Opinião

Considerações sobre o atual teto de valores para julgamentos virtuais no Carf

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5 de julho de 2021, 13h31

A recente Portaria ME nº 7.406, do último dia 28, acabou fazendo o que muitos militantes do Carf temiam: manteve até 31/12/2021 o julgamento não presencial (em formato de vídeo conferência) de casos com valor original de até R$ 36 milhões.

A questão já havia causado alvoroço quando da edição da Portaria ME nº 3.138/21, em 18/3, a qual, sem maiores explicações e/ou justificativas, surpreendeu a todos e elevou de R$ 12 milhões para R$ 36 milhões o limite dos valores dos casos que poderiam ser julgados em sessão virtual pelo Carf.

Nesse contexto, dois pontos, em especial, nos chamam a atenção: o primeiro é que, em 14/1/2021, já havia sido editada a Portaria ME nº 665/21, elevando o teto dos julgamentos para R$ 12 milhões, até 31/3/2021.

Assim, ao final de março, era aguardado, no máximo, que houvesse uma nova portaria prorrogando o prazo para julgar no modelo virtual processos que envolvessem créditos tributários de até R$ 12 milhões. Contudo, veio o Executivo e, por meio da Portaria (3.138/21), ampliou-se a possibilidade dos julgamentos, dessa vez para casos de até R$ 36 milhões, o que agora foi novamente referendado pela Portaria 7.406/21.

O segundo ponto relevante é que Portaria 3.138/21 tinha validade por prazo determinado, até 30 de junho. Logo, esperava-se que, a partir de 1º de julho, voltasse a vigorar o limite de alçada de R$ 12 milhões para julgamentos não presenciais.

Mas não foi o que aconteceu, pois, como visto, no dia 28 a Portaria ME 7.406/21 postergou a possibilidade do julgamento de casos com valor original de R$ 36 milhões até o último dia deste ano.

Com efeito, a quantidade cada vez maior de casos julgados no Carf no modelo virtual e a concreta possibilidade da pandemia se alongar por todo 2021, obrigando a manutenção do modelo não presencial para julgamentos, revela-se deveras preocupante para a advocacia que atua no citado tribunal administrativo.

Em números, o próprio Carf publicou em 2016 que os casos envolvendo créditos de até R$ 15 milhões representavam mais de 96% do seu acervo de processos [1].

Mais recentemente, em seus relatórios gerenciais relativos ao corrente ano de 2021, esse número se manteve praticamente sem modificações, sendo certo que os processos abaixo da alçada atual para julgamento virtual remontam a 95% do estoque do Carf [2].

Ou seja, com a Portaria ME 7.406/21, o conselho caminhou a passos largos para uma grandiosa limitação dos julgamentos presenciais, ao menos até o final de 2021, que ficaram adstritos a não mais do que 4% ou 5% das discussões que lhe são postas.

Como se sabe, o Carf sempre foi reconhecido como um tribunal permeado pelo debate técnico e amplo entre os conselheiros representantes da Fazenda e dos contribuintes, aliado às sustentações orais e comuns intervenções e explicações detalhadas em matérias de fato pelos patronos. Com a chegada da pandemia, após uma suspensão inicial de todas as sessões, elas retornaram na forma não presencial, mas tiveram seu escopo bastante limitado em um primeiro momento.

Inicialmente, a Portaria Carf nº 10.786/20 dispunha que seriam julgados recursos cujo valor original era de até R$ 1 milhão, ou recursos, independentemente do valor, cuja matéria fosse objeto de súmula ou resolução do Carf, decisão definitiva do STJ ou do STF na forma de recursos repetitivos.

Assim, o retorno dos julgamentos foi bastante restrito, naturalmente preservando os casos de maior valor e complexidade para quando voltassem as sessões presenciais, de modo a privilegiar muito mais um amplo debate e a irrestrita dialética entre julgadores e patronos do que em sessões virtuais.

Em julho de 2020, no entanto, houve ampliação do teto para julgar recursos cujo valor original fosse de até R$ 8 milhões (Portaria Carf nº 17.296). Em janeiro de 2021, como já citado, tal limite foi majorado para R$ 12 milhões.

Depois, chegou-se à relevante alçada de R$ 36 milhões, ora mantida até o final do ano; isto é, em março de 21, triplicou-se o valor que estava permitido na portaria anterior, e aumentou-se em 36 vezes o valor inicialmente estipulado em 2020.

Veja-se, não houve qualquer justificativa e/ou motivação razoável para que o Carf passasse a julgar recursos de valores tão expressivos no formato não presencial, já que, naturalmente, o julgamento virtual possui seus percalços e cria maior distância entre julgadores e patronos, dificultando, por exemplo, apresentações em power point, tão comuns no Carf para esmiuçar operações societárias e/ou planejamentos tributários.

Além disso, não é caso raro a oscilação do sinal de internet de algum dos participantes da sessão, gerando situações como de ser necessário se repetir partes de uma sustentação oral, com notório prejuízo às partes envolvidas e à própria dinâmica do julgamento. Por outro lado, a sessão não presencial torna o julgamento mais frio, diminuindo, também, o amplo e necessário debate entre os membros julgadores e as próprias intervenções que se façam necessárias pelos patronos.

É louvável que, diante da falta de previsibilidade quanto ao término da pandemia da Covid-19, o Carf pretenda continuar seus julgamentos, evitando, assim, a paralisação completa de seu já volumoso acervo. Todavia, casos de relevante valor, os quais comportam em sua maioria notório detalhamento fático e probatório, merecem aguardar mais um pouco e somente serem julgados na forma presencial, quando a pandemia permitir.

Como as majorações da alçada para julgamento não presencial são objeto de meras portarias da Administração Pública, o limite de R$ 36 milhões, que passou a viger em 1º de abril e deveria, a princípio, se encerrar em 30 de junho, foi mantido até o final deste ano.

Contudo, confiamos que hão de prevalecer a cautela, a prudência, a razoabilidade e a proporcionalidade, de modo que a alçada atual de R$ 36 milhões seja revista e reduzida em breve, voltando ao patamar anterior, de, ao menos, apenas julgar na forma virtual casos envolvendo crédito tributário de até R$ 12 milhões.

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