Opinião

Juizado especial x Justiça comum: qual o melhor caminho?

Autor

  • Ana Paula Lembo Oliveti

    é sócia do escritório CostaMarfori Advogados pós-graduada em Direito Processual pela Faculdade Damásio de Jesus e pós-graduada em Direito Civil com Ênfase em Contratos pela FMU.

10 de junho de 2021, 19h02

Estima-se que em 2020 o número de processos que tramitam na Justiça brasileira alcançou a marca de 114,5 milhões. Destes, cerca de 20% estão distribuídos nos mais de 4.317 juizados especiais existentes no Brasil. Nesse contexto, ainda existem alguns advogados que encontram dificuldades na escolha do rito para distribuição de suas ações, assim como possuem dúvidas quanto aos recursos e atos disponíveis no âmbito do juizado especial cível (JEC). De fato, o JEC, como comumente os juizados especiais cíveis são conhecidos no meio jurídico, inovaram com a simplificação, economia e celeridade do processo e, por isso, algumas formalidades da Justiça comum foram suprimidas, a fim de garantir o atendimento de seus princípios condutores.

Para se compreender melhor as diferenças, é importante um recorte histórico acerca da instituição do juizado especial cível no Poder Judiciário brasileiro. A essência de sua criação se atrela aos já revogados juizados especiais de pequenas causas, que foram instituídos pela Lei 7.244/84 com a expectativa de facilitar o acesso à Justiça, trazendo um olhar para os menos favorecidos. Portanto,foi com base nesse ideário social e jurídico trazido pela Lei dos Juizados das Pequenas Causas que o legislador constituinte, no artigo 98, I da Constituição Federal, trouxe a previsão acerca da criação dos juizados especiais cíveis, que foram efetivamente instituídos pela Lei 9.099/95 de 26 de setembro de 1995. A criação do JEC representou uma grande mudança, pois rompeu com a antiga estrutura processual, que era baseada no excesso de formalismo da justiça comum, trazendo por meio dos seus princípios condutores mais efetividade à previsão constitucional do acesso à justiça.

São princípios norteadores dos juizados a oralidade, a informalidade, a simplicidade, a economia processual, a celeridade e a autocomposição. Com base nessas concepções, é importante observar as principais diferenças entre os ritos, que são percebidas desde o ajuizamento da ação. A Justiça comum é competente para julgar ações com qualquer valor de causa, enquanto os juizados especiais cíveis se limitam a julgar apenas ações que não ultrapassem o teto de 40 salários-mínimos, conforme especificado no artigo 3º, inciso I, da Lei 9.099/95, garantindo a previsão de que não serão julgadas por ele as ações de maior complexidade.

Por se tratar de um procedimento facilitador e que busca principalmente conceder aos menos favorecidos o acesso à Justiça, a figura do advogado pode ser dispensada nas ações em que o valor da causa não ultrapassar a marca de 20 salários-mínimos, observando que, na hipótese de valor a maior, é indispensável a constituição do advogado, semelhante à Justiça comum, em que sempre é obrigatório que as partes se façam representadas por um advogado.

Ao contrário da Justiça comum, em que somente com a decisão judicial concedendo os benefícios da justiça gratuita é que a parte será dispensada do recolhimento de custas e honorários advocatícios, no JEC não há necessidade de recolhimento de custas e os honorários somente são fixados em sede recursal. Quanto às partes, a legislação estabelece algumas restrições ao juizado especial cível que não se repetem na Justiça comum, como por exemplo o impedimento de que nas demandas em que figurem como parte um incapaz, absoluto ou relativo, seja proposta no juizado especial cível. Também é vedada que a massa falida ingresse com qualquer ação junto ao JEC, podendo apenas ser acionada em ação tramitada pelo rito, conforme estabelecido pelo artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor.

Em observação aos princípios da simplicidade e da celeridade, ao contrário da Justiça comum, nos juizados especiais cíveis não são permitidas perícias e nem qualquer modalidade de intervenção ou assistência de terceiros, conforme a previsão do artigo 10 da Lei 9.099/95. Fica excluída dessa regra apenas indicação do litisconsorte. Outra importante diferença está na possibilidade de ação dúplice, que somente é permitida na Justiça comum através da reconvenção; no JEC, a previsão é vedada por força do artigo 31 da Lei 9.099/95, sendo suprida pelo pedido contraposto.

Quanto às vias recursais, o recurso cabível em face de uma sentença proferida no JEC é o recurso inominado, que não possui, automaticamente, efeito suspensivo, entendimento que se encontra com o objetivo de celeridade dos juizados especiais. No entanto, é possível ao juiz atribuir o duplo efeito quando verificar o risco de dano irreparável à parte. Outra peculiaridade é que não cabe recurso especial em face das decisões proferidas pelo Colégio Recursal; porém, entende-se pela possibilidade de cabimento do recurso extraordinário, posto o critério de admissibilidade previsto no artigo 102, III da Constituição Federal, em que se exige apenas que a causa tenha sido decidida em única ou última instância, sem qualquer imposição quanto ao esgotamento da via recursal por única ou última decisão de Tribunal Regional.

Em suma, é correto afirmar que, por serem procedimento instituídos com funções e expectativas diferentes, se observam tantas diferenças, sendo que em sede de JEC sempre será observada uma tramitação mais ágil, que dispensa as formalidades que muitas vezes engessam o nosso judiciário.

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    é sócia do escritório CostaMarfori Advogados, pós-graduada em Direito Processual pela Faculdade Damásio de Jesus e pós-graduada em Direito Civil com Ênfase em Contratos pela FMU.

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