Inovação segura

Decisão do STF de acabar com prorrogação automática de patentes é "marco histórico"

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16 de julho de 2021, 15h27

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A decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou e decretou a inconstitucionalidade do retardo do termo final de vigência do prazo de patentes foi um "marco histórico", ao menos na opinião de Karin Grau-Kuntz, coordenadora acadêmica do Instituto Brasileiro de Propriedade Intelectual (IBPI).

"Desde a Constituição de 1988, foi a primeira vez que o Supremo avaliou no mérito a constitucionalidade de um dispositivo da Lei de Propriedade Industrial, decidindo de uma forma que acredito ter sido a correta", afirmou Karin, que é mestre e doutora em Direito pela Ludwig-Maximillians-Universität (LMU), de Munique (Alemanha).

Karin Grau-Kuntz mereceu destaque no voto do ministro relator, Dias Toffoli, que usou estudo de sua autoria na construção de seu voto em favor da inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial. 

Em sua avaliação, a decisão do STF traz benefícios para o consumidor brasileiro. "O impacto da decisão que expurgou da LPI o parágrafo único do artigo 40, LPI, um verdadeiro excesso, é altamente positivo. No que toca o setor farmacêutico, já vemos medicamentos genéricos concorrentes sendo oferecidos nas farmácias", destaca a entrevistada, para quem o Brasil tem uma legislação patentária robusta, alinhada com os padrões internacionais.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

ConJur — O que representou a decisão do STF reconhecendo a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 40?
Karin Grau-Kuntz — 
Foi um marco histórico, pois que foi a primeira vez que o Supremo avaliou no mérito a constitucionalidade de um dispositivo da Lei de Propriedade Industrial, decidindo de uma forma que acredito ter sido a correta. Para além de ter expurgado da Lei de Propriedade Industrial, o controvertido parágrafo único do artigo 40 da LPI, especialmente o teor do voto do ministro Dias Toffoli teve o mérito de sedimentar conceitos importantes relacionados ao direito de patente, ao afastar, por exemplo, a retórica individualista e ad terrorem, que ainda são empregadas quando se discute o sistema de patentes. Resta agora esclarecida a finalidade primordial do sistema de patente, qual seja, a de fomentar o bem-estar social.

ConJur — Do ponto de vista do consumidor, qual é o impacto dessa decisão?
Karin Grau-Kuntz —
O impacto da decisão que expurgou da LPI o parágrafo único do artigo 40, LPI, um verdadeiro excesso, é altamente positivo. No que toca o setor farmacêutico já vemos medicamentos genéricos concorrentes sendo oferecidos nas farmácias. Nesse passo é importante destacar a relação da decisão com o sistema de patente. A garantia do direito de patente é sem dúvida importante como instrumento de estímulo à inovação. A receita de seu sucesso está, porém, no equilíbrio do sistema. A prorrogação indeterminada das patentes gerava uma situação desequilibrada, que onerava em demasia o consumidor. No caso da prorrogação de patentes de medicamentos, por exemplo, para além disso o dispositivo ainda onerava o sistema de saúde como um todo.

ConJur — Os defensores da manutenção do parágrafo único do jeito que estava eles podem ainda recorrer? Cabe ainda recurso?
Karin Grau-Kuntz —
Sim, ainda cabe embargos de declaração, um recurso que tem por fim esclarecer eventual contradição ou omissão ocorrida na decisão. Lembrando, porém, que em regra esse recurso não tem o poder de alterar a essência da decisão, aproveito para destacar que com a declaração de inconstitucionalidade o parágrafo único do artigo 40 da LPI foi expurgado do ordenamento jurídico. Assim, ao contrário do que vem sendo publicado de forma esparsa, a decisão do Supremo não "invalidou direito adquirido". A decisão, insisto, expurgou a regra mencionada do ordenamento jurídico, de modo que nunca houve o tal "direito adquirido" e muito menos sua invalidação.

ConJur — Com essa decisão a legislação brasileira de patentes passa a estar no mesmo nível dos países mais avançados?
Karin Grau-Kuntz —
A legislação brasileira é robusta, está de acordo com os padrões internacionais. O parágrafo único do art. 40 da LPI era um plus, que ia além desses standards internacionais e que, no meu entender, tinha por efeito desequilibrar o sistema de patentes. Sua supressão em nada afeta a estrutura robusta e satisfatória em termos de padrões internacionais do sistema de patentes brasileiro.

ConJur — O Instituto Nacional da Propriedade Industrial é apontado com um gargalo no sistema de patentes no país, pois leva muito tempo para conceder as patentes. A culpa é da ineficiência do INPI?
Karin Grau-Kuntz —
É simplista a referência ao INPI como ineficiente. O INPI é extremamente eficiente e bem qualificado nos limites de suas condições estruturais e é aqui, nas condições estruturais, que encontramos o problema que deve ser combatido. O INPI precisa, por exemplo, de urgente autonomia financeira.

É importante ressaltar a importância dos serviços da autarquia a todos os players envolvidos pelo sistema de patentes, de forma que o desejo de ver a autarquia bem estruturada e aparelhada deve ser um denominador comum a todos que trabalham com a propriedade industrial. O Brasil deve ter cuidado com o discurso simplista e perigoso daqueles que, agora, defendem um procedimento rápido mesmo que à revelia da qualidade do exame. Poucos ganham com a precarização da complexa análise feita pelo INPI.

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