Opinião

A forma como o STJ tem superado seus precedentes firmados em repetitivos

Autor

  • Guilherme Veiga Chaves

    é especialista em Direito Constitucional Internacional pela Universitá di Pisa / UNIPI Itália mestre em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco advogado sócio do escritório Gamborgi Bruno & Camisão.

12 de junho de 2021, 17h09

O presente artigo visa analisar como o Superior Tribunal de Justiça tem promovido o cancelamento, adequação e formulação de novos temas nos casos de superação do entendimento firmado em recursos especiais repetitivos.

A corte instituidora dos precedentes pode revisar seus entendimentos, razão pela qual se deve investigar quais são os meios que ela utiliza para revisar seus precedentes vinculantes.

Proposta de revisão de tese repetitiva e enunciados de súmula
A matéria está regulada nos artigos 256-S, 256-T, 256-U e 256-V, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ).

É autorizada a revisão de entendimento consolidado em enunciado de tema repetitivo, por proposta de ministro integrante do respectivo órgão julgador ou de representante do Ministério Público Federal que oficie perante o Superior Tribunal de Justiça, conforme estabelece o caput do artigo 256-S do RISTJ [1].

A proposta também pode partir do presidente do órgão julgador, conforme artigo 256-V do RISTJ [2], para adequação ao entendimento do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral, em ação de controle concentrado de constitucionalidade, em enunciado de súmula vinculante e em incidente de assunção de competência.

A legitimidade para pedir a revisão do Tema. Os advogados não são legitimados
Os legitimados para requerer a revisão de tema repetitivo são apenas os ministros integrantes do respectivo órgão julgador ou de representante do Ministério Público Federal que oficie perante o Superior Tribunal de Justiça (artigo 256-S, RISTJ [3]). O presidente do órgão julgador também poderá propor, em questão de ordem, a revisão de entendimento consolidado em enunciado de tema repetitivo para adequação ao entendimento do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral, em ação de controle concentrado de constitucionalidade, em enunciado de súmula vinculante e em incidente de assunção de competência (artigo 256-V, RISTJ [4]). A classe de advogados não é legitimada para pleitear revisão dos Temas firmados em recursos especiais repetitivos.

A revisão ocorrerá nos próprios autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos
Conforme dispõe o § 1º do artigo 256-S do RISTJ [5], a revisão ocorrerá nos próprios autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos, caso ainda esteja em tramitação no STJ. Essa situação ocorre comumente nos casos em que o recurso especial repetitivo ficou sobrestado na vice-presidência do STJ aguardando o julgamento da repercussão geral afetada sobre o mesmo tema no STF. Assim, uma alteração superveniente do entendimento do STJ pelo novo precedente do STF faz com que o recurso especial repetitivo que estava sobrestado retorne para a sua respectiva Seção para fins de readequação ao precedente superveniente do Supremo Tribunal Federal.

A revisão do tema nos mesmos autos em que o precedente se firmou privilegia a segurança jurídica e o debate democrático, na medida em que todo o histórico para a construção do precedente a ser revisado estará preservado. Mais do que isso, evitará cancelamento de tema e edição de novo tema, o que geraria confusão na aplicação da revisão nos casos futuros. Por tudo isso, sempre que possível, a revisão deve ser feita nos mesmos autos, conforme estabelece o § 1º, do artigo 256-S do RISTJ [6].

Como exemplo de revisão nos próprios autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos, temos: REsp 1.396.488/SC, 1ª Seção, e REsp 1.261.020/CE, 1ª Seção.

A revisão por questão de ordem
Caso não estejam mais em tramitação os autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos, a revisão do tema poderá ocorrer por questão de ordem apresentada pelos legitimados e, nessa situação, a proposta de revisão poderá ser feita independentemente de processo a ela vinculado (artigo 256-S, § 1º, do RISTJ e artigo 256-V, § 1º, do RISTJ).

Essa ausência de vinculação a processo específico decorre de situações em que o tema necessita sofrer revisão e não há recurso especial ou agravo em recurso especial em tramitação perante do STJ, uma vez que não é cabível a interposição de agravo ao STJ contra decisão que nega seguimento a recurso especial com fundamento em tema repetitivo.

Nessa situação específica, diante da impossibilidade de ascendência de recurso ao STJ, é possível a revisão do Tema por proposição de questão de ordem independentemente de processo vinculado.

Como exemplo desta situação de revisão independente de processo vinculado: questão de ordem proposta pelo ministro Og Fernandes, registrada como PET nº 12344/DF.

O relator para a revisão do tema
Importante pontuar que se revisão for ocorrer nos próprios autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos, nos casos em que ainda esteja em tramitação no STJ, o relator será o mesmo do primeiro julgamento (artigo 256-S, §1º e artigo 256-V, §1º, RISTJ). Caso não ocorra esta situação, o relator será o ministro que fez a proposição de revisão ou ainda o presidente da Seção respectiva nos casos em que requerido pelo
Ministério Público Federal (MPF) (artigo 256-S, §2º, RISTJ [7]). Nos casos de revisão sem processo vinculado

Forma de início do processamento da revisão do tema
O procedimento de revisão de entendimento será iniciado por decisão do ministro proponente com a indicação expressa de se tratar de proposta de revisão de enunciado de tema repetitivo e exposição dos fundamentos da alteração da tese anteriormente firmada; ou por petição do representante do Ministério Público Federal dirigida ao relator do processo que ensejou a criação do tema, se o processo ainda estiver no STJ, ou ao presidente do órgão julgador caso o recurso especial repetitivo não esteja mais em tramitação, conforme estabelece o artigo 256-T, I e II, RISTJ).

Nos casos de proposta de revisão de Tema requerido pelo MPF, o ministro relator no prazo de vinte dias decidirá se a proposta de revisão de entendimento preenche os requisitos legais (artigo 256-T, II, §1º, RISTJ).

Já nos casos em que a proposta de revisão decorrer de questão de ordem de um dos ministros do STJ, será concedida vista dos autos ao Ministério Público Federal pelo prazo improrrogável de quinze dias para manifestação sobre a revisão proposta (artigo 256-T, II, §2º, RISTJ). Com ou sem o parecer do Ministério Público Federal, o processo será concluso ao relator ou ao presidente do órgão julgador, conforme o caso, para julgamento (artigo 256-U, RISTJ).

Forma de julgamento para a revisão do tema
A revisão deve observar, em relação ao julgamento e à publicação do acórdão, o disposto nas Seções III e IV, do Capítulo II-A, RISTJ, que trata do recurso especial repetitivo, conforme disposto no artigo 256-U, §único, RISTJ.

A Seção III trata do julgamento dos recursos especiais repetitivos. Seguindo a mesma sistemática, as partes e os amicus curiae que participaram da formação do primeiro precedente vinculante devem ser intimadas para se manifestarem sobre a revisão do Tema. Tal medida foi adotada pelo ministro Og Fernandes, na proposta de revisão de Tema, na PET nº 12344/DF [8].

Como a revisão do Tema depende de deliberação dos ministros que compõem a Seção ou Corte Especial, a depender do caso, entendemos que também deve ser autorizada a sustentação oral dos advogados, para que haja uma revisão democrática do Tema, com a possibilidade de influência dos interessados na formação do precedente revisado.

Conforme dispõe o artigo 256-Q, §1º, RISTJ, caso alterada a tese firmada, proceder-se-á à nova delimitação com os fundamentos determinantes da tese, comunicando ao final os ministros do órgão julgador, o presidente do STJ e os presidentes ou vice-presidentes dos tribunais de origem, nos termos do §2º, do mesmo artigo.

Já a Seção IV trata da publicação do acórdão e suas consequências. Nos termos do artigo 256-R, do RISTJ, o acórdão proferido no julgamento do recurso especial repetitivo gerará as seguintes consequências nos demais recursos especiais fundados em idêntica questão de direito: 1) se já distribuídos e não devolvidos à origem por trazerem outras questões além da afetada, serão julgados pelo relator, observada a tese firmada no julgamento de mérito do respetivo tema; 2) se ainda não distribuídos e não devolvidos à origem, serão julgados pelo presidente do STJ; 3) se suspensos nas instâncias de origem, aplicam-se os artigos 1.040 e 1.041 do Código de Processo Civil. Por fim, conforme parágrafo único, do mesmo artigo, o disposto no inciso III aplica-se a todos os processos que tratem de idêntica questão de direito, mesmo que não tenham sido objeto de suspensão.

O acórdão proferido na questão de ordem de revisão de Tema repetitivo, julgado sem processo vinculado, será inserido como peça eletrônica complementar nos processos relacionados ao enunciado de tema repetitivo (artigo 256-S, §3º e artigo 256-V, §2º, RISTJ [9]).

Conclusão
O Superior Tribunal de Justiça possui regramento que delimita a forma de alteração dos seus precedentes vinculantes (artigo 256-S e seguintes, RISTJ).

A legitimidade para propor revisão dos Temas repetitivos e enunciados sumulares é restrita aos ministros do STJ e ao Ministério Público Federal com atuação no STJ (artigo 256-S e 256-V, RISTJ). A classe de advogados não detém legitimidade para pleitear revisão de Tema repetitivo, ou pelo menos, não há esta previsão no RISTJ.

A revisão sempre ocorrerá nos próprios autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos, caso ainda esteja em tramitação no STJ, mantendo-se o relator originário ou aquele que tenha herdado o seu acervo (artigo 256-S, § 1º e artigo 256-V, § 1º, RISTJ).

Quando os autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos não estejam mais em tramitação no STJ, a revisão poderá ocorrer por questão de ordem apresentada pelos legitimados e nesta situação a proposta de revisão poderá ser feita independentemente de processo a ela vinculado (artigo 256-S, § 1º, do RISTJ e artigo 256-V, § 1º, do RISTJ) e nesta situação o relator será aquele que fez a proposição, ou o presidente da Seção no caso de proposição pelo MPF.

A forma de julgamento da revisão do Tema deve ser a mesma regra daquela adotada para formação do precedente, incluindo a intimação das partes e amicus curiae, bem como, possibilitando a realização de sustentação oral (artigo 256-U, § único, RISTJ).

Uma vez firmada a revisão do Tema, ou seu cancelamento, os ministros do STJ e os presidentes e vice-presidentes dos tribunais de origem devem ser cientificados, bem como, adotados os mesmos procedimentos quando da formação de qualquer Tema repetitivo (artigo artigo 256-Q, § 1º e artigo 256-R, RISTJ).


[1] artigo 256-S. É cabível a revisão de entendimento consolidado em enunciado de tema repetitivo, por proposta de ministro integrante do respectivo órgão julgador ou de representante do Ministério Público Federal que oficie perante o Superior Tribunal de Justiça.

[2] artigo 256-V. O presidente do órgão julgador poderá propor, em questão de ordem, a revisão de entendimento consolidado em enunciado de tema repetitivo para adequação ao entendimento do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral, em ação de controle concentrado de constitucionalidade, em enunciado de súmula vinculante e em incidente de assunção de competência.

[3] Vide nota 1.

[4] Vide nota 2.

[5] artigo 256-S, §1º “A revisão ocorrerá nos próprios autos do processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos, caso ainda esteja em tramitação, ou será objeto de questão de ordem, independentemente de processo a ela vinculado”. No mesmo sentido nos casos de revisão de entendimento consolidado em enunciado de tema repetitivo para adequação ao entendimento do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral, em ação de controle concentrado de constitucionalidade, em enunciado de súmula vinculante e em incidente de assunção de competência (artigo 256-V, §1º, RISTJ).

[6] Conforme nota 5.

[7] artigo 256-S, §2º A revisão de entendimento terá como relator o ministro integrante do órgão julgador que a propôs ou o seu presidente nos casos de proposta formulada pelo representante do Ministério Público Federal.

[8] Despacho na PET nº 12344/DF: “Nos termos do artigo 1.038, I, do CPC/2015, intimem-se o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF), a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para, querendo, manifestarem-se sobre a proposta de revisão, no prazo comum de 15 dias úteis. Após, novamente ao Ministério Público Federal, para eventual complementação do parecer, por igual prazo. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 04 de outubro de 2018.ministro Og Fernandes Relator”.

[9] artigo 256-S, §3º “O acórdão proferido na questão de ordem será inserido, como peça eletrônica complementar, no(s) processo(s) relacionado(s) ao enunciado de tema repetitivo”. artigo artigo 256-V, §2º “§2º O acórdão proferido na questão de ordem será inserido, como peça eletrônica complementar, no(s) processo(s) relacionado(s) ao tema repetitivo.”

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