Direitos em conflito

Supremo decide sobre audiências de custódia por videoconferência

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1 de julho de 2021, 12h11

O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal começou a julgar nesta quarta-feira (30/6) uma ação direta de inconstitucionalidade para avaliar a constitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 3-B do Código de Processo Penal (CPP), inserido pelo pacote anticrime (Lei 13.964/2019), que veda a promoção de audiência de custódia por videoconferência. A votação se encerra às 23h59 desta quinta e, até o meio-dia, estava empatada.

Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ministro Nunes Marque é o relator da ADI que julga a possibilidade de audiências de custódia por videoconferência
Fellipe Sampaio/SCO/STF

Na última segunda-feira (28/6), o ministro Nunes Marques, relator da matéria, deferiu liminar para suspender a eficácia da vedação e autorizar as audiências de custódia de forma virtual, enquanto durar a pandemia de Covid-19.

Em seu voto, já seguido pelo ministro Marco Aurélio, o ministro esclareceu que, diante à gravidade da pandemia causada pela Covid-19, o STF reconheceu a constitucionalidade de diversas medidas restritivas aplicadas pelos estados e municípios. Nessa linha, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n. 357, de 26/11/2020, que permitiu, de forma coerente, a promoção das audiências de custódia por videoconferência.

Para o relator, no atual contexto pandêmico em que vivemos, a audiência de custódia por videoconferência é a medida mais adequada possível, ressaltando-se que, a despeito de sua relevância, em razão da pandemia, muitas vezes, ela não tem sido feita. Então, é melhor que ocorra por videoconferência do que simplesmente não ocorra de forma alguma.

"Pondero aí que a adoção da modalidade de videoconferência para a realização das audiências de custódia, em caráter excepcional, busca coadunar, reitero, o interesse do custodiado com a preservação da saúde de todos aqueles envolvidos no seu transporte, desde agentes penitenciários, funcionários e servidores do fórum, advogados, promotores públicos, juízes e, por óbvio, o próprio custodiado", continuou.

Em linha de conclusão, Nunes Marques asseverou que a audiência de custódia telepresencial é a medida possível que mais se aproxima, no contexto pandêmico, de assegurar "aos presos o respeito à integridade física e moral", prevista no artigo 5º, XLIX, da Constituição; além, sem dúvida, da garantia constitucional do devido processo legal, conforme artigo 5º, LIV, CF/88.

Divergências
O ministro Ricardo Lewandowski, votou pelo indeferimento da medida cautelar. Citou consulta ao Sistema de Audiência de Custódia, em que se verificou, durante o período da pandemia de Covid-19 até junho de 2021, a realização de, no mínimo, 20 mil audiências de custódia presenciais em todo o país. Para que isso fosse possível bastou que fossem adotadas todas as medidas de biossegurança adequadas para promoção da solenidade com garantia à saúde de todos, argumentou.

"Assim, no plano do mundo fenomênico, a realização da audiência de custódia por videoconferência, para além de negar a natureza do próprio instituto consolidado pelo Parlamento — cujo propósito é a condução da pessoa privada de liberdade à presença do juiz, a fim de que este possa verificar, com seus próprios olhos, a partir de uma escuta qualificada, quanto à legalidade e a necessidade da prisão — não encontra mais justificativa na crise decorrente da pandemia da Covid-19", ponderou Lewandowski.

No mesmo sentido foi o voto do ministro Luiz Edson Fachin. Ele afirmou que a urgência da audiência de custódia tem uma razão de ser e não pode ser relegada ao tratamento de mero ato processual.

"Constitui medida de extremo relevo para prevenção e repressão à tortura e a quaisquer formas de maus-tratos durante a custódia; constitui caminho inicial, dentro da esfera judicial, para enfrentamento concreto da violência institucional e controle da atuação policial. O encontro entre preso e juiz, nessa oportunidade, deve, pois, corresponder a uma busca efetiva pelo respeito aos direitos humanos", disse o ministro.

Dessa forma, entendeu que a Resolução do CNJ sobre custódia por vídeo durante a pandemia foi uma exceção, não podendo se sobrepor, como regra, à norma legal expressa que previne a integridade física do preso e a própria prática abominável da tortura. Assim, para ele, permanece vedada a audiência de custódia por videoconferência.

Questão polêmica
Antes do início do julgamento, a Defensoria Pública de São Paulo enviou manifestação ao STF defendendo que nenhuma excepcionalidade — incluindo epidemia de Covid-19 — permite que audiências de custódia sejam feitas de modo telepresencial. Isso porque, em audiências virtuais, a tela do computador não permite uma visualização nítida, precisa e abrangente, por parte do juiz que preside a audiência de custódia, do ambiente no qual a pessoa custodiada estará inserida para prestar seu relato, não sendo possível assegurar que o custodiado terá liberdade para mostrar se sofreu tortura. 

A decisão preocupou, também, a Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), para quem a forma on-line desse tipo de audiência desnatura a principal finalidade do ato, que é o contato direto do autuado com o juiz. Segundo a presidente da Anadep, Rivana Ricarte, a audiência de custódia deveria ser considerada serviço essencial, uma vez que a avaliação das restrições à liberdade da pessoa é o que há de maior gravidade na seara processual penal. 

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Clique aqui para ler o voto do ministro Lewandowski 
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ADI 6.841

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