Sem critérios

Juíza cancela acordo do Ibama com concessionária de Belo Monte

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18 de junho de 2021, 20h44

Com base no princípio da precaução, quando se trata de atividade com potencial de causar danos ao meio ambiente, a Administração Pública só pode agir de acordo com critérios técnicos que assegurem a manutenção dos ecossistemas e dos modos de vida das populações locais.

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Concessionária da hidroelétrica de Belo Monte terá que promover estudos complementares sobre os efeitos da usina
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Com esse entendimento, a Vara Federal Cível e Criminal de Altamira (PA) cancelou o termo de compromisso ambiental entre o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e a Norte Energia, concessionária da hidrelétrica de Belo Monte (PA), que previa o desvio de 80% das águas do rio Xingu para as turbinas da usina.

Em ação civil pública, o Ministério Público Federal arguiu que o TCA (termo de ajuste de conduta) assinado pelo presidente afastado do Ibama, Eduardo Bim, e a Norte Energia, que permitia a operação da usina conforme "hidrograma de consenso", configura ato administrativo viciado.

Alegou que tal medida expôs a Volta Grande do Xingu a situação de não-retorno face aos riscos de perdas definitivas ao ecossistema da região. Além disso, a empresa empreendedora não demonstrou a viabilidade técnica da ação que pretende implementar.

Em sua decisão, a juíza Maria Carolina Valente do Carmo entendeu que não há discricionariedade na decisão do Ibama que afere se determinada atividade tem potencial de causar danos ao meio ambiente, ou seja, compete a Administração Pública observar critérios técnicos para a escolha da conduta adotada.

Para a magistrada, diante do histórico de manifestações técnicas do Ibama, verifica-se que a empresa ré está em atraso desde 2019 na apresentação de estudos complementares necessários à análise técnica da viabilidade de implementação do "hidrograma de consenso".

Inclusive, no Parecer Técnico 133/2019, o Ibama concluiu que o órgão não possuía informações suficientes para a determinação do hidrograma mínimo necessário para que os processos ecológicos da fauna e flora sejam mantidos. Por conta disso, recomendou-se a adoção de um hidrograma provisório baseado nas vazões médias, explicou a juíza.

Em 2021, o Ibama emitiu o Parecer Técnico 17/2021 que considerou inadequados os estudos complementares apresentados pela Norte Energia.

Porém, de acordo com a sentença, pouco tempo depois o Ibama afirmou a possibilidade de assinatura do TCA para adoção do "hidrograma de consenso", sem informar nenhum dado técnico que justificasse sua mudança de opinião.

"Diante da ausência de certeza científica acerca dos riscos causados por uma determinada atividade, o princípio ambiental da precaução preconiza que, na hipótese de perigo de dano grave e irreversível, sejam adotadas medidas eficazes para impedir a degradação do meio ambiente", lembrou Valente do Carmo. Assim, diante da inexistência de dados que possibilitem respostas seguras, é recomendável que a Norte Energia não aplique o "hidrograma de consenso".

Medidas a serem tomadas
A julgadora decidiu que o Ibama e à Norte Energia S/A devem aplicar, durante o ano de 2021, o regime previsto no hidrograma provisório definido no Parecer Técnico 133/2019, enquanto não estabelecidas as vazões seguras a serem praticadas na Volta Grande do Xingu.

A partir de fevereiro de 2022, deve ser aplicado um regime de vazões suficiente para garantir a efetiva sustentabilidade ambiental da Volta Grande do Xingu, de acordo com os estudos complementares a serem apresentados pela concessionária, até 31 de dezembro de 2021.

Considerou pertinente também tornar públicas informações das reuniões entre a concessionária e o Ibama, uma vez que é do interesse da comunidade atingida pelo empreendimento obter informações relativas ao licenciamento ambiental, de modo a subsidiar sua participação no processo de tomadas de decisões

Por fim, julgou indispensável a participação dos povos indígenas e tradicionais da Volta Grande do Xingu na discussão acerca do "hidrograma de consenso", na condição de principais atingidos pelos impactos ambientais do empreendimento.

Clique aqui para ler a decisão
1000684-33.2021.4.01.3903

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