira, disse que "o fato de o déficit ter sido superado por gestor diverso que sucedeu o ora agravante em nada altera a conclusão de que a irregularidade era sanável. A sanabilidade é condição que diz respeito à irregularidade em si. Essa análise não é subjetiva, como decorre com o dolo".

Por fim, Barroso encampou o voto do ministro Luis Felipe Salomão, assim como os ministros Mauro Campbell, Sergio Banhos, Carlos Horbach e Alexandre de Moraes. Caberá ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul analisar se a tese deve ser alargada.

Ficou vencido o relator, ministro Luiz Edson Fachin, para quem Utzig Filho deve ser considerado inelegível por desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal. O ministro também ficou vencido no caso de Queiroz (SP), quando foi contrário à tese que admitia a sanabilidade do vício pela rejeição das contas.

Na ocasião, ponderou que não seria razoável permitir que o reconhecimento da inelegibilidade pelo ato doloso de improbidade dependesse da reeleição ou não do gestor público. "A continuidade da gestão mediante mandato posterior obtido nas urnas não tem o condão de eliminar os erros cometidos pelo gestor público durante seu mandato", disse, na ocasião.

Processo 0600077-14.2020.6.21.0115

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