Opinião

Usuários de celulares devem se preocupar com venda fatiada da Oi Móvel

Autores

  • Eduardo Caminati Anders

    é advogado presidente da Comissão de Concorrência da International Chamber of Commerce (ICC) representante da TelComp - Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas junto à Anatel ao CADE e a outros órgãos da Administração Pública Federal.

  • Marcio C. S. Bueno

    é advogado e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência Consumo e Comércio Internacional (Ibrac) representante da TelComp - Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas junto à Anatel ao CADE e a outros órgãos da Administração Pública Federal.

5 de julho de 2021, 6h36

Quem já não sofre com a baixa qualidade dos serviços de telefonia móvel no Brasil? Se as autoridades não agirem, a tendência é isso piorar com o fatiamento da Oi Móvel, arrematada por um consórcio formado pelas três maiores empresas do setor brasileiro de telecomunicações  Claro, TIM e Vivo , colocando em curso o processo de fatiamento, que levará à consolidação do mercado entre suas principais concorrentes.

A despeito do pedido de recuperação judicial do Grupo Oi ter sido protocolado há quase cinco anos, o fato é que, durante esse período, a Oi Móvel continuou sendo uma rival importante de Claro, TIM e Vivo no mercado nacional de serviço móvel pessoal (SMP) — isto é, no mercado de telefonia celular. Mais do que isso, a Oi Móvel continuou sendo mais uma efetiva opção aos consumidores brasileiros na escolha de suas operadoras de telefonia móvel.

Todavia, o fatiamento da Oi Móvel alterará substancialmente esse cenário, já que esta quarta operadora simplesmente desaparecerá.

Portanto, o cenário desenhado por Claro, TIM e Vivo por meio da divisão entre elas dos ativos da Oi Móvel é capaz de piorar  ainda mais  a qualidade dos serviços de telefonia celular no Brasil e, além disso, aumentar os já altos preços cobrados de seus usuários finais. Isso porque: menos players, menos concorrência, maiores preços e piores serviços, em regra.

A proposta de fatiamento da Oi Móvel pelas três gigantes do setor brasileiro de telecomunicações não prevê qualquer salvaguarda concorrencial ou regulatória que impeça que 97% do mercado nacional de telefonia celular seja concentrado apenas em suas mãos  ou seja, nas mãos de Claro, TIM e Vivo  e que tais operadoras reforcem o domínio do mercado e explorem ainda mais os consumidores.

A referida proposta sequer prevê limitações a eventuais condutas abusivas por Claro, TIM e Vivo junto a concorrentes ou consumidores, o que seria importante tendo em vista que tais condutas não estariam limitadas à telefonia celular, já que poderiam refletir também em serviços de banda larga, telefonia fixa, TV por assinatura, por meio, por exemplo, de práticas de "venda casada". Principalmente, tendo em vista a relevância dos grupos Claro, TIM e Vivo também na oferta de tais serviços.

Adicionalmente, limitações ao poder de mercado de Claro, TIM e Vivo seriam imprescindíveis, tendo em vista os altos preços cobrados por tais empresas em telefonia celular, considerando a deplorável qualidade de seus serviços. Nesse sentido, destaca-se que tais empresas já são, há anos, as que mais têm reclamações junto ao Consumidor.gov.br do Ministério da Justiça, à frente de bancos e de distribuidoras de água e luz, agentes que também são tradicionais alvos de reclamações por parte dos consumidores.

Por sua vez, as operadoras de telefonia celular de pequeno porte, localizadas na franja do mercado de SMP, são reconhecidas pela prestação de serviços de melhor qualidade vis-à-vis seus preços.

Além de efeitos danosos  indistintamente  a todos os usuários de celulares no Brasil, também há outro sério risco relacionado ao fatiamento da Oi Móvel por Claro, TIM e Vivo, qual seja: seus potenciais prejuízos aos consumidores do mercado de SMP localizados nas regiões mais remotas do país.

Nesse sentido, destaca-se que a Oi Móvel é a operadora de telefonia móvel que conta com a infraestrutura mais capilarizada no território nacional, herdada junto a empresas públicas que, no passado, detinham o monopólio do setor telecomunicações no Brasil e que, bem ou mal, conectaram, por meio de políticas públicas, diferentes pontos do país. 

Se no atual estágio de concentração do mercado nacional de SMP ,com Claro, Oi, TIM e Vivo, os preços e a qualidade destes agentes já podem ser questionados, no eventual cenário em que Claro, Telefônica e TIM fatiam entre si a Oi Móvel  eliminando este último concorrente do mercado  é certo que os usuários finais de serviços de telefonia móvel serão, de alguma forma, prejudicados.

No mesmo sentido, usuários de telefonia celular em localidades mais distantes ficarão nas mãos, principalmente, de TIM e Vivo, podendo sofrer uma piora na qualidade de tal serviço, caso a atual capilaridade da Oi Móvel não seja devidamente mantida. Nessa hipótese, os habitantes dos pequenos municípios no interior do Brasil e o agronegócio serão os diretamente prejudicados.

Além disso, ressalta-se que, em outros países, já há diferentes estudos empíricos indicando que reduções de quatro para três players no mercado de SMP implicaram maiores preços e piora na qualidade de tal serviço aos seus usuários finais. Tal possibilidade se torna ainda mais evidente no fatiamento da Oi Móvel a Claro, TIM e Vivo porque as operadoras de SMP por rede virtual (as operadoras móveis virtuais, ou MVNOs) têm presença ainda tímida no Brasil, sem musculatura para rivalizar efetivamente junto às grandes operadoras.

Nesse contexto, os usuários finais de telefonia móvel no Brasil deveriam se preocupar em serem o "boi na linha" dos interesses anticompetitivos e estritamente privados de Claro, TIM e Vivo no fatiamento da Oi Móvel entre si. Portanto, é imprescindível que tanto a Agência Nacional de Telecomunicações quanto o Conselho Administrativo de Defesa Econômica os enxerguem assim, reprovando tal operação ou impondo a ela duros condicionantes regulatórios e remédios antitruste.

Autores

  • é advogado, presidente da Comissão de Concorrência da International Chamber of Commerce (ICC), representante da TelComp - Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas, junto à Anatel, ao CADE e a outros órgãos da Administração Pública Federal.

  • é advogado e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência, Consumo e Comércio Internacional (Ibrac), representante da TelComp - Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas, junto à Anatel, ao CADE e a outros órgãos da Administração Pública Federal.

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