Mais previsibilidade

Na TV Conjur, Gilmar e Lira debatem vantagens do semipresidencialismo

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30 de julho de 2021, 14h06

Prevenir a eclosão de crises e dar mais condições de governabilidade ao presidente da República. Estes seriam dois dos pressupostos básicos e favoráveis à adoção do semipresidencialismo no Brasil, na opinião do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL). Ambos participaram nesta sexta-feira (31/7) do evento "Sistemas de governo, crises e desafios", transmitido pela TV ConJur e mediado pelo advogado Pierpaolo Bottini, professor da Universidade de São Paulo.

Semiparlamentarismo, financiamento de campanhas e adoção do voto distrital misto ou do sistema conhecido como distritão foram os principais assuntos comentados durante o evento.

Cadu Tavares
Cadu Tavares

O ministro Gilmar Mendes iniciou sua participação lembrando que as primeiras discussões sobre a adoção do semipresidencialismo começaram com a participação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Discutia-se, então, a questão da instabilidade do atual sistema presidencialista. "A despeito de falar do mais longo período de normalidade institucional que viemos, temos tido várias falhas na governança e na governabilidade", disse. Exemplo disso, segundo o ministro, é o fato de que, dos quatro presidentes eleitos depois do período da ditadura militar, dois deles sofreram impeachment. "Só dois terminaram o mandato porque sabiam lidar com o Congresso”, completou.

Por outro lado, de acordo com Gilmar, o Brasil ainda tem um modelo político com sistema proporcional e uma infinidade de partidos que não permitem a formação de maiorias parlamentares. Não tem maioria para vontade política. O Congresso chegou a aprovar uma reforma política pela qual foi imposta uma cláusula de barreira de maneira a impedir que legendas que não atingissem determinado quociente eleitoral não pudessem ter representação parlamentar. No entanto, isso foi derrubado no próprio STF, "o que foi um erro", disse o ministro.

A possibilidade de que o Congresso adote a proibição de coligações proporcionaria a redução do número de partidos. "Ter 30 partidos dificulta o sistema presidencialista e qualquer modelo de viés parlamentarista. O pressuposto da discussão de reforma de sistema de governo é a melhoria do ambiente político e de termos partidos mais representativos das tendências ideológicas", pontuou o ministro.

A adoção do semipresidencialismo contribuiria para alterar este quadro, de acordo com Gilmar. "Mas temos percebido que as crises vão e vêm e deságuam nos e pedidos de impeachment. Seria mais adequado separar a presidência da atividade governativa e atribuí-la ao Congresso", afirmou. Este modelo, segundo ele, tem mostrado resultados satisfatórios em países como França e Portugal, por exemplo.

O deputado Arthur Lira, por sua vez, lembrou que a adoção do semipresidencialismo começou com a discussão de uma Proposta de Emenda Constitucional de autoria do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), apresentada em agosto do ano passado e que ainda precisa ser analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Por isso, segundo ele, caso adotada, a mudança no sistema de governo valeria somente para as eleições de 2026. "Seria casuísmo trocar as regras com os jogadores em campo", salientou.

Além disso, Lira observou que a quantidade de partidos no Brasil é um impeditivo para que a proposta avance. Mas ele acredita que a imposição da cláusula de barreira poderá reduzir o número de agremiações políticas. Ainda há outras discussões em curso, como a adoção do voto distrital ou do distritão, mas existem muitas resistências em modificar o sistema atual, como ele mesmo reconheceu. Outros temas em discussão dizem respeito ao aumento de número de vagas destinadas a mulheres e à restrição do número de candidatos que os partidos podem apresentar, sem ultrapassar o número de vagas a serem preenchidas

"O sistema presidencialista carece de clareza partidária mais firme, há modelos nos quais podemos nos mirar mas o brasil é muito peculiar. Não vamos tratar a questão (da adoção do semipresidencialismo) como casuísmo. Estamos num momento de polarização, com mais de 100 pedidos de impeachment do presidente. Com o novo sistema, o presidente seria resguardado dessas instabilidades", afirmou.

Ambos também discutiram o financiamento de campanhas eleitorais. Embora haja proibição de empresas financiarem campanhas políticas, o ministro Gilmar lembrou que existem mecanismos que proporcionam, por exemplo, o financiamento dos sócios das empresas, como pessoas físicas, "e acabam as empresas participando", mesmo que de forma indireta. "Quando se estabeleceu um teto para limite de doações houve um quadro que permitiu abusos. A outra alternativa é pior, dinheiro do tráfico, milícias e outros setores, como igrejas. Não parece que seja o modelo que queremos", enfatizou.

Para Arthur Lira, o financiamento eleitoral privado foi proibido a partir das eleições de 2014. Mesmo assim, disse, o sistema atual não é perfeito. Ele lembrou a discussão ocorrida recentemente por ocasião da destinação de quase R$ 6 bilhões para o fundo eleitoral, mas garantiu que a medida ainda não está sacramentada. "Precisamos ter um sistema mais flexível ou ter o risco de teremos pessoas bancadas pelo tráfico, milícias ou igrejas. Precisamos tratar esses assuntos com clareza. Não dá para brincar com a democracia, por isso, este assunto merece mais debate."

O advogado especialista em Direito Eleitoral Ricardo Penteado, que assistiu ao debate, disse que "hoje em dia o valor máximo das campanhas eleitorais é fixado em lei, o que tira o sentido de todas as regras limitadoras de propaganda que foram estabelecidas com o propósito de "baratear" as campanhas". "Não se pode gastar mais do que a lei estabelece como imite."

Por isso, segundo ele, o país precisa decidir se não é caso de rever todas as limitações de propaganda que estão vigendo hoje. "Outra questão é que ao ser fixado o valor do Fundo Eleitoral deve ser levada em consideração a  existência desse limite legal do valor global das campanhas e o número de candidaturas em todo o Brasil", concluiu.

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