Opinião

A proposta do governo de 'reforma' no Imposto de Renda

Autor

  • Bruno A. François Guimarães

    é sócio do escritório Rossi Maffini Milman & Grando Advogados mestre em Direito Tributário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) master in law (LLM) em Direito Corporativo pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) especialista em Gestão Tributária e Planejamento Tributário Estratégico pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e associado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e do Instituto de Estudos Tributários (IET).

2 de julho de 2021, 12h10

Como é de conhecimento geral, recentemente o governo federal encaminhou sua proposta de "reforma tributária" ao Congresso Nacional, visando a modificar alguns pontos quanto ao regime jurídico do Imposto de Renda. Utilizamos aspas para designar a proposta porque não se trata de uma reforma propriamente dita, mas, sim, de modificações pontuais na legislação tributária. Ou seja, apesar de relevantes, são pontuais.

A proposta trata de diversos pontos, mas alguns parecem chamar mais a atenção:

1) O aumento da faixa de isenção de R$ 1.903,98 para R$ 2,5 mil, conjuntamente com a redução do teto para uso do desconto simplificado para R$ 40 mil anuais;

2) A tributação de dividendos (isentos no Brasil desde 1994), que passariam a ser tributados a uma alíquota de 20%, exceto quando recebidos de microempresas ou de empresas de pequeno porte;

3) A possibilidade de antecipação da valorização imobiliária, cujo ganho seria tributado a 5%;

4) Redução gradual da alíquota do IRPJ.

Naturalmente, o aumento da faixa de isenção é algo positivo, mas não se trata de uma benesse governamental. Na verdade, a tabela do Imposto de Renda é enormemente defasada, de forma que esse ajuste nada mais é do que uma tímida compensação pelas perdas inflacionárias, ainda longe de serem compensadas.

Acontece que essa medida é "compensada" pelo governo com a redução do teto de valores passíveis de se valerem do desconto simplificado. Ou seja, menos pessoas poderão se valer de tal modalidade de cálculo e, consequentemente, menos cidadãos passarão a fazer jus à restituição de Imposto de Renda.

Na prática, significa dizer que, embora muitos passem a ter menores retenções nos seus salários, gozando de maiores valores na sua renda mensal, quando declararem seu Imposto de Renda anual terão de recolher mais tributos. Coincidentemente ou não, essa "folga mensal" ocorreria justamente durante os meses de 2022, ano eleitoral.

Sobre a tributação de dividendos, é importante ter em mente seus contextos. Quando instituída, em 1994, a carga tributária brasileira representava 25% do PIS, sendo que hoje representa 33%, ao passo que a carga tributária da União era de 19%, enquanto hoje é de 24%. Ainda, a maior parcela dos tributos federais incide sobre o faturamento das empresas, que é o seu resultado bruto (antes de se verificar sequer se há lucro). A isenção dos dividendos foi uma medida de forte estímulo para o incentivo em investimentos, o que acabará sofrendo um severo golpe por mais esse agravamento da carga tributária nacional.

Há uma pecha de que a tributação dos dividendos visa a uma "equalização" entre a tributação de pessoas assalariadas e investidores, o que é demasiadamente simplista e maniqueísta. Os dividendos são resultado do lucro da empresa, e seu resultado bruto já foi tributado quando da sua distribuição. Logo, tributar dividendos é uma "dupla tributação" do mesmo lucro, uma vez na pessoa jurídica e uma segunda vez na pessoa física.

Ademais, dividendos são a forma de excelência da remuneração de investimentos, de forma que sua tributação é um ataque direto ao empreendedorismo, tão necessário e tão fragilizado em nossa economia já de há muito combalida e fulminada pela pandemia da Covid-19.

A possibilidade de antecipação gradual dos ganhos de capital com imóveis, por meio de sua atualização a uma alíquota de 5%, é um claro caso de planejamento tributário facultado aos brasileiros, que poderão ir antecipando parcialmente os valores de seus imóveis a uma alíquota menor que os 15% incidentes, caso deixem para fazê-lo quando da efetiva alienação.

A questão é que tal medida tem um claro intuito arrecadatório, pois o ganho de capital, via de regra, só é efetivamente tributado quando de uma futura e incerta alienação do patrimônio imobiliário. Logo, trata-se de um verdadeiro trade off tributário: antecipar os ganhos e tributar desde já 5% ou não antecipar nada e deixar para pagar 15% num futuro incerto?

Finalmente, a redução de alíquota do Imposto de Renda para Pessoas Jurídicas é algo benfazejo, mas que vem como uma tímida compensação pelo claro aumento de carga tributária pretendido pela reforma. Não se pode ignorar que sua redução é gradual e vem somada à tributação dos dividendos, de forma que o governo parece querer dar um pouco com uma mão, mas retirar muito com a outra. Percebe-se, portanto, que há muito o que ser analisado e ponderado. Espera-se que tal proposta de "reforma" seja ajustada para que deixe de demandar o uso de aspas e reverta em efetivo benefício à população.

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    é sócio do escritório Rossi, Maffini, Milman & Grando Advogados, mestre em Direito Tributário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), master in law (LLM) em Direito Corporativo pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC), especialista em Gestão Tributária e Planejamento Tributário Estratégico pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e associado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e do Instituto de Estudos Tributários (IET).

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