Projeto Pegasus

Governos usam spyware israelense para espionar jornalistas em 45 países

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19 de julho de 2021, 13h16

Um spyware desenvolvido pela NSO Group Technologies, empresa israelense, para que governos consigam rastrear celulares de grupos terroristas e criminosos, foi usado de forma eficaz para hackear celulares de jornalistas, ativistas dos direitos humanos e políticos.

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Malware chamado Pegasus foi usado para espionar jornalistas e defensores dos direitos humanos em mais de dez países
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Esse foi o resultado de uma investigação conduzida pelo jornal americano Washington Post e outros 16 veículos de comunicação. Segundo as primeiras informações, 67 celulares foram analisados de uma lista de mais de 50 mil números de telefone apontados como alvos de espionagem por governos clientes da NSO. Os números revelados pertencem a pessoas em mais de 45 países, em quatro continentes. A investigação indica o uso abusivo do software conhecido como Pegasus.

A presença do número na lista não revela se o parelho foi infectado ou não. Mas o consórcio acredita que a lista indica os potenciais alvos de governos autoritários.

O Pegasus foi feito para driblar as defesas dos smartphones e deixa poucos traços de seu ataque. Ele consegue entrar nos celulares sem alarmar os usuários e lê tudo que o usuário lê. Também rouba fotos, gravações, registros de localização e de ligações, além de conseguir ativar a câmera e o microfone para uma vigilância em tempo real. Hoje é possível infectar um celular sem que o usuário clique em nenhum link.

De acordo com uma análise dos registros promovida pela ONG Forbidden Stories, com sede em Paris, os números podem ser ainda piores: pelo menos 180 jornalistas tiveram seus telefones selecionados em 20 países por clientes da NSO. Esses clientes variam de governos autocráticos a democráticos e abrangem todo o planeta, da Europa a África.

Alguns jornalistas que aparecem nesses registros receberam ameaças legais; outros foram presos e difamados e tiveram que fugir de seus países devido à perseguição — apenas para descobrir mais tarde que ainda estavam sob vigilância. As revelações deixam claro que a tecnologia emergiu como uma ferramenta fundamental nas mãos de governos repressivos e para as agências de inteligência que trabalham para eles.

Alguns repórteres, como o jornalista investigativo marroquino Omar Radi e o jornalista e defensor dos direitos humanos Anand Teltumbde, foram presos depois que seus celulares foram hackeados, conforme aponta a Forbidden Stories.

Em outros casos o uso do Pegasus pode ter relações com assassinatos. Os celulares de pessoas próximas ao jornalista saudita Jamal Khashoggi, assassinado em 2018 na Turquia, estão na lista de infectados pelo software. De acordo com a perícia, os celulares apresentam traços de invasão alguns meses antes e depois da morte do jornalista.

O telefone do repórter mexicano Cecilio Pineda Birto estava na lista de possíveis alvos que foi divulgada uma semana antes de seu assassinato. Os assassinos foram capaz de localizá-lo de alguma forma, mas seu celular nunca foi encontrado para perícia. O México foi um dos primeiros clientes da NSO e foi o país com mais números de telefone na lista (15 mil).

A jornalista Khadija Ismayilova, que investiga e denuncia a corrupção no governo autoritário do Azerbaijão, governado há 30 anos pela mesma família, teve seu celular testado. Foi comprovado que seu celular foi atacado pelo Pegasus diversas vezes ao longo de dois anos.

A investigação também sugere que o governo húngaro de Viktor Orbán implantou a tecnologia da NSO como parte de sua "guerra contra a mídia", visando jornalistas investigativos no país, bem como o círculo próximo de um dos poucos executivos de mídia independentes da Hungria.

O site indiano de notícias investigativas The Wire informou que 300 números de telefones celulares usados na Índia — incluindo os de ministros do governo, políticos da oposição, jornalistas, cientistas e ativistas de direitos humanos — estavam na lista.

Um consórcio entre veículos de comunicação que divulgaram a notícia ainda revelou que os números da lista pertencem a pelo menos 10 países clientes da empresa insraelense — Azerbaijão, Baren, Casaquistão, México, Marrocos, Ruanda, Arabia Saudita, Hungria, Índia e os Emirados Árabes Unidos.

Em resposta ao Washington Post, a NSO afirmou que não opera o software e nem tem acesso regular das informações que seus clientes coletam, mas que ao identificar mau uso de seu dispositivo toma as medidas necessárias e desliga o sistema desses clientes. Além disso, disse que a investigação se baseia em especulações e que as informações foram mal interpretadas.

Pegasus no Brasil
No Brasil, uma reportagem do portal UOL afirmou que o vereador Caros Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, teria participado de negociações para que a NSO participasse de uma licitação do Ministério da Justiça para compra do software.

De acordo com as mesmas fontes, o objetivo final de Carlos Bolsonaro seria usar as estruturas do Ministério da Justiça e da Polícia Federal para expandir uma "Abin paralela", sobre a qual teria grande influência.

A Agência Nacional de Inteligência (Abin) se posicionou contra a atitude do vereador, pois não estaria dentro de suas competências negociar a compra desse tipo de sistema. Carlos Bolsonaro e o MJ negaram qualquer negociação para compra do Pegasus.

Projeto Pegasus
O jornal Forbidden Stories organizou o consórcio entre os veículos de comunicação e a Anistia Intenacional fez as análises nos celulares. Eles tiveram acesso à lista de telefones e dividiram as informações com outros veículos de imprensa que colaboraram para aprofundar as análises.

Depois do início das investigações diversos repórteres do consórcio descobriram que eles próprios ou membros de suas famílias foram atacados pelo Pegasus.

Mais detalhes sobre quem foram os alvos das espionagens devem ser divulgados nos próximos dias pelos veículos do consórcio.

Clique aqui para ler a reportagem do The Guardian
Clique aqui para ler a reportagem do Forbidden Stories

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