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Honorários sucumbenciais recursais são necessários na Justiça do Trabalho

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18 de janeiro de 2021, 19h19

Em 11/11/2017, entrou em vigor a denominada reforma trabalhista por meio da Lei 13.467/2017, com uma série de mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-lei 5.452/1943) e que, entre as inúmeras alterações, trouxe uma grande novidade na sistemática processual trabalhista, antes vista como exceção: a previsão de honorários de sucumbência.

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Em alguns pontos, o texto seguiu o mesmo raciocínio do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), exceto quanto ao percentual. O CPC/15, em seu artigo 85, §2º, estabelece um mínimo de 10% e máximo de 20%, tendo como base de cálculo o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. A Lei 13.467/2017, em contrapartida, trouxe percentual reduzido, de 5% a 15%, alterando-se a expressão "valor da condenação" para "valor que resultar da liquidação da sentença", o que, em termos práticos, resulta na mesma finalidade.

Quanto aos critérios a serem observados pelo julgador na fixação do percentual, a Lei 13.467 simplesmente repetiu os do CPC, quais sejam, o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

Dois anos antes da reforma trabalhista, em 2015, ingressava no ordenamento jurídico brasileiro o tão esperado novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), com sua entrada em vigor em 18/3/2016, trazendo um ponto que também era novidade na seara processual: os honorários em âmbito recursal (artigo 85, §11). A partir da entrada em vigor do novo CPC, portanto, aquele que recorresse e não obtivesse êxito no tribunal sofreria com a elevação do percentual dos honorários fixados. O texto está assim previsto:

"§11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento".

A previsão de honorários sucumbenciais recursais surgiu com dois objetivos, conforme doutrina de Rogério Licastro Torres de Mello:

"1) Por primeiro, ao permitir-se a majoração de honorários sucumbenciais relativamente àqueles fixados em primeiro grau de jurisdição, o CPC/2015 tenciona permitir ao advogado da parte vitoriosa maior remuneração comparativamente àquela estipulada na instância inferior, dado que o trabalho do causídico, em virtude da fase recursal, será evidentemente majorado; 2) em segundo lugar, a possibilidade de fixação dos honorários sucumbenciais em sede recursal serve de estímulo à litigância mais responsável por parte do recorrente, o qual, à vista da chance de aumento da condenação sucumbencial de primeiro grau em virtude de insucesso de seu recurso, ampliando-se seu prejuízo no plano patrimonial, seguramente será convidado, pelas circunstâncias, a fazer maior reflexão acerca de sua iniciativa recursal" [1].

Além disso, a majoração dos honorários independe de requerimento e de interposição de recurso autônomo, devendo o tribunal assim fazer no julgamento do recurso, tendo em conta o termo impositivo "majorará" contido no §11, observando-se o limite máximo de 20%. Acrescente-se, por fim, que os honorários são considerados pedido implícito (artigo 322, § 1º, do CPC/15).

Antes da Lei 13.467/2017, a condenação em honorários advocatícios na Justiça do Trabalho era possível praticamente em dois casos, um bastante corriqueiro na praxe forense e o outro que soava um tanto inconstitucional, como se verá a seguir.

O primeiro caso era da previsão de honorários em favor do advogado de sindicato atuante na causa. Saindo-se vencedor na demanda aquele trabalhador assistido por sindicato, o juiz fixava o percentual de 15% em favor do advogado. Por essa previsão, no entanto, não bastava que o sindicato estivesse atuando em favor da parte, exigindo-se também que a parte comprovasse sua hipossuficiência financeira. Em linhas gerais, portanto, demandava-se a presença concomitante desses dois requisitos: a) a parte estar assistida por sindicato; e b) hipossuficiência financeira. A hipossuficiência deveria ser comprovada ou pela demonstração de que seu salário era inferior ao dobro do salário mínimo ou que sua situação econômica não permitisse ingressar com ação sem prejuízo de seu sustento e família.

O tema foi tratado primeiramente na Orientação Jurisprudencial nº 305 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, a qual, após algumas alterações, culminou na edição do enunciado de súmula nº 219, com a atual redação:

"I. Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte, concomitantemente: a) estar assistida por sindicato da categoria profissional; b) comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família (artigo 14, § 1º, da Lei nº 5.584/1970) (ex-OJ nº 305 da SBDI-I)".

O segundo caso, oriundo de previsão mais antiga, surgiu no ano de 2005 com a edição da Instrução Normativa nº 27/2005 pelo Tribunal Superior do Trabalho para regulamentar na época a recente reforma do Judiciário estabelecida pela Emenda Constitucional nº 45/2004, estabelecendo em seu artigo 5º a possibilidade de fixação dos honorários sucumbenciais em ações que não envolvessem relação de emprego. O dispositivo estabelece:

"Artigo 5º — Exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência".

Sendo um ato de regulamentação editado por um tribunal, sem força de lei (artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal), parte da doutrina questionava se referido ato normativo estava eivado de inconstitucionalidade por ofensa à competência privativa da União para legislar sobre Direito Processual, nos termos do artigo 22, inciso I, da CF (LEITE, 2019). Eram essas, portanto, as possibilidades de se condenar a parte vencida ao pagamento de honorários. Casos que não se enquadrassem nas disposições acima eram julgados sem o ônus das verbas sucumbenciais.

Na prática, para tentar contornar a situação, muito do que se via era a tentativa de transferir a responsabilidade do pagamento de honorários advocatícios contratuais à parte reclamada em forma de indenização por perdas e danos, calcado no que dispõe o artigo 404 do Código Civil, o que, todavia, era de dificílima aceitação. Um dos fundamentos para se negar esse pedido era o de que na Justiça do Trabalho vigora o jus postulandi, direito que assegura à parte poder ingressar com ação trabalhista sem a necessidade de advogado (artigo 791 da CLT).

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 133, estabelece que o advogado é indispensável à Administração da Justiça e, portanto, representa uma das figuras mais importantes dentro da sociedade, com fundamental papel para a democracia. Sobre essa importância e o papel do advogado, dizem Cláudio Lamachia e Estefânia Viveiros:

"O advogado, que detém exclusivamente a capacidade postulatória, exerce, diuturnamente, serviço público dotado de alta relevância social, atuando na defesa dos direitos e interesses dos cidadãos e contribuindo substancialmente na promoção de uma sociedade mais livre, justa e solidária.
A remuneração do advogado precisa ser condizente com a sua responsabilidade no exercício profissional, considerando, inclusive, a sua indispensabilidade à Administração da Justiça" [2].

O Estatuto da Advocacia vigente (Lei 8.906/94) especifica, não exaustivamente, as atividades desenvolvidas pelo advogado em seu artigo 1º, sendo elas a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais e as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.

No tema "honorários", o estatuto estabelece no artigo 22 que a prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. Disso se conclui, portanto, que a prestação de serviço pelo advogado é um dos pilares para a fixação dos honorários de sucumbência. Percebe-se que o CPC/15, assim como fizeram o CPC/1973 e a Lei 4.215/1963 (antigo Estatuto da Advocacia), seguiram essa linha de valorização do trabalho do advogado ao reservar dispositivos específicos a respeito dos honorários.

E como mencionado, a previsão de honorários sucumbenciais em sede de recurso pelo CPC/15 surgiu em boa hora, pois permitiu que a categoria se saísse mais fortalecida, passando, então, a ser remunerada razoável e adequadamente à medida em que o processo judicial se desenvolve.

A mesma valorização, no entanto — e sem motivo aparente —, não foi dada pela Lei 13.467 perante a Justiça do Trabalho, que previu tão somente a fixação em primeira instância no percentual de 5% a 15% em sentença.

No âmbito da jurisprudência, não obstante a postulação do aumento dos honorários pelos advogados, os tribunais vêm decidindo pela não aplicação da regra da majoração por falta de previsão legal específica na CLT. Nesse sentido já decidiu a 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) (Processo 1002304-25.2017.5.02.0374):

"O artigo 85, §11, do CPC/2015 veio a prever os honorários recursais, diferentemente do antigo Código que não os previa.
Entretanto, a Lei 13.467/17 é posterior ao CPC/2015 e não contou com previsão nesse sentido ao regular a matéria de maneira pormenorizada.
Logo, a melhor interpretação das regras que versam sobre os honorários sucumbenciais devidos em reclamações trabalhistas é no sentido de que não cabem nessa Justiça especializada os honorários recursais.
Até porque a regulamentação da matéria pela Lei 13.467/17 fez constar a obrigatoriedade da condenação em honorários em circunstâncias outras, excepcionais, como ocorre no caso da reconvenção.
Se nada disse no âmbito do recurso, é porque, de fato, essa foi a intenção do legislador.

Trata-se do chamado silêncio eloquente".

A 10ª Turma do mesmo tribunal (Processo 1001434-52.2018.5.02.0080) também usou como fundamento a necessidade de pedido expresso em contrarrazões ou interposição de recurso próprio, o que, em sua ausência, não permitiria a majoração automática dos honorários, decisão que contraria o CPC.

Diante disso, fica o seguinte questionamento: o artigo 85, §11, do CPC, que trata dos honorários recursais, não estão sendo reconhecidos na Justiça do Trabalho. E quanto ao §8º, que trata da fixação dos honorários por equidade no caso de valor da causa muito baixo ou proveito econômico inestimável ou irrisório, seria ele aplicado? Mesmo não havendo previsão específica na CLT a respeito, alguns Tribunais do Trabalho vêm entendendo que sim, e a consequência que se tem disso é uma verdadeira e indesejável cisão de sistema processual.

Mencione-se também que o CPC/15, em seu artigo 15, estabelece sua aplicação supletiva ao processo trabalhista, o que permitiria aumentar os honorários em recurso. Ora, se se mostra possível a fixação dos honorários por equidade com fundamento em dispositivo do CPC, também seria possível a majoração dos honorários em sede recursal.

O juiz de primeira instância é a primeira pessoa no processo a se deparar com a necessidade de fixação de honorários. Portanto, embora previsível, no momento em que se fixa os honorários na sentença, não se sabe ao certo se a parte vencida irá ou não recorrer para se considerar que aquele percentual de honorários fixados abrange, de fato, todo o trabalho e esforço até ali desenvolvidos. Assim, não havendo a majoração dos honorários no julgamento do recurso, o trabalho do advogado é remunerado tão somente por sua atuação na primeira instância.

Nem se fale ainda que o processo judicial é uma verdadeira caixa de surpresas, uma vez que também em fase de execução a parte vencida tem o direito de apresentar petições de impugnação e recursos para, por exemplo, tentar obstaculizar o andamento processual, o que exige do advogado um trabalho de apresentação de defesas e acompanhamento, além do próprio assessoramento dado ao cliente.

É necessário então que se estabeleçam os honorários sucumbenciais recursais também na Justiça do Trabalho. E nem há porque se contra-argumentar no sentido de que soaria como uma possível violação ao direito de acesso à Justiça trabalhista, caracterizado pelo fato de o jurisdicionado ficar receoso com a interposição do recurso e a consequente majoração dos honorários diante de sua derrota no tribunal, uma vez que até mesmo a parte beneficiária da Justiça gratuita está sujeita às verbas sucumbenciais — salientando-se, porém, a condição suspensiva de exigibilidade até a demonstração de que a insuficiência de recursos financeiros deixou de existir, como previsto no artigo 98, §3º, do CPC e artigo 791-A, §4º, da CLT.

Não há razão substancial para que os processos em trâmite na Justiça do Trabalho estejam fora do alcance da majoração dos honorários recursais. O processo não deixa de ser processo, com todas as suas peculiaridades e fases próprias, simplesmente por estar tramitando em Justiças distintas. É uma questão de isonomia. 

Dessa maneira, configura-se como erro da legislação trabalhista a não previsão da majoração dos honorários sucumbenciais em recurso, o que demanda a apresentação de projeto de lei para igualar os sistemas processuais.

 

Referências bibliográficas
Carlos Henrique Bezerra Leite. Curso de Direito Processual do trabalho / Carlos Henrique Bezerra Leite. — 17. ed. — São Paulo : Saraiva Educação, 2019.

Claudio Lamachia e Estefânia Viveiros. Honorários advocatícios no CPC: Lei nº 13.105/2015. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2019. Lamachia, Claudio; Viveiros, Estefânia. Honorários advocatícios no CPC: Lei nº 13.105/2015 (p. 4). Fórum. Edição do Kindle.

Rogerio Licastro Torres de Mello. Honorários advocatícios [livro eletrônico] : sucumbenciais e por arbitramento / Rogerio Licastro Torres de Mello. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2019. 6 Mb ; e-PUB Rogerio Licastro Torres de Mello. Honorários advocatícios. Edição do Kindle.


[1] MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Honorários advocatícios [livro eletrônico] : sucumbenciais e por arbitramento / Rogerio Licastro Torres de Mello. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2019. 6 Mb ; e-PUB Rogerio Licastro Torres de Mello. Honorários advocatícios. Edição do Kindle, paginação irregular.

[2] LAMACHIA, Claudio; VIVEIROS, Estefânia. Honorários advocatícios no CPC: Lei nº 13.105/2015. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2019. Edição do Kindle, pg. 13.

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