O porão voltou

Polícia Civil do Rio investigará jornalista por críticas a massacre do Jacarezinho

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8 de junho de 2021, 21h44

A Polícia Civil do Rio de Janeiro abriu inquérito para investigar se o editor-executivo do site The Intercept Brasil, Leandro Demori, cometeu calúnia ao questionar a operação policial que deixou 28 mortos na favela do Jacarezinho, zona norte da capital fluminense, em 6 de maio.

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Operação policial na favela do Jacarezinho deixou 28 mortos, um deles um policial
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Dois dias após a operação, Demori reproduziu nas redes sociais trechos de uma newsletter sua em que afirmou que policiais que participaram do ação do Jacarezinho "são conhecidos à boca pequena como 'facção da Core', a Coordenadoria de Recursos Especiais".

"A história cresce quando juntamos outros fatos: a 'facção' está envolvida no caso João Pedro (menino de 14 anos, morto durante uma operação), na chacina do Salgueiro (oito mortos) e no caso do helicóptero da Maré (oito mortos). São 41 homicídios somente nesses casos. Quantos mais?", disse Demori.

Quem comunicou a suposta calunia foi o delegado Pablo Dacosta Sartori, titular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI). Segundo a Polícia Civil, a delegada Daniela dos Santos Rebelo Pinto assinou a abertura da investigação porque Sartori estava afastado por licença medica.

"Trata-se de ocorrência realizada por determinação de autoridade policial, com objetivo de apurar o teor de diversas acusações realizadas contra policiais civis do estado do Rio de Janeiro, em especial contra os policiais lotados na Core (Coordenadoria de Recursos Especiais), uma vez que, após buscas virtuais realizadas pelo setor técnico desta delegacia especializada, foram identificados perfis nas redes sociais, onde há afirmação de que os policiais são criminosos e que fazem parte de uma 'facção' que mantém um grupo de assassinos", afirma o inquérito, instaurado em 12 de maio.

Leandro Demori, que deverá depor nesta quinta-feira (10/6), afirmou à Folha de S.Paulo que a apuração é arbitrária. "O que me espanta é que, em vez de usarem o aparato policial para investigar a denúncia, investigam o jornalista."

O Intecept Brasil, em editorial publicado nesta terça (8/6), disse que "tudo indica que a DRCI se tornou uma delegacia de repressão política".

"Em democracias saudáveis, a polícia estaria preocupada com a pilha de mortos que a Core vem deixando em suas operações. No Brasil dos nossos tempos, a polícia quer intimidar e pressionar o mensageiro. Demori foi intimado a comparecer na Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática na próxima quinta-feira, às 14h. A DRCI é a mesma que intimou Willam Bonner, Renata Vasconcellos e Felipe Neto, em casos com evidente viés político. Tudo indica que a DRCI se tornou uma delegacia de repressão política. O Intercept não vai se curvar a isso, nunca."

Também é investigado no inquérito o biólogo Lucas Sá Barreto Jordão. Isso porque ele publicou o seguinte comentário sobre a operação no Jacarezinho no site do El País: "Operação de bandidos fardados mata 25 pessoas".

Histórico arbitrário
Titular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática, Pablo Dacosta Sartori foi o responsável por instaurar, a pedido do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), inquérito contra o youtuber Felipe Neto. A investigação, com base na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983), foi aberta após ele chamar o presidente de “genocida”.

Sartori também abriu inquérito contra os apresentadores do Jornal Nacional William Bonner e Renata Vasconcellos. Isso porque eles noticiar que o Ministério Público do Rio havia oferecido denúncia contra o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). As investigações contra Felipe Neto e os jornalistas da Globo foram arquivadas pela Justiça.

Além disso, a Justiça trancou inquérito em que Sartori acusou a Ordem dos Advogados do Brasil de ser uma organização criminosa. 

Em maio de 2019, as advogadas Carolina Araújo Braga Miraglia de Andrade e Mariana Farias Sauwen de Almeida acompanharam a cliente Izaura Garcia de Carvalho Mendes em ida à Delegacia de Combate à Pirataria do Rio. Na ocasião, Izaura, portando um falso registro da Biblioteca Nacional, acusou o padre Marcelo Rossi de plágio. O delegado Maurício Demétrio Afonso Alves então decretou a prisão em flagrante das três mulheres por uso de documento falso, formação de quadrilha, denunciação caluniosa e estelionato.

A seccional do Rio de Janeiro da OAB afirmou que a decretação de prisão das advogadas no exercício da atividade foi ilegal e apresentou representação contra o delegado por abuso de autoridade no Ministério Público.

A pedido de Maurício Alves, o delegado Pablo Dacosta Sartori abriu inquérito contra os dirigentes da OAB-RJ para investigar a prática de uso de documento falso, denunciação caluniosa e associação criminosa e os convocou para prestar esclarecimentos.

Em seu relato, Alves afirma que representantes da Ordem estariam protocolando uma petição relatando supostos crimes e transgressões disciplinares cometidos por ele. No entanto, o delegado diz que os advogados praticaram "omissões criminosas" na acusação de abuso de autoridade e alegou inocência. No inquérito, por duas vezes, os dirigentes foram chamados de "os criminosos da OAB" por Sartori.

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