Famílias traumatizadas

"Operação que termina com 28 mortos não pode ser considerada bem-sucedida"

Autor

4 de junho de 2021, 7h50

Spacca
A operação policial que deixou 28 mortos na favela do Jacarezinho, zona norte do Rio de Janeiro, foi um fracasso, e é preciso investigar se agentes de segurança executaram moradores da comunidade, afirma Rodrigo Pacheco, defensor público-geral do Rio.

Pacheco aponta que há indícios de que a ação policial desrespeitou a decisão do Supremo Tribunal Federal de restringir operações em favelas a casos "absolutamente excepcionais" enquanto durar a epidemia de Covid-19. E opina que o uso excessivo da força é ineficaz em reduzir os índices de criminalidade.

Em janeiro, Pacheco foi empossado para seu segundo mandato como defensor público-geral do Rio. Sua primeira gestão foi marcada pela defesa dos direitos humanos e pelas ações para assegurar garantias da população durante a crise do coronavírus, como leitos em hospitais, redução de mensalidades de escolas e prisão domiciliar para integrantes do grupo de risco.

Em seu segundo mandato, que terminará no fim de 2022, Rodrigo Pacheco quer investir em tecnologia, levar a instituição a favelas e aumentar a diversidade racial.

Leia a entrevista:

ConJur — Como o senhor avalia a operação policial no Jacarezinho que deixou 28 mortos?
Rodrigo Pacheco —
Uma operação que termina com esse número de mortos, incluindo um policial, não pode ser considerada bem-sucedida. Além disso, hoje temos como saldo diversas famílias traumatizadas, algumas desalojadas e outras ameaçadas, boa parte delas já sendo atendidas pela Defensoria. Estamos falando de um ambiente com crianças, idosos, a clínica da família precisou ser fechada naquele dia, em plena pandemia. A Defensoria Pública historicamente defendeu a presunção de inocência, aplicável também ao caso, mas precisamos apurar com rigor as circunstâncias dessas mortes, se os ritos legais foram respeitados, ou se, de fato, houve execução e outros crimes.

ConJur — A operação desrespeitou a decisão do STF que restringiu incursões em comunidades durante a epidemia de Covid-19?
Pacheco —
Há fortes indícios de que sim, desrespeitou. Mas só teremos certeza quando o STF se manifestar a respeito dos critérios de excepcionalidade. Ainda não tivemos acesso aos relatórios que justificam a operação. Só então poderemos fazer essa análise de forma precisa.

ConJur — Operações policiais violentas ajudam a reduzir a criminalidade?
Pacheco —
Definitivamente não. Fosse assim, o Rio de Janeiro não teria mais os índices de violência que vemos hoje. Além disso, a política do confronto, sintetizada pelo “tiro na cabecinha”, além do trauma de provoca nos moradores de favela, deixa o próprio policial extremamente vulnerável. Iludido, talvez, pela ideia de estar protegido a partir desse discurso, o policial é quem vai, com a vida e, muitas vezes, respondendo a um processo criminal, sofrer as consequências dessa política do confronto, que tantas vítimas deixa pelo caminho.

ConJur — Em 2019, que foi o único ano completo do governo Wilson Witzel, as polícias do Rio de Janeiro mataram mais pessoas do que em qualquer outro ano da série histórica. Como o senhor avalia essa atuação da polícia?
Pacheco —
Qual foi o grande problema? A análise que nós fazemos é que a chegada desse novo governo em 2019 veio junto a um discurso muito virulento, de estímulo à violência das forças de segurança pública. Isso teve um impacto enorme nas tropas, porque havia uma chancela institucional da política de confronto. Naquele primeiro momento, nós nos posicionamos falando que víamos com muita preocupação esse discurso do "tiro na cabecinha" e que, estando armado com o fuzil, pode matar porque a Defensoria Pública vai defender. Nós defendemos qualquer pessoa, mas foi muito complicado vir um discurso oficial de estímulo da violência das forças de segurança. Ao longo do tempo foi havendo uma moderação nesse discurso. Uma análise que eu faço hoje do novo governo [de Cláudio Castro] é que não há esse discurso de estímulo. É evidente que não tem como se falar que a política do confronto cessou. Mas é muito importante que o atual governo não tenha um discurso de estímulo à violência.

ConJur — Como avalia a decisão do STF de restringir ações policiais durante a epidemia de Covid-19?
Pacheco —
É importante frisar que essa ação não proíbe a polícia de exercer a sua função de garantir segurança pública. Isso é fundamental. Não podemos cair no discurso de que agora a polícia não pode trabalhar. Ela pode trabalhar, mas evidentemente, na situação de pandemia, em que as pessoas estão vivendo uma tragédia humanitária, com leitos superlotados, com fila de acesso aos leitos, é fundamental que outras políticas públicas sejam priorizadas. Por isso o Núcleo de Defesa de Direitos Humanos da Defensoria se habilitou como amicus curiae na ADPF 635, argumentando que, nesse momento de tragédia, a política pública prioritária deve ser de salvar vidas; que nós vamos focar nossas energias na garantia do direito à vida e do direito à saúde. E não há razoabilidade em provocar o maior estresse nessas comunidades com operações rotineiras, diárias. Mas evidentemente, quando houver necessidade, quando for caso da polícia ingressar numa comunidade, ela deve fazer seguindo os parâmetros fixados pelo Supremo.

ConJur — Um levantamento da Defensoria Pública do Rio apontou que 84,5% dos presos preventivos no estado são mantidos em cárcere por mais de 90 dias, que é o tempo máximo permitido pelo Código de Processo Penal para que haja revisão da detenção. Como a Defensoria tem atuado para fazer cumprir esse prazo? E os magistrados respeitam essa determinação legal?
Pacheco —
Não. Esse debate, essa pesquisa, esse levantamento surge aqui na Defensoria Pública especialmente naquele contexto do caso André do Rap. O artigo 316 do Código de Processo Penal, modificado pela Lei “anticrime” (Lei 13.964/2019), é um enorme avanço no controle do prazo das prisões cautelares. Desde 2009, com a mudança de perfil trazida pela Lei Complementar 132, a Defensoria Pública vem atuando não só no Poder Judiciário, mas também na discussão de políticas públicas junto ao Executivo, ao Legislativo e à sociedade. Então a nossa equipe compreendia que era importante mostrar para a sociedade que o artigo 316 ia muito além do André do Rap. Aí nossa Diretoria de Pesquisa passou a fazer uma análise do período de prisão provisória. Nós chegamos nesse número, o que mostra a indispensabilidade de ter um controle temporal da prisão cautelar e a necessidade da alteração legislativa. É evidente que o cumprimento do artigo 316 não é completo aqui no estado do Rio de Janeiro. Pede-se o relaxamento de prisão e vem um argumento, muitas vezes do magistrado, falando da complexidade do processo. Se o assunto é discutido em Habeas Corpus, consta o entendimento de que não é um prazo peremptório, que depende de cada caso, quem deu causa ao atraso do processo. Então não é algo que é sempre cumprido. Mas, ainda assim, é uma baliza importante para se discutir a ilegalidade das prisões por excesso de prazo.

ConJur — Outro levantamento da Defensoria apontou que oito em cada dez presos em flagrante no Rio são negros. Como combater o racismo no sistema de Justiça?
Pacheco —
Esse levantamento já é uma forma de se combater. Quando se mostra a cara de quem está sendo preso no sistema de Justiça criminal, isso é uma forma de combater o racismo. Mas as instituições do sistema de Justiça têm que se olhar também. E aqui é um compromisso da Defensoria, porque não basta que a Defensoria tenha o olhar externo para as outras instituições, para a sociedade. Ela também tem que se olhar, ver até que ponto o racismo existe na instituição. E, para isso, ano passado nós criamos a Coordenação de Promoção da Equidade Racial, que é uma coordenação para ter o olhar racial na Defensoria Pública junto ao servidor, aos estagiários, aos defensores, na gestão, não apenas na atividade-fim. É quase um ombudsman racial da Defensoria Pública. E que já vem tomando uma série de medidas interessantes. Já fez a capacitação de uma série de defensores e servidores sobre relações étnico-raciais e propôs uma alteração no regulamento de um concurso, ampliando para 30% o percentual de vagas para a população negra, tentando democratizar o acesso também aos cargos da Defensoria Pública. Nesse concurso, que será concluído em 2021, nós temos muita esperança de que mais negros e negras venham a se tornar defensores e defensoras públicas, o que vai ter um impacto muito grande também na instituição, na cultura institucional.

ConJur — O Superior Tribunal de Justiça decidiu recentemente que o reconhecimento por fotografia não serve para embasar a condenação. Como avalia essa decisão?
Pacheco —
Desde que eu entrei na Defensoria, em 2002, todo defensor público em vara criminal sustenta essa posição nas suas linhas de defesa. Muitas vezes nós víamos o reconhecimento com base na fotografia da folha de antecedentes criminais, em álbum de delegacia. E nós alertávamos para as falsas memórias. Esse reconhecimento não cumpre o Código de Processo Penal. Porque o reconhecimento por fotografia tem um caráter de indução muito grande, fragiliza muito a prova para uma condenação. Mas, na maior parte das vezes, esse discurso solitário era solenemente ignorado. A decisão do STJ é uma consequência do que o país está vivendo, do que o mundo está vivendo, da agenda racial. Tem muita gente estudando as relações raciais, os impactos das relações raciais no sistema de Justiça criminal, na construção da memória. E isso culmina com essa decisão histórica do Superior Tribunal de Justiça contrária ao reconhecimento por fotografia. É algo para ser muito comemorado.

ConJur — Quais foram os maiores desafios no seu primeiro mandato à frente na Defensoria do Rio?
Pacheco —
O primeiro grande desafio foi assumir a Defensoria Pública em um ambiente, tanto no plano federal quanto no estadual, de muita violência, no discurso de agressividade em relação aos direitos humanos, aos direitos fundamentais, a uma política de segurança pública cidadã. E entra o "tiro na cabecinha", o "projeto" de construir uma Guantánamo no Rio de Janeiro [medidas defendidas pelo ex-governador do Rio Wilson Witzel]. O maior desafio foi a Defensoria Pública se colocar como uma voz contrária a todas essas propostas de violação dos direitos humanos. E, igualmente, se colocar como uma instituição autônoma, independente, e que não faria parte de um projeto político no estado do Rio de Janeiro. A instituição se coloca nesse papel, inclusive falando que historicamente sempre fez a defesa criminal de policiais e de cidadãos, mas que, institucionalmente, defende uma política de segurança que não vise o confronto, que busque outros métodos, que não aumente essa tragédia que é a letalidade provocada pelas forças de segurança. Nós atuamos muito fortemente contra qualquer proposta de alteração legislativa que violasse a presunção de inocência e que autorizasse a prisão em segunda instância. Então atuamos no Supremo Tribunal Federal como amicus curiae em diversos casos. Fomos ao Congresso Nacional. Eu participei de audiência pública junto com o então ministro da Justiça Sergio Moro, na qual fui contra diversos aspectos do pacote "anticrime". Nós temos essa postura institucional, que é uma postura corajosa, de ser contramajoritários a essa avalanche de punitivismo, de recrudescimento da legislação penal, contra aquela proposta de legítima defesa de agentes de segurança pública.

A partir de 2020, sem dúvida nenhuma, o maior desafio foi reformular a forma de atuação da Defensoria Pública no meio de uma pandemia. A partir do fim de março, nós tivemos que abandonar os 65 anos de tradição de atendimento presencial para atendimento 100% remoto. Isso foi um trabalho muito grande, para criar uma série de portas de acesso à Justiça, seja via WhatsApp, e-mail, telefone, criar protocolos sanitários. Durante três meses, a Defensoria Pública funcionou de forma integralmente remota. Nesse período, nós planejamos a retomada presencial com segurança. Por ser um serviço público essencial, de acesso à Justiça, assistência jurídica, nós tínhamos a compreensão de que havia a necessidade das sedes da Defensoria Pública estarem abertas. Então durante três meses esse foi um desafio gigantesco, que é preparar as sedes para a reabertura. Nós temos 150 sedes em todo o estado e tivemos que reformular todo o layout delas, adquirir dispenser de álcool em gel, barreira de acrílico e entender, no meio de toda essa confusão de liderança na crise sanitário, quais eram os protocolos da Defensoria Pública. Havia muita descoordenação em todas as esferas. Então nós tínhamos que mergulhar aqui em diálogos com a Fiocruz, com as secretarias de saúde, com a rede privada, estudar os protocolos da Organização Mundial da Saúde. Quando nós estávamos com as sedes todas totalmente preparadas, com protocolos sanitários, nós conseguimos retomar o atendimento presencial, continuando ainda preferencialmente remoto. Nesse intervalo nós também lançamos um aplicativo, que é o Defensoria RJ, para criar mais uma porta de acesso à Defensoria Pública. Então, no plano geral, eu diria que o mandato tem os maiores desafios nesses dois pontos: primeiro colocar a instituição como autônoma, independente, e reformar seu papel de garantia de direitos jurídicos fundamentais; e segundo, enfrentar a pandemia, tanto do olhar da gestão, preparar a Defensoria para esse momento, e absorver a demanda que explodiu em 2020.

ConJur — Como o senhor avalia a atuação da Defensoria na epidemia de Covid-19? O que foi mais importante? Teve alguma coisa que poderia ter sido feita de uma forma diferente, mas não foi possível?
Pacheco —
A nossa análise é que a Defensoria foi protagonista dos grandes temas relacionados à pandemia. Na área da saúde, tanto coletiva como individualmente, nós funcionamos 24 horas por dia, literalmente, porque há um plantão noturno, atendendo às pessoas que não conseguiam vagas de internação, não conseguiam medicamentos. Atendendo essas pessoas para buscar decisões judiciais que lhes assegurassem o direito à vida, em última análise. No plano coletivo, nós atuamos em relação a todos os municípios, cobrando deles um plano de contingencia. Muitas vezes atuando conjuntamente, uma atuação inédita e que fortalece os laços institucionais com o Ministério Público. Na busca de uma restrição maior da circulação, exigindo dos poderes públicos a ampliação de leitos, um plano de enfrentamento à pandemia.

A Defensoria Pública também atuou na área da educação. Foram 22 ações civis públicas propostas contra municípios para garantir a merenda aos alunos da rede pública, que mesmo remotamente não poderiam prescindir da alimentação; muitas vezes a fornecida pelo poder público é a mais importante do dia. Em muitos municípios, nós firmamos um termo de ajustamento de conduta em que o município se comprometia a continuar a prestar a merenda. Também dialogamos com o poder público, com o estado, municípios, para um retorno seguro das atividades educacionais.

No sistema carcerário, promovemos uma defesa intransigente da audiência de custódia presencial, inclusive no Conselho Nacional de Justiça. Nós ajuizamos uma série de ações coletivas, Habeas Corpus coletivos e, às vezes, ações civis públicas para reduzir o efetivo carcerário. Conseguimos reduzir muito o número de mulheres lactantes e gestantes presas. São os menores números da história do estado do Rio de Janeiro. Tem um número muito interessante também: entre dez meses e um ano, nós reduzimos o efetivo carcerário do estado do Rio de Janeiro em 10 mil pessoas. Isso decorre de muitas ações da Defensoria.

No plano das unidades de internação de adolescentes, também temos os menores números igualmente de adolescentes internados. Acho que é a primeira vez que sobra vaga nas unidades de internação em alguns anos, porque também foram muitos Habeas Corpus coletivos. Nós aqui firmamos um compromisso com o estado do Rio de Janeiro, homologado pelo Poder Judiciário, de fechamento das unidades de semiliberdade enquanto houver pandemia, para que não sejam um foco de contaminação.

Na área de defesa do direito à moradia, em conjunto com a Assembleia Legislativa, foi aprovada uma lei proibindo o despejo durante a pandemia. A Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro ajuizou uma representação de inconstitucionalidade, conseguiu uma liminar, mas no final do ano passado a Defensoria Pública foi ao Supremo Tribunal Federal, e o ministro Ricardo Lewandowski restabeleceu a validade da lei. Então hoje os despejos estão proibidos no estado do Rio de Janeiro.

Poderia falar na área de defesa do consumidor, quando nós conseguimos a redução das mensalidades das escolas particulares e das universidades em conjunto com a Assembleia Legislativa do Rio e ações civis públicas. Explodiu a demanda de mulheres de vítimas de violência de gênero, e o nosso núcleo as atendeu.

ConJur — As audiências virtuais e por videoconferência trouxeram prejuízos ao contraditório e à ampla defesa?
Pacheco —
Sim. A Defensoria Pública da área criminal e da infância se pronunciou publicamente contra a videoconferência. Aqui no estado do Rio de Janeiro, na área da infância, nós tivemos um duríssimo embate contra as audiências dos processos de internação de adolescentes. Não saímos vitoriosos nesse embate jurídico. Em relação às varas criminais, nós temos a certeza de que a audiência virtual prejudica a ampla defesa do réu, seja porque ele está na unidade, longe de seu defensor, seja porque na vara consegue um contato mais ágil, seja porque o juiz não consegue ter aquele grau de humanidade que a audiência presencial possibilita. Nós percebemos que não há uma infraestrutura de internet adequada para suportar o número de audiências criminais. São muitos problemas para a oitiva de testemunha, protocolos para a oitiva de policiais militares no batalhão. Como garantir a incomunicabilidade das testemunhas?

ConJur — A Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça sugeriu a reavaliação de prisões provisórias de idosos ou integrantes do grupo de risco da Covid-19. Na sua opinião, essa recomendação foi bem aplicada pelos juízes? E foi suficiente para evitar a propagação do coronavírus em presídios?
Pacheco —
Não. Nós compreendemos que não foi seguida a recomendação do Conselho Nacional de Justiça. No início da pandemia, nós fizemos um mapeamento minucioso de todo o grupo de risco das unidades correcionais, seja por comorbidades ou pela idade, e fomos a cada juiz solicitando que essas pessoas cumprissem a pena em prisão domiciliar, porque havia muita preocupação de ali ser uma bomba-relógio de contaminação da Covid, ter muitas mortes no sistema prisional. Poucos pedidos foram acolhidos, a maior parte foi negado. Mas tentando ter um olhar mais positivo, essa redução de quase 10 mil presos no estado do Rio de Janeiro foi um ponto muito positivo, uma vitória que a Defensoria Pública comemora muito. E comemora mais ainda porque isso não impactou nos índices de criminalidade e segurança pública. Óbvio que tem vários outros fatores envolvidos, como a circulação menor de pessoas. Mas esse discurso de que reduzir a população carcerária por consequência vai aumentar a violência não ficou comprovado nessa experiência que nós estamos tendo durante a pandemia.

ConJur — Quais são os principais objetivos do seu segundo mandato?
Pacheco —
Óbvio que é um mandato de continuação, então é trazer cada vez mais os direitos humanos para uma centralidade na nossa atuação, seja nos processos judiciais, seja na atuação no Legislativo, no Poder Executivo, mas também em educação para direitos. Nós estimulamos muito nesse biênio e vamos estimular ainda mais esse papel da instituição de disseminar conhecimento, disseminar cidadania. Isso tem por consequência a busca pela aproximação cada vez maior das camadas mais vulneráveis. A lógica tradicional de pessoa procurar a Defensoria é fundamental, isso vai continuar, nós precisamos ter sedes mais estruturadas. Mas também vamos fazer uma busca ativa, especialmente ir às favelas, ir às comunidades, atender a população nesses lugares, fazer um diagnóstico junto com a nossa Diretoria de Pesquisa para entender quem é essa população das favelas do estado do Rio de Janeiro, quais são as demandas, avaliar de que forma isso pode impactar em diálogo com o Poder Legislativo, com o Poder Executivo. Um tema fundamental é o investimento tecnológico. Nesse cenário de crise do Brasil, especialmente do estado do Rio de Janeiro, com o regime de recuperação fiscal, com pouco espaço para crescimento e investimento em servidores públicos, em defensores, investir em tecnologia é fundamental para absorver essa demanda. Temos o Sistema Verde, que tem uma série de integrações com o Poder Judiciário e outros órgãos. Nós estamos desenvolvendo uma inteligência artificial que faça a leitura das intimações, uma pré-triagem para os defensores públicos. Nós temos uma outra ferramenta de inteligência artificial que faz a transcrição das audiências. Temos um aplicativo para atender a população remotamente, de forma mais racional e organizada. Tudo isso também é um outro projeto, que é o Verde em Dados. Hoje é possível saber as demandas de cada órgão de atuação, de cada município, de cada bairro do estado do Rio de Janeiro. Isso será fundamental para litígios estratégicos na área coletiva e também extrajudicial. É possível, em tempo real, saber quem são os dez maiores litigantes da Defensoria Pública, contra quem a Defensoria Pública mais processa, por município e por bairro. Isso vai permitir mapear onde há maior deficiência nas políticas públicas, dialogar com municípios, com o estado. E o terceiro eixo é buscar diversidade na instituição. A Defensoria Pública hoje tem 18% do quadro de defensores de negros, e é fundamental que ela avance para uma maior diversidade.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!