Opinião

As mudanças na Lei de Recuperação Judicial e os seus reflexos tributários

Autores

  • Mary Elbe Queiroz

    é advogada tributarista sócia da Queiroz Advogados Associados pós–doutora em Direito Tributário (Universidade de Lisboa – Portugal) Doutora em Direito Tributário (PUC-SP) mestre em Direito Público (UFPE) professora e presidente do Conselho Jurídico do Ibrei.

  • Antonio Carlos de Souza Jr.

    é advogado sócio de Queiroz Advogados Associados doutor em Direito Tributário (USP) mestre em Direito (UNICAP) pós-graduação em Direito Tributário pelo IBET/SP professor do Curso de Pós-graduação do IBET membro Fundador da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo – ANNEP e presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.

30 de janeiro de 2021, 13h48

Na véspera do Natal de 2020, foi publicada a Lei nº 14.112/2020, com mudanças na recuperação judicial e na falência das empresas que têm repercussões tributárias com as alterações do seu artigo 3º. A modificação passou a admitir novos instrumentos de resolução de passivos fiscais, alterou a sistemática do parcelamento especial e promoveu a integração com a transação tributária (Lei nº 13.988/2020).

Com a alteração, o parcelamento da Lei nº 10.522/2002, artigo 10-A, passou a tratar da resolução de débitos existentes até a data do protocolo do pedido de recuperação e o artigo 10-B contemplou o parcelamento de débitos de tributos retidos na fonte, descontado de terceiros, por sub-rogação e de IOF já existentes. O parágrafo 2º-A traz condicionantes para o parcelamento.

Desvantagens de tais possibilidades: não há redução de tributo, multa ou juros, como em outros parcelamentos; há a obrigação do fornecimento ilimitado de informações bancárias e o dever de amortizar o saldo devedor do parcelamento com produto da alienação de ativos realizados durante o plano de recuperação judicial, o que pode comprometer a própria operacionalização do plano.

Já o artigo 10-C possibilita a resolução do passivo fiscal por meio da transação tributária da Lei nº 13.988/2020 e da Portaria PGFN nº 9.917/2020. O prazo máximo para quitação foi elevado para 120 parcelas e o desconto máximo aplicável para empresas em geral passou para 70% do valor do passivo, mantidas as limitações da lei geral de transação. O parágrafo 1º do artigo criou uma norma indutora para pessoas jurídicas com projeto ou política de responsabilidade social. A vantagem consiste em prazo adicional de 12 meses para cumprimento das obrigações contraídas na transação tributária.

Vale ressaltar que a transação tributária também pode conviver e contemplar a amortização do artigo 10-A, pois não viola as limitações do artigo 10-C para realização da transação tributária. Ou seja, o acordo poderá dispor sobre percentual mínimo de cada parcela ou até um período carência para pagamento da primeira parcela.

Com relação ao prejuízo fiscal, o legislador não deixou clara a possibilidade de quitação no bojo da transação, entretanto, a ausência de clareza não impede a sua utilização na transação por se tratar de um direito. É que a transação é uma alternativa ao parcelamento e o artigo 10-C não afastou a utilização do formato ali previsto para a própria transação, o que somente reforça a possibilidade de quitação de 30% do débito com prejuízo fiscal, conforme dispõe o parágrafo 1º-B do artigo 10-A da Lei nº 10.522/2002.

Observe-se que, por ser a hipótese mais um mecanismo de liquidação de um ativo, não houve o veto da possibilidade de liquidação de passivos com prejuízo fiscal. De modo diverso, o presidente da República vetou os artigos 6º-B e 50-A da Lei nº 11.101/2005 com a justificativa de que são benefícios fiscais.

Logo, ao dispor sobre a possibilidade de utilização para quitação de débitos fiscais, a lei confirma o prejuízo fiscal como um direito da pessoa jurídica, que deverá ser registrado contabilmente como ativo fiscal, não configurando qualquer benefício fiscal e dispõe, apenas, sobre o controle do momento de sua liquidação.

Inclusive, o artigo 11, §6º, da Lei nº 13.988/2020 já permite a utilização de direitos creditórios do contribuinte em desfavor da União. Nesse contexto, o prejuízo fiscal, jurídico-contabilmente tratado, deve ser enquadrado como um ativo, direito de crédito em desfavor da União e, por isso, poderá ser incluído como um direito e uma garantia para celebração da transação e/ou como ativo que será utilizado para amortizar ou liquidar o saldo devedor do crédito transacionado.

Alerte-se que, apesar de inúmeras vantagens da nova sistemática, existem alguns riscos que deverão ser sopesados, pois a nova lei tratou dos poderes da Fazenda Pública com relação à exclusão do parcelamento, notadamente o §4º-A, inciso IV, do artigo 10-A, que elenca como consequência da rescisão do parcelamento a faculdade (poder) de a Fazenda Nacional requerer a convolação da recuperação judicial em falência.

De modo diverso, a lei de transação (Lei nº 13.988/2020) apenas prevê a decretação de falência como uma modalidade de rescisão do acordo, conforme pode ser observado no artigo 4º com redação semelhante ao disposto no artigo 10-A, §4º, da Lei nº 10.522/2002, com redação dada pela Lei nº 14.112/2020.

Assim, as inovações normativas trazidas pela nova lei favorecem que a obtenção de regularização dos débitos na recuperação seja realizada preferencialmente por meio da transação tributária, pois o acordo contemplará as mesmas condições do parcelamento, além de garantir a redução dos débitos e o pagamento com prejuízo fiscal.

Autores

  • Brave

    é advogada sócia de Queiroz Advogados Associados, coordenadora do curso de pós-graduação do IBET em Pernambuco, professora, pós-doutora pela Universidade de Lisboa, doutora em Direito Tributário (PUC/SP), mestre em Direito Público (UFPE), pós-graduação em Direito Tributário: Universidade de Salamanca – Espanha e Universidade Austral – Argentina, pós-graduação em Neurociência (PUC/RS), presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários, presidente do Conselho de Notáveis do Instituto das Juristas Brasileiras, membro Imortal da Academia Nacional de Ciências Econômicas e Políticas Sociais, membro do Comitê Superior de Assuntos Jurídicos e Legislativos da FIESP (CONJUR), membro do Conselho da Mulher da ACP, consultora da CNC, líder do Comitê Vozes do Grupo Mulheres do Brasil – Recife-PE e tem livros e artigos publicados e palestras no Brasil e exterior.

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    é advogado sócio de Queiroz Advogados Associados, doutor em Direito Tributário (USP), mestre em Direito (UNICAP), pós-graduação em Direito Tributário pelo IBET/SP, professor do Curso de Pós-graduação do IBET, membro Fundador da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro, membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo – ANNEP e presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.

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