Opinião

A democracia é a conquista do povo brasileiro

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14 de julho de 2021, 19h11

Em 1987, quando terminava o curso de Direito, participei de uma visita organizada pela instituição de ensino na qual estudava aos tribunais superiores e ao Congresso Nacional. Ainda jovem, com apenas 22 anos, chamou-me a atenção a intensa atividade nas salas do Congresso, onde funcionava a Assembleia Nacional Constituinte. Ali se debatiam os princípios e temas que deveriam nortear a futura nova Constituição e recordo ter passado um dia inteiro apreciando esses debates, que tinham destacados protagonistas, como os senadores Afonso Arinos e Nelson Carneiro. Naquelas salas compareciam também representantes da sociedade civil organizada, por meio das suas diversas instituições, como, por exemplo, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), trazendo suas contribuições aos parlamentares constituintes.

Houve críticas e restrições ao texto constitucional promulgado em 1988. Alguns disseram que a Constituição tem dispositivos em demasia; outros que prometeu demais, sem mostrar como concretizar tais promessas. Houve quem dissesse que faltou maior participação popular e quem considerasse que a Assembleia Nacional Constituinte deveria ser exclusiva; enfim, críticas que todo processo legislativo sofre.

O fato é que a Constituição de 1988 conseguiu não apenas trazer a democracia de volta, mas também vem assegurando sua vida por mais de 32 anos. E a grande contribuição que a democracia traz para a sociedade é o respeito às liberdades.

As liberdades estão colocadas no artigo 5º da Constituição como cláusulas pétreas, são o núcleo duro da nossa Constituição, que nenhum governo, nenhum poder, nem mesmo o Parlamento, pode alterar: liberdade de ir e vir, liberdade de expressão, liberdade de associação, liberdade de reunião, liberdade de pesquisa, liberdade econômica, liberdade de imprensa, liberdade de consciência e crença e liberdade de trabalhar são direitos expressamente assegurados pela nossa Constituição.

A plenitude desses direitos somente é possível em um ambiente democrático, onde o debate possa conviver dentro da tolerância, do respeito à opinião contrária, desde que não seja ela externada no sentido de suprimir o próprio direito de se ter livre opinião. Nenhum político ou governante pode estabelecer a relativização das liberdades, ou pretender definir até onde ela irá, com base nas suas convicções pessoais. A inimiga da liberdade é a arbitrariedade.

A classe política é mandatária dos poderes de preservar os princípios e regras constitucionais. Deve-se relembrar que o presidente da República, quando toma posse, jura expressamente respeitar a Constituição Federal. Não é um juramento qualquer, mas a expressão cristalina de que seguirá rigorosamente aquilo que a Constituição preconiza e de onde provém o seu mandato.

Portanto, na classe política e nos exercentes dos poderes constituídos deve sempre estar a consciência nítida e intransigente de suas responsabilidades com aquilo que preconiza o preâmbulo da Constituição da República, "instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias".

Ninguém, nem mesmo o presidente da República, pode impor qualquer vontade, qualquer opinião, que seja fora dos contornos da Constituição. Quando alguém diz que não haverá eleições se não for pelo modo como ele considera adequado, há uma ameaça à democracia que deve merecer o mais veemente repúdio, porque as autoridades não devem pautar-se por suas opiniões pessoais, sobrepondo-se àquilo que diz a Constituição, muito menos propor soluções fora da democracia, que se expressa por meio do voto popular e do equilíbrio entre os poderes. Da classe política espera-se sobretudo diálogo com bom senso e equilíbrio. O jogo político baseado em ameaças, em trocas de acusações e criação de tensões, não interessa ao povo brasileiro. Antes, sim, a política deve ser exercitada na busca da concretização e fortalecimento da democracia, em que o mandato é outorgado pelo povo e não pelas convicções pessoais de um cidadão.

Vale relembrar as palavras de Afonso Arinos no discurso de promulgação da Constituição de 1988: "Nosso dever é fazer política, isto é, defender e praticar a Constituição brasileira em vigor, acreditar nela, convocar a nação para defendê-la, se estiver em risco, reagir contra esses riscos disfarçados. Em suma, praticar e defender a liberdade". É isso que se quer dos governantes e da classe política.

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